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Scot Consultoria

Desvendando a estação de monta: cuidados importantes e tendências para 2025

Entrevista com o médico veterinário, Eduardo Antônio de Almeida Rossignolo

Segunda-feira, 21 de outubro de 2024 - 06h00
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Médico-veterinário pela Universidade Federal do Mato Grosso do Sul (UFMS), especialista em reprodução de grandes animais e Mestre em Clínica Veterinária com ênfase em reprodução de bovinos pela Universidade Estadual de Londrina (UEL).

Foto por: Bela Magrela


Scot Consultoria:  Quando falamos em planejamento e organização da fazenda para a estação de monta, quais são as principais áreas que o pecuarista deve focar antecipadamente, como nutrição, sanidade e infraestrutura? Como o uso de novas tecnologias de gestão pode ajudar nesse processo de preparação?

Eduardo Rossignolo: A estação de monta (EM) é um dos eventos dentro da fazenda de cria com maior importância do sistema produtivo. É o momento em que as vacas são expostas a touro (monta natural-MN) ou a biotécnicas reprodutivas, dentre elas, a inseminação artificial em tempo fixo (IATF) que é a de maior relevância. Contudo, isso é só o final da corrida.  
A EM tem início muito antes do que se imagina. Seu início ocorre com os primeiros nascimentos da estação de parição, da estação reprodutiva passada. O cuidado com a condição de escore corporal (ECC) é um dos fatores que vão impactar na performance reprodutiva da estação seguinte. Associado ao ECC de parição, é importante salientar que a manutenção do ECC é necessária, e a adoção de estratégias nutricionais para essas fêmeas gestantes pode contribuir. A separação das categorias de maior desafio nutricional, como as primíparas, para alimentação diferenciada - animais que, necessitam de energia para se manter, e completar seu crescimento e ainda alimentar suas proles - pode impactar consideravelmente no resultado da primeira IATF e se submetida à MN, o anestro pós-parto pode se prolongar e agravar ainda mais os resultados da EM.

É pertinente dizer que um manejo de pasto adequado, respeitando as peculiaridades de cada invernada da fazenda, pode contribuir para melhores ECC durante a gestação e, consequentemente, melhores ECC ao parto, contribuindo para melhores resultados no início da estação reprodutiva. Áreas bem formadas, com maior número de plantas por metro quadrado, garantem não só maior massa forrageira, mas sim, menor oportunidade de plantas invasoras, que, no longo prazo, podem impactar a produtividade das áreas utilizadas para pecuária.

A adequação da infraestrutura da fazenda, além de ser necessária para um manejo de pasto adequado, garante melhor aproveitamento da colheita do pasto. Em ambiente com maior densidade animal por hectare, força-se o animal a ter um pastejo menos seletivo, garantindo um pastejo mais homogêneo das áreas. Ainda no que diz respeito à infraestrutura, garantir água de qualidade pode incrementar maior ganho de peso dos indivíduos.

O manejo sanitário é outro ponto de atenção antes da estação reprodutiva. A implementação de um calendário sanitário pode facilitar os manejos de vermifugação, vacinação e cuidados gerais com a saúde dos animais, refletindo na qualidade na produção de anticorpos que serão liberados no colostro, garantindo níveis adequados e, consequentemente, proteção para o recém-nascido nas primeiras horas de vida. A elaboração do calendário sanitário personalizado para cada realidade é fundamental para que se evite erros e, consequentemente, perdas econômicas. No aspecto reprodutivo, a identificação da taxa de fundo de maternidade é um excelente indicador da necessidade da adoção de vacinas reprodutivas. A nível Brasil, uma das literaturas disponíveis aponta que o fundo de maternidade não pode ser superior a 8,0%.

A capacitação e reciclagem da mão de obra é outro fator que pode ser determinante para o sucesso da estação reprodutiva. Não se restringe apenas à execução de um protocolo de IATF, pois uma simples condução do gado do pasto para o curral ou vice-versa, se mal conduzido pode colocar tudo a perder. A vertente de um manejo de baixo estresse é cada vez mais presente e acessível aos colaboradores da fazenda, e, por isso, o ‘’como fazer’’ é determinante para o sucesso. Nenhuma estratégia nutricional, ajuste farmacológico, sêmen de altíssima fertilidade e o melhor inseminador pode corrigir um manejo de gado marcado por estresse e irracionalidade na condução dos animais.

Aliado a todos esses pontos mencionados anteriormente, um planejamento reprodutivo, junto a um cronograma de manejos de lotes, completa todo planejamento da EM. Estratégias farmacológicas podem e são bem-vindas em lotes estratégicos, e a tomada de decisão tem de ser rápida e assertiva. 
Por fim, e não menos importante, elenco como principal ponto pré-estação, a comunicação entre todos os envolvidos na fazenda de cria, desde o “cerqueiro” e “salgador” até o veterinário no dia da inseminação. O círculo virtuoso da pecuária se fecha quando todos os pontos mencionados estão alinhados.

Scot Consultoria: Quais são os cuidados prioritários que o pecuarista deve ter durante a estação de monta para garantir uma alta taxa de prenhez e sucesso reprodutivo, e como o acompanhamento veterinário contínuo, a suplementação estratégica e o manejo ambiental podem influenciar diretamente os resultados?

Eduardo Rossignolo: Para o sucesso na reprodução, os pontos básicos mencionados anteriormente devem estar alinhados e, se necessário, corrigidos.

Em um segundo momento, tratando diretamente da reprodução em si, o planejamento da estação deve ser seguido, embora existam possibilidades de ajustes sem comprometimento dos resultados, e alguns deles com o intuito de maximizar os resultados. Como trata-se de um universo de possibilidades, os eventos serão abordados de forma cronológica.

Inicialmente, ajustes em doses de benzoato de estradiol (BE), podem e devem ser ajustados. Novilhas não necessitam da mesma dose de animais adultos. Além disso, animais cíclicos (que tenham ovulado), podem se beneficiar de uma dose de prostaglandina (PGF2?). A redução da dose para ajuste de preço não é justificável, uma vez que a dose recomendada em bula entrega ao menos 2,5% a mais que qualquer redução de dosagem.

A concentração do implante de progesterona (P4), pouco impacta em animais com peso entre 400 a 550 kg em regime a pasto, com suplementação mineral ou proteica de 1,0%. Animais com mais de 650kg ou recebendo grande quantidade de concentrado se beneficiam de implantes com mais progesterona.  
A duração do tempo de permanência do implante também pode ser ajustada, em sete, oito ou nove dias. Além da retirada do dispositivo de progesterona, é realizado outros três fármacos, a gonadotrofina coriônica equina (eCG), cuja dose é reduzida para novilhas (200 UI) ou até aumentada (400 UI) em casos específicos, embora a dosagem padrão para vacas seja 300 UI; o cipionato de estradiol (CE), também tem sua dose ajustada para novilhas, pelo fato de que dosagem igual à de vacas, impacta negativamente na fertilidade de novilhas, sendo que a dosagem com melhor resultado é 0,5 mg de CE, enquanto vacas se beneficiam de 1,0mg de CE; e, por fim, a PGF2? tem sua dosagem idêntica em ambas as categorias mencionadas acima.

No dia da inseminação temos a possibilidade do uso de um análogo sintético de GnRH, substância que visa ajudar fêmeas que não deram cio no momento da inseminação. No entanto, há trabalhos científicos indicando que animais com ECC<3, primíparas e animais que não expressem cio, podem ter incremento de até 10,0% de prenhez em protocolos de IATF.

Estratégias de ressincronização podem favorecer uma estação reprodutiva mais curta, concentrando mais os partos e dando mais oportunidade das fêmeas emprenharem no início, meio ou fim da estação reprodutiva, contribuindo diretamente para a eficiência reprodutiva.

A gestão da EM pode ser conduzida por controle simples, como caneta e papel. Contudo, há aplicativos e sistemas bem elaborados para facilitar a gestão reprodutiva, facilitando o controle de vacas expostas, ressincronizadas e, no final da EM, a elaboração de relatórios direcionados e personalizados de acordo com a necessidade dos gestores.

Scot Consultoria: Como a estação de monta pode variar entre diferentes fazendas com base em fatores como tipo de rebanho, região climática e disponibilidade de recursos, e como os pecuaristas podem ajustar seus métodos de manejo reprodutivo para maximizar a eficiência dentro das particularidades de suas operações?

Eduardo Rossignolo: A estação de monta possui variabilidade de acordo com as regiões do país, embora a literatura aponte para ao menos 100 mm de chuva acumulada para então iniciar a estação reprodutiva. Embora esse fator tenha norteado muitas fazendas há muito tempo, atualmente a época de nascimento tem tido maior importância na tomada de decisão de quando iniciar a EM. Bezerros ditos do cedo, nascidos nos meses de julho, agosto e setembro apresentam maior desempenho em ganho de peso comparados a bezerros nascidos nos meses seguintes. Para tal, a estratégia reprodutiva tem se baseado em expor as fêmeas com no mínimo 30 dias de pós-parto, a protocolos de IATF, possibilitando assim a exclusão do anestro pós-parto, condição fisiológica que acomete até 75,0% das fêmeas paridas com 35 dias de média.

Variações quanto aos períodos se dão em função do bioma que a fazenda se insere, em que, nas regiões, Sul, Sudeste e Centro-Oeste, a estação reprodutiva se concentra nos meses de novembro a fevereiro; já na região Norte, a estação de outono, é muito recorrente em virtude do regime de chuvas. 
Dentro destas variações quanto ao início e época do ano, a duração também pode variar, dependendo dos casos, de seis meses, a depender do momento de adoção, se início ou consolidação da EM.
A adoção de estratégias reprodutivas arrojadas pode favorecer a diminuição dos resultados da EM, sendo que variações quanto ao início e tipo de ressincronização, são amplamente divulgadas e incentivadas por diferentes pesquisadores, do Brasil e do mundo.

Atualmente, a ressincronização pela técnica de Rebreed 21®, tem tido resultados promissores, entregando resultados similares aos métodos de ressincronização tradicionais. É importante ressaltar, que métodos de ressincronização super precoce, como o descrito, se utilizam de ultrassonografia doppler e por isso se limitam a disponibilidade do aparelho para amplo uso.

Scot Consultoria: Na seleção de reprodutores e matrizes, quais fatores genéticos e fenotípicos são mais importantes para garantir a melhoria contínua do rebanho? Como o uso de tecnologias como inseminação artificial e seleção genômica tem mudado o cenário da escolha de bons progenitores?

Eduardo Rossignolo: Os critérios de seleção variam de acordo com o sistema de produção e o intuito da criação. Fazendas com maiores desafios buscam animais com porte médio a pequeno, não maiores que 450kg, maximizando as áreas de matrizes. A diferença esperada na progênie (Deps), de habilidade materna (P210) e (PLeite), capacidade da matriz se manter produtiva no rebanho (Stay), idade ao primeiro parto (IPP) e probabilidade de parto precoce (D3P), são alguns indicadores de animais adequados para o sistema. Na avaliação morfológica, prioriza-se o equilíbrio entre precocidade e musculatura, com conformação inferior.  Em fazendas de maiores condições nutricionais, integração-lavoura-pecuária, o desempenho em ganho de peso é algo primordial na escolha dos reprodutores, e a habilidade materna da matriz é destaque. Já na avaliação visual, a conformação está em equilíbrio com precocidade e musculatura, e desta forma, carcaças mais volumosas são desejadas, geralmente destinadas a terminação intensiva, a pasto ou confinada.

Marcadores moleculares têm sido empregados em rebanhos comerciais para identificação e seleção de matrizes com maior probabilidade de seguirem na composição do rebanho e, somado aos pontos mencionados anteriormente, criasse critérios para iniciar a seleção mais acurada de um rebanho, onde com o passar do tempo, ajustes podem ser realizados para corrigir e potencializar o interesse do criador.

É pertinente ressaltar que assim como na IATF, não existe receita pronta, e apenas depois de uma visita a propriedade, deve-se estabelecer os critérios a serem observados na escolha dos reprodutores e no direcionamento das características das matrizes.

Scot Consultoria: Considerando o atual ciclo pecuário e as expectativas do mercado do boi para 2025 e 2026, como os pecuaristas podem ajustar suas estratégias reprodutivas durante a estação de monta para atender às futuras demandas de mercado e maximizar a rentabilidade? Que mudanças no cenário global, como exportações e consumo interno, os produtores devem levar em conta?

Eduardo Rossignolo: A estação de 2023/24 foi marcada pela depressão dos produtores com relação ao momento difícil que o mercado brasileiro passou, com grande interferência do cenário político, que impactou diretamente no ânimo do produtor. Isso irá refletir no mercado do boi em 2025. Quem seguiu o planejamento e as estratégias estabelecidas, irá nadar de braçada em um mar de oportunidades e preços altos na venda de bezerros e do boi gordo.

Como a pecuária é dinâmica, a estação 2024/25 é a segunda melhor oportunidade que o produtor pode aproveitar, a primeira foi em 2023/24. E nessa estação, a adoção de protocolos reprodutivos otimizados pode representar maior fertilidade geral ao final da estação e consequentemente mais bezerros produzidos. Este é o momento de fazer boas escolhas, utilizar o que a ciência forneceu de informação nos últimos 27 anos, utilizando sempre um protocolo completo e de doses recomendadas em bula. Estratégias farmacológicas serão bem-vindas e o todo será capaz de entregar resultados satisfatórios.

A reprodução é a mais nobre das etapas de vida dos bovinos, e por isso, necessita de tudo estar minuciosamente alinhado.


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