• Quinta-feira, 19 de junho de 2025
Assine nossa newsletter
Scot Consultoria

Produção agrícola e pecuária em unidades de conservação


Sexta-feira, 20 de junho de 2025 - 16h00


Foto: Bela Magrela


Introdução

A venda de gado em áreas de Unidades de Conservação (UCs) tem gerado grande insegurança jurídica entre os pecuaristas, especialmente após as operações de fiscalização realizadas pelo Ministério Público Federal (MPF) e pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) na Floresta Nacional do Jamanxim, no Pará.

É cada vez mais importante entender a legislação e as consequências legais que envolvem a comercialização de gado em áreas protegidas. Este artigo tem como objetivo explicar a legalidade da atividade, as recentes mudanças nas leis, os riscos para os envolvidos e os cuidados necessários para evitar penalidades.

O direito à continuidade das atividades econômicas em uma área atingida por unidade de conservação

O primeiro ponto que precisa ser esclarecido é que a falta de planejamento e continuidade das políticas públicas torna legal uma situação imprevista em lei e bastante peculiar: existem situações em que a produção agrícola e a pecuária no interior de uma Unidade de Conservação de Proteção Integral são atividades totalmente lícitas. 

De acordo com a Lei uma Unidade de Conservação como uma Floresta Nacional ou Uma Reserva Biológica, por exemplo, deve ser de posse e domínio públicos. Ou seja: eventual área particular que esteja inserida no perímetro de proteção deve ser desapropriada e desocupada.

Isso significa que, antes de criar uma área especialmente protegida, o Poder Público deveria avaliar a relevância ecológica do local e os impactos sociais e econômicos da medida, reservando orçamento suficiente para a desapropriação dos atingidos.

Mas não é o que acontece na prática. São várias as unidades de conservação criadas sem previsão orçamentária e sem previsão de desapropriação.

Consequentemente, os particulares que ocupam áreas no interior de uma unidade de conservação sem regularização fundiária não têm alternativa senão lá permanecerem, praticando suas atividades econômicas. 

Este direito está, inclusive, expresso no artigo 22-A da Lei 9.985/2000, que resguarda os direitos dos ocupantes enquanto o processo de instituição de uma unidade de conservação não é finalizado.

Sendo assim, o primeiro ponto que precisa ser esclarecido é que, diante da situação atual de grande parte das unidades de conservação do país, decorrente da inércia e falta de organização do poder público, existem áreas com atividade agrícola e criação de gado em Unidade de Conservação que estão plenamente regulares.

Aqui cabe uma ressalva: o direito de permanecer na área é daqueles que já estavam no local quando da criação da UC e se limita à área aberta antes da sua criação. 

Qualquer supressão sem autorização realizada depois da criação da unidade de conservação é infração administrativa e deve ser fortemente coibida.

Alterações no decreto no. 6.514/2008: novos tipos de infrações

Uma das alterações mais recentes no Decreto no. 6.514/2008, que regula as infrações ambientais no Brasil, trata, exatamente, da comercialização de produtos de origem animal e vegetal provenientes de áreas desmatadas irregularmente em Unidades de Conservação.

O artigo 54-A tornou a infração mais ampla.

Antes de 24 de maio de 2022 a autuação pela comercialização de produtos oriundos de áreas com supressão irregular em unidade de conservação exigia embargo prévio e divulgado em sites oficiais.

Agora a venda de gado proveniente de áreas desmatadas sem autorização é considerada infração mesmo que a área não tenha sido embargada previamente. A multa é de quinhentos reais por cada quilograma ou unidade de gado comercializado.

Além da multa a área é embargada e há risco de suspensão dos cadastros nas Agências de Defesas Agropecuárias. O transtorno é enorme e a regularização da situação trabalhosa e demorada.

A alteração compromete a segurança das relações comerciais, já que uma área embargada pode ser identificada a partir dos cadastros públicos, mas a identificação de um desmatamento irregular exige conhecimento técnico e a interpretação de dados que muitas vezes são de difícil acesso.

Em outras palavras, o poder público passa ao particular a responsabilidade por fiscalizar e verificar a regularidade ambiental das áreas relacionadas às suas atividades comerciais e aqueles que não estiverem aptos a comprovar a adequação de suas áreas certamente terão suas atividades comprometidas.

Pontos de atenção

A alteração legislativa exige dois pontos de atenção: 

O primeiro é a data de vigência da alteração. Sem se atentar para o início da vigência do artigo 54-A, os órgãos ambientais têm aplicado multas sobre ações realizadas entre 2018 e 2022, época em que ainda era exigido prévio embargo prévio da área. Esta autuação é incorreta e precisa ser combatida.

Além disso, a comercialização de produtos oriundos de áreas dentro de unidades de conservação deve ser precedida de uma análise prévia da regularidade ambiental. 

Apenas uma certidão negativa de embargo não é mais suficiente. 

Os pecuaristas devem começar verificando a regularidade das Guias de Trânsito Animal (GTAs), que são exigidas para o transporte de gado. É fundamental checar se as informações sobre os locais de origem e destino estão corretas e se as datas de emissão das GTAs seguem as normas legais em vigor.

Em um segundo momento será necessário avaliar a dinâmica de desmatamento do local de onde são adquiridos os produtos. 

A recomendação é que os produtores se antecipem aos problemas, aprofundando o conhecimento de suas áreas e regularizando eventuais irregularidades.

Em caso de multa recomenda-se a consulta com um advogado especializado, que pode ajudar a analisar o caso e, se necessário, contestar a autuação. Negociar diretamente com os órgãos fiscais sem o apoio de um especialista pode resultar em prejuízos e complicações legais.

Pineda & Krahn, Sociedade de Advogados


Ana Cristine Vieira Galvan

Advogada graduada pelo Centro Universitário Curitiba - UNICURITIBA, pós-graduanda em Direito Ambiental com ênfase em Direito Agrário pela Faculdade CERS.

Manoele Krahn

Advogada graduada pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná, especialista em Direito Ambiental pela Universidade Positivo. Sócia-administradora do escritório Pineda & Krahn Sociedade de Advogados.

<< Notícia Anterior
Buscar

Newsletter diária

Receba nossos relatórios diários e gratuitos


Loja