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Scot Consultoria

Bem-estar e seus impactos na produção animal

Entrevista com o médico-veterinário, Rafael Renner

Sexta-feira, 21 de julho de 2023 - 15h00
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Rafael Renner é médico-veterinário, especialista em boas práticas de manejo de ovinos e bovinos


Médico-veterinário pelo Centro Universitário da Região da Campanha (URCAMP), em Bagé/RS, especialista em bem-estar animal e qualidade da carne pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Foi estagiário no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), após uma especialização em certificação e tipificação de carcaças e cortes para o Chile na Universidad Austral de Chile, tornou-se especialista em bem-estar e comportamento animal, pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Trabalhou por 10 anos no Frigorífico Mercosul, atuando em diferentes áreas e implementando bem-estar animal da propriedade à indústria frigorífica. Trabalhou por um ano e meio no Marfrig como supervisor corporativo de bem-estar animal. Ministrou mais de 700 palestras em propriedades rurais, frigoríficos, seminários e congressos no Brasil, Argentina, Uruguai e Chile. Atualmente trabalha com boas práticas de manejo (propriedade, instalações, transporte e indústria frigorífica) nas áreas de ovinocultura e bovinocultura, é especialista em classificação, tipificação e rendimento de carcaças ovinas e bovinas, em cortes ovinos e bovinos, além de especialista em exportação.

A Granja Total Agro/Scot Consultoria: O quanto as boas práticas de manejo, desde o embarque na propriedade, influenciam na qualidade da carcaça e na carne que chega ao supermercado?

Rafael Renner: Em um trabalho que realizei em 2002, 68% das carcaças possuíam algum tipo de lesão, levando a condenação da carcaça pelo excesso de hematomas. Essas lesões são, principalmente, originadas no campo. Hoje, de cada 100 carcaças, entre 13 e 17 devem ter algum tipo de lesão. Durante esse trabalho, começamos a entrar nas propriedades oferecendo treinamento para os funcionários e 95% dos proprietários aceitavam, porque sabiam que estavam perdendo dinheiro. Dessa maneira, treinamos mais de 500 estâncias e, a cada 3 meses, treinávamos os transportistas e o pessoal que trabalha nos currais.

Bom, o que tivemos de melhora então? O aproveitamento de carne foi muito melhor e, se numa carcaça eu tinha 5 pontos de cortes danificados por hematomas, hoje eu tenho apenas um ponto de corte, o que na desossa faz com que meu aproveitamento seja melhor. Então, esse animal, bem abatido, bem manejado, com menos hematomas, faz com que a carne possa ficar mais tempo nas prateleiras e geladeiras.

A Granja Total Agro/Scot Consultoria: E daria para quantificar, em termos financeiros, de quanto foi esse ganho?

Rafael Renner: Hoje não se perde 1kg de carne por lesão e, pegando um lote de 50 animais, por exemplo, perde-se, no máximo 2,5kg. Antes, o comum era perder entre 15 e 20kg de carne nesses lotes e tinham produtores que chegavam a perder 1000kg de carne, enviando as carcaças para as graxarias por conta de perda total na qualidade. Portanto, muita coisa melhorou. Hoje os nossos maiores problemas, dentro das plantas frigoríficas, são com relação aos abcessos vacinais, que ainda trazem um grande prejuízo. O setor ainda carece de boas práticas de manejo e bem-estar animal na aplicação dos medicamentos.

A Granja Total Agro/Scot Consultoria: Sem dúvidas, a questão dos abcessos vacinais é um ponto importante e, agora, com o fim da obrigatoriedade de vacinação para febre aftosa em alguns estados,, por exemplo, pode ser que tenhamos uma melhora ainda maior no rendimento de carcaça. É impressionante o resultado financeiro do bem-estar animal. Você é especialista em qualidade de carcaça pela Universidade do Chile, então, de que forma eles trabalham lá? Estamos trabalhando quase tão bem quanto eles?

Rafael Renner: Bom, quanto ao sistema de classificação de carcaças, ainda precisamos realizar uma análise, porque se formos comparar com o Chile, Argentina, Uruguai, Austrália, Estados Unidos e Nova Zelândia, países que possuem um sistema de identificação e classificação de carcaça, em que todos os frigoríficos seguem esse sistema, observa-se que não funciona assim no Brasil, já que cada frigorífico adota seu próprio sistema de acordo com seu mercado. Penso que seja errado, porque se temos um sistema de classificação em 5 tipos de conformação de carcaça, 5 tipos de acabamento, dentição e peso, por que não colocar em prática em todos os frigoríficos? Hoje, em um frigorífico no Uruguai, por exemplo, que abate 100 animais/dia e outro que abate 1.000 animais/dia, ambos têm o mesmo sistema de classificação, independente do frigorífico em que esse animal seja abatido, teremos o mesmo resultado, por conta da classificação de carcaça. E hoje, no Brasil, essa é uma briga que o produtor tem buscado, para que o MAPA regulamente e coloque em prática o que está no papel. Essa é a grande diferença do nosso país para os nossos vizinhos de continente.

A Granja Total Agro/Scot Consultoria: Quanto às lesões, embora boa parte do Brasil não faça mais uso da vacinação de aftosa, nós ainda temos quase 73 milhões de bovinos e bubalinos que deverão ser vacinados em todo Brasil e, nessa etapa da vacinação, aparecerão lesões em algumas áreas. Qual dica você daria aos produtores, que ainda estão vacinando seu rebanho, de como diminuir as lesões por vacinação?

Rafael Renner: Na realidade, o abcesso vacinal não é somente com relação à aplicação da vacina contra a febre aftosa, temos uma aplicação de vermífugos todo ano e, esses erros, acontecendo todos os meses, vão formando várias lesões. Então, os principais problemas são com relação à falta de higiene e à pressa na hora da vacinação, ao não fazer a prega (não levantar o couro para realizar a aplicação subcutânea), não trocar as agulhas, não respeitar o período de carência, tudo isso acarreta na contaminação da carcaça e não pode haver nenhum tipo de resíduo na carne que será exportada, por exemplo, como já observados em problemas anteriormente. Caso haja a presença de algum resíduo na carne, o país importador impede de seguir o processo. Esses erros na aplicação podem ser reduzidos apenas com o treinamento do pessoal.


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