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Scot Consultoria

Carta Boi - Proteínas alternativas: um termo ultrapassado?


Quarta-feira, 7 de dezembro de 2022 - 06h00

Foto: Shutterstock


Fazendo jus ao sintoma mais característico dessa enfermidade, a pandemia da covid-19 literalmente afetou o paladar da população mundial. E não estamos falando apenas das vias sensoriais, mas sim do interesse do consumidor por determinados alimentos.


Durante a pandemia, assistimos à perda do poder de compra da população diante de uma crise sanitário-econômica em nível global, afetando diretamente o consumo da carne bovina.


Segundo a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), em 2022, o consumo de carne bovina no Brasil deve ser o menor em 26 anos, desde o início da série histórica em 1996 (figura 1). De acordo com o levantamento realizado pela Scot Consultoria, o consumo doméstico anual, em 2022, está em aproximadamente 24,3 quilos de carne bovina por habitante (disponibilidade interna).


Figura 1.
Evolução do consumo brasileiro de carne bovina, em kg/habitante/ano (1996-2023).

*projeção
Fonte: IBGE / Elaborado por Scot Consultoria


Frente a esse cenário, o consumo de proteínas alternativas à carne bovina aumentou.


Desde 2010, o consumo de ovos foi o que mais aumentou, crescendo 77%, o equivalente 114 ovos a mais por pessoa por ano.


O aumento da procura pela carne suína também cresceu, cujo incremento foi de 20,6% nos últimos doze anos. Esse crescimento foi 4,75 vezes maior frente ao aumento no consumo de carne de aves, que desde 2010 cresceu 4,3%.


O consumo de carne de frango cresceu menos percentualmente pois já era e ainda é a carne mais consumida. Para 2022, as projeções apontam um consumo per capita anual de 46kg, sendo esse o maior volume dos últimos dez anos.


O encarecimento da carne bovina tem levado o consumidor a outros alimentos de custo menor, a procura pela carne suína também melhorou (figura 2).


Figura 2.
Consumo per capita de carne de frango, suína e bovina, em quilos (eixo da esquerda), e de ovos, em unidades (eixo da direita).

*projeção
Fonte: ABPA e IBGE / Elaborado por Scot Consultoria


Levando em conta esse cenário, podemos dizer que o termo “proteínas alternativas” à carne bovina não faz mais sentido.


Fica o questionamento: seria esse comportamento um período de adaptação ou estamos vivendo uma transição no perfil de consumo doméstico? O consumo de carne bovina pode voltar aos mesmos patamares dos anos anteriores?


Para uma resposta, cabe analisar três variáveis que devem influenciar esse comportamento: a oferta por tipo de proteína, o repasse de preços ao varejo e a recuperação do poder de compra do consumidor final.


Oferta em ano de transição

O ciclo pecuário de preços tem uma duração média de seis anos, sendo três de retenção de fêmeas e três de descarte de fêmeas.


Após três anos marcados por uma forte retenção de fêmeas, o mercado do boi gordo, em 2022, vive um período de transição no ciclo pecuário de preços, saindo de uma fase alta da arroba do boi e entrando em fase de baixa, ocasionada pelo maior descarte de fêmeas, consequentemente, com queda nas cotações.


A fase de baixa do ciclo é caracterizada, justamente, pela maior oferta de bovinos.


Esse crescimento no abate de bovinos, no ano vigente, impulsionado pela maior participação de fêmeas no abate, explica em certa medida a queda na cotação da arroba que assistimos ao longo do ano e que, provavelmente, continuará em 2023.


Impactos no atacado e no varejo

Com mais boiadas e sob uma demanda reprimida no mercado interno, a cotação da arroba do boi gordo caiu, mas essa queda não foi repassada com a mesma intensidade ao consumidor final.


Dessa forma, a ponta varejista está mantendo os preços e realizando promoções pontuais, como estratégia para reduzir os estoques.


Em novembro, a cotação média da arroba foi de R$275,02. No mesmo período, o Equivalente Físico, que consiste na remuneração com a venda de carne com osso (traseiro, dianteiro e ponta de agulha) no mercado atacadista, permitia o pagamento de R$276,37/@, evidenciando o estreitamento de margem com a venda somente da carne no mercado atacadista.


No entanto, a relação melhora quando além da carne vende-se também o couro e o sebo bovino (Equivalente Scot), que indica em R$286,16/@. Lembrando que margem não é lucro, pois os custos não são considerados.


Como anda o “bolso” do consumidor?

Existem indicadores econômicos e sociais que reportam o poder de compra da população.


Um deles é o PIB. O PIB - Produto Interno Bruto - é um indicador econômico que representa a soma de todos os bens e serviços produzidos em determinado país, estado ou cidade, ao longo de um determinado período.


O PIB é calculado usando a moeda local. Sua variação, em percentual, é um dos indicadores utilizados para analisar e comparar o desenvolvimento econômico de uma região ao longo do tempo, sendo que, uma variação positiva indica desenvolvimento do setor analisado (figura 3).


Figura 3.
Variação anual do PIB brasileiro, desde 2010.

*expectativa – Boletim Focus 30/11/22
Fonte: IBGE / Elaborado por Scot Consultoria


Entre 2015 e 2016, o Brasil sofreu forte recessão econômica. Após três anos de lenta recuperação, em 2020, marcado pela pandemia da covid-19, a economia não cresceu, o PIB revelou retração econômica.


Esse cenário revela um subdesenvolvimento da economia brasileira, impactando direta e indiretamente no poder de compra do consumidor doméstico.


Na figura 4, está a evolução do salário mínimo no mesmo período, de 2010 a 2022, deflacionado pelo IGP-DI versus a decadência do consumo de carne bovina.


Figura 4.
Salário mínimo, em reais, deflacionado pelo IGP-DI (eixo da esquerda) e consumo de carne bovina em kg/habitante/ano (eixo da direita).

*período pós covid-19
Fonte: IPEA e IBGE / Elaborado por Scot Consultoria


Expectativas

Em curto prazo, as festividades de final de ano, Copa do Mundo, 13º salário e bonificações tendem a impulsionar o consumo doméstico e melhorar o consumo de carne bovina.


No entanto, na última quinzena de novembro, a oferta de bovinos para abate caiu. Abriu-se uma lacuna na oferta de bovinos terminados que está repercutindo na cotação do boi gordo, que reagiu.


No entanto, para o médio e longo prazo, tendo em vista o ciclo pecuário de preços, o abate de bovinos tende a ser maior em 2023. O preço da arroba deverá continuar em patamares menores em relação aos anos anteriores.


Em médio prazo, olhando para indicadores macroeconômicos, com a taxa de desemprego em um dos menores patamares desde 2015 e expectativas positivas para o Produto Interno Bruto brasileiro em 2023 (a ver), as perspectivas de recuperação do poder de compra do consumidor são positivas.


Portanto, levando em consideração o incremento na oferta de boiadas e uma possível melhora no poder de compra do consumidor, não estão descartadas quedas ou estabilidade no preço da carne bovina em 2023, o que deve melhorar o consumo até então retraído.


Referências bibliográficas

ABPA, Associação Brasileira de Proteína Animal


IBGE, Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística


IPEA, Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada



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