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Do cadastro ao laudo: evitando prejuízos comerciais na propriedade rural


Segunda-feira, 12 de maio de 2025 - 06h00


Foto: Bela Magrela


No cotidiano das atividades agropecuárias, atividades envolvidas diretamente com o cultivo ou manejo, até mesmo o planejamento agrícola ou pecuário, parece ser a prioridade óbvia de qualquer produtor.

No entanto, muitas vezes é o que está no papel - ou na falta dele - que acaba trazendo os maiores prejuízos. E quando falo em prejuízo, não me refiro apenas a multas ambientais ou embargos, mas à perda de grandes oportunidades de mercado, crédito ou valorização do patrimônio.

A lógica de uma gestão agropecuária eficiente e juridicamente segura está no preenchimento correto dos cadastros obrigatórios até a elaboração de laudos técnicos periciais, percorrendo um caminho que, se bem trilhado, pode evitar riscos, antecipar problemas e garantir tranquilidade ao produtor.

Uma propriedade rural que não cuida da atualização dos seus registros está plantando problemas e colhendo prejuízos. E, muitas vezes, prejuízos que poderiam ter sido facilmente evitados.

Muitos produtores encaram a exigência de documentos e cadastros como mais uma burocracia imposta pelo governo, mas a verdade é que esses registros são cada vez mais utilizados como critério para concessão de crédito rural, negociação com grandes empresas e comprovação da regularidade da propriedade.

Uma verdade que precisa ser dita: a maioria das informações que sustentam a regularidade de uma propriedade rural é auto declaratória. Ou seja, não basta preencher cadastros; é preciso comprovar a veracidade dessas informações quando necessário.

Vejamos alguns exemplos:

CAR (Cadastro Ambiental Rural): auto declaratório e obrigatório para todas as propriedades e essencial para acessar programas de regularização ambiental. Uma enorme quantidade de imóveis inscritos ainda aguarda análise dos órgãos ambientais estaduais

CCIR (Certificado de Cadastro de Imóvel Rural): auto declaratório e exigido em transações imobiliárias (arrendamento, compra e venda, desmembramento, sucessão patrimonial) e até mesmo para emissão de financiamentos junto aos bancos.

ITR (Imposto Territorial Rural): auto declaratório e de recolhimento obrigatório, uma declaração imprecisa com avaliação menor do que realmente vale o imóvel, pode gerar multa, cobrança de imposto retroativo dos últimos cinco anos e até bloqueios fiscais.

Matrícula Imobiliária Atualizada: A certidão da matrícula do imóvel é o que comprova a propriedade perante terceiros. Matrículas desatualizadas, com inconsistências ou sobreposições podem anular negócios, impedir financiamentos ou até gerar perda de área.

Georreferenciamento: obrigatório e garante precisão nos limites das propriedades rurais, evitando evita sobreposição de áreas e conflitos fundiários.

Matrícula: obrigatório para propriedades com mais de 100 hectares, garante precisão nos limites e evita sobreposição de áreas e conflitos fundiários.

Além disso, mapas de sobreposição com terras indígenas, unidades de conservação ou áreas de quilombolas devem ser constantemente monitorados.

Negligenciar essas obrigações pode resultar em multas, bloqueio da comercialização de produtos e perda de acesso ao crédito.

Ter todos esses cadastros em dia e com informações corretas não é mais um diferencial - é um pré-requisito para a competitividade no agronegócio.

Pouco explorada por parte dos produtores, eventualmente por entender que não é necessário ou que não vale o investimento, a perícia agrária é um instrumento poderoso na prevenção e resolução de conflitos. Ela pode ser classificada em duas modalidades: preventiva e reativa.

A perícia preventiva permite identificar falhas ou riscos em contratos, imóveis ou operações antes que se tornem um problema. É especialmente útil em contratos de arrendamento, compra e venda de terras, regularização ambiental ou planejamento sucessório.

A perícia reativa, por sua vez, é usada na defesa do produtor em processos judiciais ou administrativos, como em casos de embargo ambiental, desapropriação ou litígios de vizinhança.

Em todos os casos, a presença de um laudo técnico bem elaborado fortalece a posição jurídica do produtor e contribui para decisões mais justas por parte de juízes, órgãos ambientais ou instituições financeiras.

Realizar uma perícia preventiva em contratos de arrendamento, compra e venda de terras ou na conferência de documentos fundiários pode evitar dores de cabeça imensuráveis como a descoberta de que não existe a área contratada, passivos ambientais ocultos, improdutividade da área, falta de acessos, o que, no futuro, gera disputas por frustração de safra, danos ambientais ou inadimplência.

A maioria dos contratos de arrendamento e muitas transações de compra e venda de terras são feitos sem a mínima análise técnica. Isso leva a prejuízos como embargos ambientais, restrições de uso e litígios fundiários.

Em processos de desapropriação, a ausência de laudos técnicos pode fazer a indenização ser até 40% inferior ao valor de mercado real, ou seja, uma perda de quase metade do que vale a terra por não ter documentação técnica adequada.

Atualmente, grandes frigoríficos e empresas agrícolas exigem que seus fornecedores estejam ambientalmente regularizados. Empresas que não atendem a essas práticas de responsabilidade socioambiental (ESG) estão perdendo espaço no mercado internacional.

Em um cenário de exigências crescentes, propriedades com embargos ambientais ou com registros irregulares são automaticamente excluídas de diversas cadeias produtivas.

Portanto, manter um controle documental rigoroso e realizar perícias técnicas periódicas não é mais uma opção - é uma necessidade para quem quer garantir acesso a mercados, crédito e novos negócios.

Diante disso, a principal recomendação é clara: o produtor precisa incluir a regularização documental e a perícia técnica dentro do seu planejamento de gestão.

Isso significa montar um cronograma de revisões cadastrais, contar com profissionais habilitados (advogados, agrônomos, engenheiros ambientais) e adotar tecnologias que auxiliem no monitoramento da propriedade. Além disso, recomenda-se: Realizar auditorias internas com apoio técnico; utilizar tecnologias de georreferenciamento e monitoramento; manter atualizados os principais cadastros obrigatórios; e investir em perícias preventivas para operações estratégicas.

Com isso, o produtor se antecipa aos problemas, garante segurança jurídica, facilita o acesso a crédito, preserva seu patrimônio e amplia suas chances de se manter competitivo num mercado cada vez mais exigente.

Em tempos em que o agronegócio brasileiro se destaca no cenário internacional, não há mais espaço para improviso na gestão das propriedades rurais. O sucesso de uma propriedade rural não depende apenas de clima e capacidade de produção, mas também daquilo que está registrado, documentado e tecnicamente comprovado.

Segurança jurídica não se improvisa; se constrói com planejamento e técnica. O produtor que investe em perícia e gestão documental hoje, recebe um futuro de tranquilidade e valorização do patrimônio.


Pedro Puttini Mendes

Advogado (OAB/MS 16.518, OAB/SC 57.644) e Professor em Direito Agrário, Ambiental e Imobiliário. Comentarista de Direito Agrário para o Canal Rural. Organizador e coautor de livros em direito agrário, ambiental e aplicado ao agronegócio. É membro fundador da União Brasileira da Advocacia Ambiental (UBAA) e membro das comissões de Direito Ambiental e Direito Agrário da OAB/SC. Foi Presidente da Comissão de Assuntos Agrários e Agronegócio da OAB/MS e membro da Comissão do Meio Ambiente da OAB/MS entre 2013/2015. Doutorando em Planejamento Territorial e Desenvolvimento Socioambiental pela Universidade do Estado de Santa Catarina, Mestre em Desenvolvimento Local (2019) e Graduado em Direito (2008) pela Universidade Católica Dom Bosco.

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