• Quarta-feira, 19 de novembro de 2025
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Scot Consultoria

A pecuária começa na cria

O ponto de vista da Fazenda Roncador, em Querência-MT, para obter melhores margens de lucro na pecuária de corte começando pela matriz.


Foto: Bela Magrela

A pesquisa expedicionária Circuito Cria, idealizada e realizada pela Scot Consultoria, está em sua reta final após dois meses na estrada coletando dados sobre a estação de parição. Os técnicos passaram por Minas Gerais, Goiás, Tocantins, Pará, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul. Em 2024, a equipe foi a campo para ver a estação de monta, e já se prepara para a última etapa em meados de abril de 2026, quando verão as tendências da desmama, com os bezerros inseminados cerca de 17 meses antes, sendo ofertados ao mercado. Todos os dados coletados resultarão em um benchmarking 100,0% focado na cria, com indicadores dos principais estados produtores de bezerros do país.

Das propriedades visitadas este ano, está a Fazenda Roncador, localizada no município de Querência-MT, um exemplo em sustentabilidade unindo a pecuária regenerativa e a agricultura de alta tecnologia. Além disso, por possuir quase metade da área ocupada por matas nativas e APPs, a fazenda é a primeira do Brasil a receber o Certificado Onça-Pintada, por proteção ao maior felino das Américas reconhecido pelo Instituto Onça-Pintada. A Scot Consultoria conversou com o gerente de pecuária, José Neto Leite, que abriu as porteiras para a equipe do Circuito Cria, mostrou o sistema de cria na propriedade e explicou tudo sobre a raça de origem espanhola que produzem para o mundo, a Asturiana de Los Valles. Confira este papo a seguir:

Scot Consultoria: Neto, o Grupo Roncador recebeu a visita da equipe do Circuito Cria, a nossa pesquisa expedicionária que quer entender melhor os indicadores dessa atividade – ao mesmo tempo que leva informação para o campo. Olhando para a cria, por que esta pesquisa é importante, no olhar do Grupo Roncador?

José Neto Leite: É importante saber que existe um movimento, igual ao da Scot Consultoria, que está dando ênfase na cria para vermos os indicadores. Costumo dizer que a parte mais importante do ciclo pecuário é a cria. Claro que existem fazendas, grupos que já estão em um patamar muito mais elevado do que a média brasileira, mas quando a gente pega a cria como um todo, vemos que tem muito o que melhorar ainda. Os indicadores gerais nacionais nos mostram que tem muito o que aprender, muito o que melhorar e muito o que investir ainda. Então, por isso que é importante receber vocês [da Scot Consultoria], é bom acompanhar algumas fazendas que vocês visitaram também e ver o que está sendo feito de inovador.

Scot Consultoria: Falam muito que a cria é o “patinho feio” da pecuária, mas para alcançar objetivos e atender mercados mais exigentes é necessário ter um olhar mais atento para esta fase. O que o pecuarista de hoje precisa entender e aplicar para agregar valor no boi que ele pretende engordar?

José Neto Leite: Eu concordo que a cria é dada como o “patinho feio” do ciclo, mas na verdade ela é a parte mais importante e a menos valorizada como um todo. Ela é o motor propulsor de tudo, onde se inicia tudo, é o momento que o produtor consegue escolher o que vai produzir, ele não fica à mercê do mercado. O pecuarista tem que entender, de um modo geral, que ele tem que investir em tecnologia e começar a sair do boi commodite – principalmente para exportação para a União Europeia, que é um mercado mais exigente –, e começar a ter selos de qualidade, ter mercados distintos para essa carne de qualidade e começar a cobrar por isso. Hoje a gente deve ter em torno de 100,0 milhões de matrizes fêmeas em idade reprodutiva e a gente só insemina usando a tecnologia da IATF em, aproximadamente, 12,0% a 14,0% desse número. É muito pouco. A gente tem muito o que evoluir, tem muito o que crescer. E o pecuarista, de modo geral, ele tem que enxergar a tecnologia como um investimento. Para ele fazer a vaca dar um bezerro por ano, para desmamar um bezerro mais pesado, para definir a carne que ele quer entregar na indústria e começar a cobrar por isso.

Scot Consultoria: Hoje vocês reproduzem a raça Asturiana de Los Valles na propriedade, quando e como vocês iniciaram esse trabalho? Foi necessário importar a genética? Quais os principais desafios de reprodução desta raça em especial?

José Neto Leite: Uma das nossas tecnologias aqui [na Fazenda Roncador] é a raça Asturiana de Los Valles, a gente insemina a matriz Nelore e faz a F1. E iniciamos, na verdade, porque há alguns anos tínhamos o projeto Rúbia Galega com o pessoal do Pão de Açúcar, então era um mercado específico para eles, e a gente conseguia agregar valor em cima desse terneiro que a gente abatia destinado ao Pão de Açúcar. Há uns três anos finalizamos esse projeto e como o Rubia Galega sempre desempenhou muito bem na recria e na terminação, decidimos usar o Asturiano de Los Valles, que é proveniente da Galícia [na Espanha], que tem as características do Rubia Galega e a gente se surpreendeu com o desempenho dele. Em questão de eficiência biológica, rendimento de carcaça, GMD – claro que a gente experimenta, mas tem que priorizar o nosso lucro –, e ele deixa uma margem bem interessante quando comparado com o Nelore e o F1 Angus. O principal desafio dele é a quantidade de touros que existem. É uma genética importada e são poucos exemplares que existem lá. Então, a gente fica à mercê de um número pequeno de reprodutores.

Scot Consultoria: Por uma ótica de quem já vem trabalhando com a Asturiana de Los Valles, como vocês percebem a abertura do mercado para esta raça? O intuito de fazer esta reprodução é atingir os mercados estrangeiros que exigem uma carne de melhor qualidade, mais macia e com mais sabor?

José Neto Leite: Não adianta o negócio ser bonito, ele tem que dar lucro, então, primeiro a gente visa a margem de lucro. E a Asturiana de Los Valles, além dele deixar uma margem interessante e ter eficiência, desempenha muito bem lá na recria e na terminação. E a gente busca agradar a indústria, o mercado. É questão do politicamente correto: uma carne com menor quantidade de colesterol, uma carne mais magra, e que por outro lado também não perde o sabor, não perde a maciez. Então, a gente tem que estar apto às mudanças e tem que buscar abranger outros mercados para o negócio seguir adiante.

Scot Consultoria: Se você pudesse elencar três pilares para nortear a produção de bezerros no Brasil, quais seriam? E os desafios, quais são os três principais desafios que a pecuária brasileira de cria precisa enfrentar, na sua opinião?

José Neto Leite: Os três pilares para a produção de bezerro, eu acredito que seriam: primeiro, a tecnologia, o pacote tecnológico que são a genética e a mão de obra de qualidade; segundo, a nutrição; e terceiro, o manejo. São três pilares primordiais para você conseguir produzir bezerro.

E os três desafios de hoje, eu acredito que, o primeiro é colocar na cabeça do produtor que a tecnologia não é um gasto, é um investimento, o produtor precisa do investimento, porque senão ele não vai conseguir se manter no mercado. Segundo, é ter uma mão de obra, uma consultoria adequada tanto de veterinário como de zootecnista para nutrição. E por último, vejo que o desafio é que estamos perdendo muita área para soja. E o gado do Brasil não vai acabar, então temos que estar preparados para se intensificar cada vez mais.

Scot Consultoria: Levando em consideração estes três pilares que você elencou, como os pecuaristas podem se inspirar no modelo de negócio do Grupo Roncador para alavancar sua produção e contribuir para uma pecuária de margens melhores, com mais qualidade e, ao mesmo tempo, mais sustentável?

José Neto Leite: Somos sempre balizados em indicadores e números. A pecuária é feita de ciclos de alta e de baixa. E quem está no negócio da cria não pode sair, ele tem que se firmar, tem que produzir cada vez mais e cada vez melhor. E o que eu vejo muito é que no ciclo de baixa, por exemplo, o pessoal sai da cria, para de inseminar e abate as vacas. E aí, consequentemente, dali três, quatro, cinco anos, falta gado. É o que acredito que vai acontecer em 2026, o preço do bezerro vai estourar, consequentemente, o pessoal vai reter matriz, o preço da arroba vai subir e os aventureiros entram no negócio. Mas ele entrou na hora errada. Ele tem que entrar no negócio quando o negócio está em baixa. Então muito aventureiro que se diz pecuarista faz o caminho inverso e por isso não consegue se manter.

Enquanto o benchmarking do Circuito Cria não chega, aproveite para se cadastrar para receber em primeira mão o benchmarking do Confina Brasil 2025, que será publicado em breve. Para se cadastrar acesse o site.

José Neto Leite

Médico-veterinário, atua na Fazenda Roncador, em Querência-MT, como gerente de pecuária há mais de 6 anos.

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