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Scot Consultoria

Entre a euforia e a cautela


Sexta-feira, 22 de maio de 2015 - 17h48

Debate durante o Encontro de Confinamento 2015

A conjuntura atual de mercado gerou uma onda de otimismo entre os confinadores, sobretudo quando se leva em conta uma expectativa futura de custos baixos de insumos, sustentada pela queda no valor do milho, e de preços altos do boi gordo, superiores aos patamares recordes atuais - no fim de abril, os contratos para novembro na BM&FBovespa indicavam um valor de arroba ao redor de R$ 155, base São Paulo. Porém, como ninguém tem certeza sobre o dia de amanhã, convém não ir com tanta sede ao pote - é preciso, desde já, se prevenir contra possíveis mudanças drásticas de rumo, hipótese não descartada pelos especialistas de mercado, que apontam para um cenário nebuloso para o segundo giro do confinamento, a partir do próximo semestre do ano, diante da disparada nos preços dos animais de reposição e do enfraquecimento da demanda interna por carne bovina.

"No momento todas as contas são favoráveis ao confinador, mesmo com o aumento excessivo do boi magro. Mas é preciso tomar cuidado para não cair na armadilha da euforia", alerta Leandro Bovo, operador de commodities do Banco Espírito Santo de Investimento - BESI Brasil, com sede na capital paulista, um dos participantes de uma "mesa redonda de debates", promovida pelo Encontro de Confinamento, da Scot Consultoria, de Bebedouro, SP, evento realizado em abril, em Ribeirão Preto, SP, e que contou com uma plateia de mais de 600 pessoas. O evento completou dez anos de existência (veja quadro abaixo).

Na avaliação de Bovo, o erro não está em especular com o preço do boi gordo - ainda mais quando o mercado futuro aponta para um patamar nunca visto na história da pecuária brasileira -, mas sim fazê-lo sem que haja por trás disso um mecanismo seguro de proteção de preço, que garanta lá na frente lucratividade na operação. Compartilham da mesma opinião Hyberville Neto, Alex Santos Lopes da Silva e Gustavo Aguiar, o trio de analistas da Scot Consultoria, que abordaram o tema "confinamento" em suas palestras em Ribeirão Preto. "Diante da oferta restrita, o preço do boi tende a permanecer firme, mas não convém arriscar muito", diz Neto, ressaltando a importância de buscar ferramentas de proteção (hedge), seja o contrato a termo, o mercado de opções ou mercado futuro. "Não podemos esquecer que a demanda de carne bovina tem patinado, tanto no mercado interno quanto para as exportações", afirma Silva, sugerindo que o pecuarista deveria estar com a "pulga atrás da orelha" em relação ao comportamento futuro do mercado de boi gordo. "Quando a atividade é muito intensiva, como é caso do confinamento, trabalha-se com margens de erros bem menores; qualquer desatenção em relação ao mercado e ao custo de produção pode reverter o resultado do azul para o vermelho rapidamente", alerta Aguiar.

Estimativa da Associação Nacional dos Confinadores (Assocon) aponta crescimento de 5% na engorda intensiva este ano, para algo em torno de 4,4 milhões de cabeças. Pesquisa feita em fevereiro com os associados da entidade, em 85 confinamentos, indica aumento de 8% na atividade do grupo, com a engorda de 800 animais. Bruno Andrade, gerente-executivo da Assocon, também presente no evento da Scot, diz que alguns confinadores decidiram antecipar o fechamento dos animais no cocho, para aproveitar os bons preços do boi neste primeiro semestre. "A gente detectou que alguns confinamentos em Goiás iniciaram mais cedo o período de engorda, com o intuito de tentar vender o boi até julho e, assim, garantir o lucro vigente", informa Andrade.

Por conta disso, continua ele, é bem provável que, no primeiro ciclo, "o número de animais confinados seja superior ao registrado em igual intervalo de 2014, ao passo que, talvez, no segundo giro, o total de cabeças no cocho fique um pouco aquém do observado no mesmo período do ano passado". Independentemente do período de engorda, o gerente-executivo da Assocon também defende o uso de mecanismos de proteção de preço. "Primeiramente, o confinador precisa conhecer, com absoluta precisão, todos os seus gastos com a engorda intensiva. Isto posto, recomendamos que se faça, no mínimo, um hedge de seu custo de produção", diz Andrade.

Em abril, a DBO conversou com vários confinadores presentes em Ribeirão Preto, no evento da Scot. Eles reforçaram o clima de otimismo em relação à atividade de confinamento este ano. A maioria absoluta dos entrevistados disse que pretende lançar mão de alternativas de proteção de preço. Entre as modalidades escolhidas, prevalece o mercado de opção. "Esse é o modelo preferido hoje por quem procura mitigar riscos", atesta Leandro Bovo, do BESI Brasil, acrescentando que a instituição tem verificado atualmente um crescimento dessa operação em detrimento das outras ferramentas disponíveis no mercado futuro.

Segundo Bovo, diferentemente do modelo tradicional de fixação de preço futuro, em que o pecuarista deixa de ganhar caso a arroba suba acima do valor estipulado (e ainda tem que arcar com o aumento da reposição, que normalmente acompanha a valorização do boi) -, no mercado de opção, o produtor adquire o direito - e não a obrigação - de negociar, no futuro, seus animais a um determinado preço. Caso a arroba do boi, na data de entrega dos animais, esteja acima do valor fixado, o pecuarista não exerce o seu direito, recebendo o preço do dia - mas se o mercado estiver abaixo do valor estipulado, ele recebe o valor mínimo que havia sido segurado. "Embora tenha um custo, em torno de R$ 2,50- R$ 3,00/@, é uma operação que vale muito a pena, pois, além de eliminar a possibilidade de prejuízos, permite que o produtor ganhe na alta, além de se proteger contra o risco da reposição", ressalta.

Expectativas no cocho - Márcio Lupatini, responsável pelo setor de recria do Grupo Mantiqueira, de Água Boa, MT, que trabalha com recria a pasto e engorda intensiva (capacidade estática para 30.000 cabeças), diz que a empresa pretende confinar 40.000 animais este ano, número semelhante ao registrado no ano anterior. Segundo ele, esse número só não será maior porque o grupo está tendo dificuldade na compra de animais de reposição - sobretudo boi magro - para o segundo giro de confinamento, devido escassez de oferta. Como solução para o impasse, diz Lupatini, o grupo comprou bezerros, antecipadamente, e passou a recriá-los em pastos próprios e áreas arrendadas (total de 60 mil hectares), com o objetivo de leva-los para o cocho no segundo semestre. "Certamente, este gado entrará mais leve para o confinamento, com 11@, aproximadamente", afirma ele, acrescentando que os bois do primeiro giro ingressaram no cocho com 14@, em média.

Em relação à estratégia de proteção de preço, a Mantiqueira, diferentemente da tendência atual do mercado, vem dando preferência ao fechamento de contratos de boi a termo, modelo de fixação de preço na BM&FBovespa intermediado por um frigorífico - nesse caso, o JBS. "O importante é garantir a margem de ganho", afirma Lupatini, que conclui a entrevista à DBO com um ditado comum nos corredores do Grupo Mantiqueira: "Lucro pequeno não quebra ninguém".

A Vera Cruz Agropecuária, do Grupo Otávio Lage, de Goianésia, GO, que possui confinamento com capacidade estática de 20.000 cabeças, prevê elevar em mais de 22% a engorda intensiva em 2015, para 27.000 animais, em relação ao volume de 2014 (22.000 bovinos). Uma pequena parte dos animais confinados (em torno de 5%) será sustentada por parceiros, em operações de boitel ou sistemas de cobrança por arroba ganha, informa Leonardo Rios, gestor de pecuária do grupo, que também acompanhou as palestras em Ribeirão Preto. Segundo ele, a empresa já tem garantido 70% de sua necessidade para o confinamento deste ano. "Um terço dos animais são advindos de nossas matrizes", diz o gestor do grupo, que, além da estrutura de cocho, possui fazendas de cria e recria no Estado de Goiás.

Rios diz que, para fugir das altas na reposição, a empresa Vera Cruz trabalha com a compra antecipada de animais de terceiros, que, estrategicamente, vêm sendo recriados em fazendas próprias desde o ano passado. Para aproveitar o preço atrativo do boi no mercado futuro, o grupo tem escolhido a modalidade de opção. "Preferimos trazer para dentro de casa a operação de venda de nossa boiada, em vez de utilizar o modelo de boi a termo com o frigorífico", afirma Rios. Em meados de abril, o grupo operava contratos na BM&F com seguro (preço mínimo) ao redor de R$ 150/@, para outubro, base Goiás (em abril, o valor vigente na região girou em torno R$ 140/@).

Também presente no evento da Scot Consultoria, Paulo de Siqueira Melo, acionista membro da família proprietária do Grupo Otávio Lage, responde também pela gerência da Nelore Santa Clara, de Aruanã, GO, que possui um confinamento de menor porte, com capacidade estática para 2.000 cabeças, abastecido apenas com animais de cria própria --- a empresa faz ciclo completo. "Para este negócio, pretendemos travar, por meio de contratos de opção, pelo menos 30% da boiada confinada, com entrega prevista para outubro e novembro", releva Melo, acrescentado que o valor futuro almejado também gira em torno de R$150/@. Nessa operação, está programada a engorda de 2.000 cabeças, aproximadamente, praticamente a mesma quantidade do ano passado.

Embora trabalhe com um pouco de cautela em relação ao valor futuro do boi - protegendo 30% da safra -, Melo acredita em alta da arroba no fim do ano. "Vai faltar boi gordo no mercado", prevê.

"Surfar na alta" - A premissa de que não haverá oferta suficiente de animais para abastecer a demanda da indústria frigorífica no segundo semestre é prato cheio para os pecuaristas mais ousados, que não escondem a preferência em trabalhar "ao sabor do mercado", em vez de buscar algum tipo de segurança de preço na BM&FBovespa.  Esse é o perfil de Anderson Zanetti, sócio-proprietário da Fazenda Bonanza, de Poxoréu, MT, que faz recria e engorda intensiva (estrutura com capacidade estática para 5.000 cabeças). "Neste ano, particularmente, optamos em operar somente no mercado físico, pois acreditamos em forte escassez de oferta de boi gordo no último trimestre do ano, o que vai puxar o preço da arroba para as alturas", aposta, completando que vislumbra, para o período, um boi ao redor de R$ 155/@ em sua região.

Este ano, a Fazenda Bonanza espera confinar "entre 8.000 e 10.000 animais", número que, diz Zanetti, vai depender do sucesso (ou não) da compra de animais necessários para o segundo giro de engorda. "Para o primeiro ciclo, está tudo comprado; para o segundo, ainda é uma incógnita", afirma o produtor, referindo--se à dificuldade em encontrar boi magro na região, além do problema de preço elevado (ágio de 20% sobre o valor do boi gordo, segundo ele).

Marcelo Vitti, da Fazenda Jandaia, de Itumbiara, GO, que também produz cana em 1.800 ha, também não fará hedge de sua produção no cocho, estimada em 400 cabeças (vacas e novilhas, somente). Porém, a sua opção de ficar "descoberto" no mercado nada tem a ver com "ousadia de investidor", mas sim pelo fato do pecuarista estar estreando este ano na atividade de confinamento. "Prefiro sentir o mercado, por isso vou fazer somente o primeiro giro, trabalhando, assim, com maior cautela e segurança", afirma ele, que assumiu, há um ano, a administração da fazenda de seu avô, que adoeceu.  "Paralelamente à cana, resolvi apostar no confinamento, que estava desativado e tem estrutura para 2.000 bois", diz.

Veja a matéria na Revista DBO: https://www.scotconsultoria.com.br/down/encontros-recriadores-e-confinamento-dbo.pdf

Confira a cobertura completa dos encontros no site: http://www.encontroconfinamento.com.br/ 

Fonte: Revista DBO - edição de maio, n°415. Texto de Denis Cardoso.


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