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Scot Consultoria

O poder dos reemergentes


Quarta-feira, 20 de setembro de 2006 - 15h43


Marcos Sawaya Jank Os países emergentes já somam mais da metade do PIB mundial em paridade do poder de compra, ultrapassando os países desenvolvidos. Além disso, eles contam com 83% da população, consomem 54% da energia, detêm 70% das reservas financeiras e 43% das exportações (ante apenas 20% em 1970). A edição desta semana da revista The Economist traz um ótimo relatório sobre o novo poder dos emergentes, que prova que o mundo deixou de ser uni ou bipolar e vai ficando cada vez mais multipolar. O relatório começa por corrigir uma imprecisão histórica: o termo “emergentes” seria incorreto e, a rigor, deveria ser substituído por economias “reemergentes”, já que o grupo de países em questão ficou fora dos holofotes durante apenas um curto período de 180 anos, entre a revolução industrial européia e o final da década passada. Durante oito séculos, entre os anos 1000 e 1820, os hoje reemergentes, principalmente na Ásia, controlaram 80% da riqueza mundial! A reemergência dos emergentes é o maior fenômeno deste início de milênio. Nos últimos cinco anos eles cresceram 7% ao ano, ante apenas 2,3% dos países ricos, taxas que se devem manter no próximo qüinqüênio. O crescimento sustentado desses países decorre de amplas reformas internas: abertura comercial, atração de capital externo, aumento da competição, dos investimentos e da produtividade dos fatores, rápida integração nas cadeias produtivas globais, aproveitamento das tecnologias de informação, etc. Mais de 1 bilhão de novos consumidores destes países vão ingressar no mercado global de consumo na próxima década. A Goldman Sachs estima que China, Índia, México, Rússia e Brasil estarão entre as dez maiores economias do mundo em 2040 e serão, juntos, maiores que o atual G-7. Contudo, um dos grandes equívocos da atualidade é tentar agrupar os emergentes num suposto “bloco” que se estaria contrapondo aos países desenvolvidos. Ocorre que eles formam um grupo extremamente heterogêneo de países, muito menos unidos do que Europa e EUA foram nos últimos 150 anos. O agrupamento do mundo “emergente” serve apenas como uma referência conceitual da completa redefinição da divisão internacional do trabalho, do comércio, dos investimentos, do poder de compra dos consumidores, do uso de recursos naturais e da inovação que está em andamento. Este grupo de países está “redesenhando” todos os mapas mundiais - econômicos, políticos, sociais, tecnológicos, etc. A regra, porém, é cada um por si. É obvio que a trajetória futura dos emergentes não será um mar de rosas rumo ao nirvana da prosperidade. Há graves problemas a serem solucionados por estes países, como a crescente disparidade entre as rendas urbana e rural, as imensas desigualdades regionais que se estão formando internamente, já gerando protestos e forte pressão migratória, principalmente na China e na Índia. Há também riscos de crises bancárias, de aumento do protecionismo mundial e de agravamento dos problemas de infra-estrutura e ambientais. Os EUA possuem hoje 150 milhões de carros, 50 por habitante. Em 2040, China e Índia terão 750 milhões de carros (26 carros para cada 100 habitantes, comparados com apenas 2 atualmente). Imagine-se o gasto potencial de combustíveis e os congestionamentos! Na semana passada, participei de uma conferência do Centro para a Inovação na Governança Internacional no Canadá, na qual se discutiu a emergência dos BRICSAM e a necessidade de reformar as instituições multilaterais (ONU, FMI, Banco Mundial, OMC). BRICSAM é a sigla em inglês que se criou para representar o conjunto dos BRICs (Brasil, Rússia, Índia e China) mais África do Sul, países da Asean (principalmente Malásia, Tailândia, Indonésia e Filipinas) e México. A definição ampliada busca corrigir a insuficiência do conceito original dos BRICs, agregando outros emergentes que têm grandes populações e mostram altas taxas de crescimento. No grupo ampliado, a liderança do crescimento fica nas mãos da China (8,6% ao ano na última década), seguida por Índia (6%), países da Asean (4%), Rússia (3%), México (2,7%) e, na rabeira, o Brasil, com míseros 2,4% ao ano de crescimento entre 1995 e 2004. O professor Marcelo de Paiva Abreu, da PUC-Rio, apresentou uma ótima palestra sobre o papel do Brasil nos BRICs, tentando responder à indagação shakespeariana “Brazil: to be or not to be a BRIC?”. Marcelo mostrou que, além do crescimento medíocre, o País se posiciona abaixo da média dos BRICs na sua capacidade de poupar e investir, na alta carga tributária, nos elevados gastos públicos e no custo da dívida interna. O Brasil iguala a média dos BRICs na estabilidade inflacionária e em alguns indicadores sociais e supera a média dos parceiros em recursos naturais, PIB per capita, solidez democrática, relações pacíficas com países vizinhos e outros. Ele conclui afirmando que, se o Brasil não conseguir crescer mais, corre o risco de ser brevemente descartado da lista dos BRICs. Nossa única solução para continuarmos integrando o seleto grupo das melhores economias emergentes é o aprofundamento das reformas domésticas (previdenciária, fiscal, trabalhista), a melhoria das instituições (principalmente nos campos político e jurídico), o crescimento da concorrência e da produtividade (evitando a falsa solução do protecionismo e do isolamento) e o investimento consistente em bens públicos (segurança, infra-estrutura, educação e saúde). A dicotomia clássica entre países do Primeiro e do Terceiro Mundo ou países do Norte e do Sul já perdeu o sentido. Neste início de milênio o mundo se divide entre os que estão conseguindo acompanhar a velocidade da globalização com reformas internas profundas, macro e microeconômicas, e os que estão comendo poeira, contemplando passivamente o sucesso de seus ex-companheiros subdesenvolvidos.
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