Juliano Fernandes, professor da UFG, destaca, no primeiro bloco, o papel estratégico dos coprodutos do etanol, a valorização da pecuária nacional e as perspectivas de novas oportunidades.
Foto: Bela Magrela
Durante o Encontro de Intensificação de Pastagens, realizado pela Scot Consultoria, o professor da Universidade Federal de Goiás (UFG) Juliano Fernandes mediou o primeiro bloco e trouxe reflexões importantes sobre o futuro da pecuária brasileira. Na entrevista, ele destaca a importância de o Brasil valorizar suas próprias conquistas, deixando de lado a chamada “síndrome do vira-lata”, além de abordar o papel estratégico dos coprodutos do etanol, como o DDG, em sistemas de produção mais eficientes e sustentáveis. Juliano também apresenta novidades das pesquisas em andamento na universidade em que leciona.
Scot Consultoria: Professor, o senhor mediou o primeiro bloco do Encontro de Intensificação de Pastagens. Conta para a gente como foi essa mediação e quais foram os insights do evento?
Juliano Fernandes: Participar do evento é sempre um grande prazer para mim. O primeiro bloco foi especialmente interessante, pois trouxe reflexões valiosas a partir da conversa com o Diogo Fleury (Esalq). Um dos principais pontos foi a necessidade de deixarmos de lado as comparações, parar de discutir como o Brasil se posiciona em relação aos Estados Unidos ou à Austrália.
Precisamos olhar mais para a nossa própria realidade e reconhecer que somos bons no que fazemos. Isso reforça que sabemos fazer bem-feito. Temos nossas particularidades, assim como outros países têm as deles. Há aspectos que temos que buscar ser semelhante a eles, mas também existem pontos que eles se inspiram em nós. Ou seja, temos muitas coisas boas.
Outro detalhe que me chamou a atenção, foi a palestra do professor Luiz Gustavo Nussio (Esalq), que abordou a parte de conservação de coprodutos do etanol. Eu sou aficionado por coprodutos, já que o DDG e o WDG estão sempre presentes nas minhas linhas de pesquisa, e trabalho intensamente com esses coprodutos. Então, foi muito bom ver o posicionamento do professor Nussio sobre o assunto.
Quero destacar outros dois pontos importantíssimos do primeiro bloco. O primeiro é a necessidade de que temos que deixar de lado a “síndrome do vira-lata”. Em resumo, precisamos reconhecer que o Brasil é, de fato, muito competente no que faz e é necessário difundir mais o quanto o Brasil é bom em relação a pecuária de corte e a produção de carne bovina. O segundo ponto é a perspectiva de novas oportunidades para os próximos anos. Conforme ressaltou o professor Nussio, a tendência é de aumento na oferta de coprodutos úmidos, em razão da dificuldade de obtenção de cavaco para queima nas destilarias que devem entrar em operação. Com isso, o uso desses coprodutos deve ficar cada vez mais corriqueiro. Foi outra palestra muito importante e que conectou diretamente com a integração lavoura-pecuária-floresta (ILPF).
Nós não vamos deixar de produzir boi, mas também precisamos gerar energia, especialmente bioenergia, que é um dos grandes gargalos das indústrias. Nesse contexto, o eucalipto surge como um parceiro estratégico, mas sem que isso signifique renunciar à pecuária. O Brasil é um dos poucos países do mundo que consegue trabalhar com três safras em um mesmo sistema: grãos no verão, grãos no inverno e ainda integrar pastagem ou floresta sem comprometer o desempenho. Quando conversamos com os americanos, com quem temos bastante contato, e mencionamos esse modelo de três safras, a reação deles é sempre de surpresa. Eles simplesmente não conseguem compreender como conseguimos alcançar esse feito.
Scot Consultoria: Professor, vou aproveitar a sua fala a respeito dos coprodutos das usinas de etanol. Você poderia trazer para nós um pouco do que tem sido desenvolvido em termo de pesquisas na UFG? O que você poderia contar de novidade?
Juliano Fernandes: Estamos conduzindo um experimento muito interessante por lá em parceria com uma empresa do setor. Um dos objetivos é encurtar o período de adaptação no confinamento, utilizando maior proporção de DDG já no início da dieta. Atualmente, conseguimos trabalhar com cinco dias de adaptação usando uma dieta que muitos nutricionistas utilizariam apenas no final do confinamento, por ser uma dieta muito mais energética. Com isso, teremos importantes dados sobre o teor de energia da dieta e o impacto no período de adaptação.
A nossa intenção é encurtar o período de adaptação dos bovinos, utilizando uma dieta com menor concentração de amido. Os resultados preliminares estão fantásticos. Ainda não posso divulgar números, porque, como costumamos dizer na pesquisa, “o jogo só termina quando acaba”. Mas, até aqui, o potencial observado é enorme. Poucas vezes, fizemos um experimento que me encantasse desde o começo.
Nós, em anos anteriores, já fizemos experimentos testando níveis menores de adição de forragem na dieta com inclusão também de aproximadamente 45,0% de DDG, e já estudamos diferentes níveis de ureia associados ao DDG, trabalho que em breve será publicado. Há apenas um trabalho no mundo que observou essa relação de níveis de ureia, então é bem interessante.
Sempre venho falando isso, que nós vamos chegar um dia que o DDG vai ser mais barato que o milho, e precisamos estar preparados para usar essa tecnologia em larga escala. O DDG deixará de ser apenas uma fonte proteica para ser também uma fonte energética.
Sempre comento nas minhas aulas de graduação, quando trabalhamos a classificação dos alimentos, separando o que é volumoso, energético e proteico, que existe algumas grandes exceções. O DDG é justamente uma delas: possui alto teor de fibra, muita energia e, também muita proteína. É, portanto, um verdadeiro alimento “coringa”.
Scot Consultoria: Professor, para encerrarmos nossa conversa, gostaria que o senhor deixasse uma mensagem para aqueles que não puderam estar conosco neste ano, convidando-os a participar em 2026 — seja em abril, no Encontro de Confinamento e Recriadores, ou no próximo Encontro de Intensificação de Pastagens.
Juliano Fernandes: Eu acredito que a pessoa tenha que participar nos dois encontros da Scot Consultoria, tanto o de Confinamento e Recriadores quanto o de Intensificação de Pastagens. Toda vez que venho para o evento é uma coisa nova que aprendemos, é uma troca de experiência nova, e acho isso muito engrandecedor. Esses eventos são consolidados como os maiores eventos do Brasil. Há uma preocupação de a Scot tem de preparar os eventos com antecedência, para evitar sobreposição de informações e garantir que tudo se encaixe de forma estruturada. Isso valoriza o tempo de quem participa e enriquece a experiência. Além disso, o cuidado com os palestrantes e participantes, e a diversidade de profissionais do Brasil inteiro e até do exterior, engrandece ainda mais os encontros. A cada edição aprendo algo novo, faço novos relacionamentos e volto com mais conhecimento.
Em 2026, o Encontro de Confinamento e Recriadores já tem data marcada, de 7 a 10 de abril em Ribeirão Preto/SP, e em breve será divulgada a data para a próxima edição do Encontro de Intensificação de Pastagens. Fique atento ao nosso site e às mídias sociais para acompanhar as novidades e garantir sua vaga.
Médico-veterinário pela Universidade Federal de Goiás (1997), mestre em Ciência Animal e Pastagens pela Universidade de São Paulo (2000), doutor em Ciência Animal e Pastagens pela Universidade de São Paulo (2004) e com pós-doutorado na Universidade do Nebraska em Lincoln-NE (2015). Atualmente, é professor titular da Universidade Federal de Goiás e coordenador do Confinamento Experimental de Bovinos de Corte (CEBC - UFG).
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