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Scot Consultoria

Arroba em longo prazo


Terça-feira, 3 de agosto de 2010 - 08h39

Administrador de empresas pela PUC - SP, com especialização em mercados futuros, mercado físico da soja, milho, boi gordo e café, mercado spot e futuro do dólar. Editor-chefe da Carta Pecuária e pecuarista.


Voltando ao assunto da rastreabilidade da semana passada, o Fabiano, do Minerva, gentilmente enviou essa mensagem para esclarecer o tema. É sempre bom ver os dois lados da questão. Aqui está a visão de quem compra boi sobre isso. Fala Rogério, tudo bem? Sobre a primeira parte da Carta Pecuária de hoje, falando de boi rastreado, vou te passar algumas informações que talvez ajudem a esclarecer as dúvidas dos seus leitores. 1. Boi ERAS hoje não tem prêmio, afinal, preço diferenciado na carne é só na exportação para a UE, e para atender a UE tem que ser ERAS e estar na lista TRACES. 2. O prêmio pago ao chamado “boi UE” (boi na lista TRACES) varia em função de várias coisas. Primeiro, é preciso considerar que apenas 15% da carcaça, mais ou menos, vai para a UE. Depois, estar na lista não é garantia de atender às exigências européias, pois em função de problemas de cobertura de gordura e de pH elevado os frigoríficos têm, seguramente, uns 50% de perda. Ou seja, na metade das vezes a indústria paga mais não leva (principalmente quando é boi inteiro de pasto). 3. Além dos fatores acima, que fazem com que o prêmio não possa partir de um patamar elevado, é preciso considerar o mercado. Em linhas gerais, dá pra pagar mais no primeiro do que no segundo semestre, pois na nossa “entressafra” além de ser período de queda de consumo na UE, a oferta aumenta, já que a maior parte das fazendas na lista TRACES são confinamentos. O prêmio pago por boi UE no primeiro semestre às vezes é o dobro do segundo. Aliás, no segundo, o prêmio às vezes zera (isso está acontecendo este ano, pois tem o agravante da situação econômica da UE). Lei da oferta de da procura, básico. 4. Boi capão sempre consegue prêmio maior, às vezes o dobro. Abraços, Fabiano Tito Rosa — Head Research do Grupo Minerva. Seguindo em frente, deixe-me contar um pouco sobre o sistema que uso para abordar o mercado. Dou uma passada de olho nos 54 gráficos diariamente, mas é somente um que sempre vejo primeiro. É literalmente um ritual. Deixe-me explicar. Todos os dias que abro as planilhas e o terminal Broadcast, a primeira coisa que faço é abrir o gráfico de longo prazo do boi. Sempre tento olhar esse gráfico de forma completamente nova, como se fosse a primeira vez. Nem sempre a gente vê alguma coisa nova; na maioria das vezes o raciocínio leva ao mesmo lugar do dia anterior. Por que especificamente o gráfico de longo prazo? Você pode me perguntar. Não sei. Gosto assim. Começar com ele me dá uma perspectiva mais ampla das coisas e reduz a importância dos movimentos diários de preços. Outra explicação, tão boa quanto, é que me acostumei a fazer isso dessa maneira. Ocorre, entretanto, em um dia qualquer de inspiração mais elevada, a possibilidade de enxergar algo novo, algum nuance passado despercebido, alguma conexão com os fatos do dia a dia que se ligam dentro da cabeça que salvam o meu dia. Acredite, já fiz excelentes negócios só observando esse gráfico de longo prazo. Especialmente nos seus momentos extremos de oscilação, tanto para cima, quanto para baixo. O gráfico de longo prazo do boi que abro todos os dias é esse logo abaixo. Obviamente, o que chamo de longo prazo no boi é um gráfico que cobre pelo menos duas gerações de bovinos. Cada geração são sete anos aproximadamente, então é interessante olhar um gráfico com pelo menos 14 anos “de idade”. Esse gráfico aqui tem 17 anos de idade. Este gráfico é complicado? À primeira vista pode ser sim, mas até você aprender a ler o que está nele. A primeira coisa é saber que esse é um gráfico composto, ou seja, possuiu dois gráficos simultaneamente. Esses gráficos compartilham a mesma linha de tempo, de 1994 a 2010. Acima você tem a arroba do boi. Abaixo temos a arroba vs. inflação. A idéia é mostrar o impacto da variação da inflação no desenrolar dos preços da arroba. Para todos os efeitos, de 1994 para cá a arroba tem respondido muito bem à variação da inflação, e tem sido de grande valia para determinar os altos e baixos do mercado. Só olhando esse gráfico você já teria como ter se defendido ou se preparado para as bruscas variações dos preços da arroba, o que não é pouca coisa. Se você reparar ao longo dos anos, temos essas marcações nesses círculos azuis mostrando os picos de preço da arroba. Eles acontecem poucas vezes, daí sua importância. Tivemos só quatro nessas quase duas décadas de mercado. Saber desses picos é importante para você saber quais serão as consequências para o preço da arroba nos anos seguintes. Repare que em todas as ocasiões em que um pico foi atingido a arroba demorou a romper esse pico novamente. Teve vez que ela rompeu bruscamente, como no período de 1994 a 1999, mas nas outras ocasiões ela ficou sobe e desce ao redor dos picos, demorando, hesitando, rompê-lo. Por fim, no seu devido tempo, a arroba rompia seus picos anteriores. Nesse interim de “rompe ou não rompe” os picos a gente vê muita confusão, muitas idéias e teorias entre analistas, operadores de mercado, pecuaristas e os ditos entendidos no assunto tentando explicar o que está acontecendo. Na maioria das vezes são idéias conflitantes, absurdas, outras corretas, outras sem noção, mas em nenhum lugar você escuta humildade. Humildade para simplesmente olhar para o gráfico da arroba e ver o que está lá, aberto, para todos. Não é pouca coisa mesmo, caro leitor. Só por esse gráfico me defendi no mercado futuro contra a queda da arroba por causa da aftosa em 2005, por exemplo, e me defendi também contra a alta do boi magro a partir de 2006. Entre 2006 e 2007 fizemos defesa contra a alta do boi magro que durará até 2011, para você ter uma idéia da importância que dou a esse tipo de análise. Então quer dizer que quando a arroba faz seu pico ela demora a rompê-lo novamente? Sim, foi o que ocorreu até aqui. Desde os últimos picos, a arroba demorou, respectivamente, 5, 3 e 6 anos. Atualmente a arroba está há 2 anos do pico ocorrido em 2008. O pico de 2008 foi uma arroba ao redor de R$95,00. Hoje esse mesmo valor levaria a arroba vs. a inflação para um patamar de +10% da inflação, o que já seria muito bom. Para voltar ao pico de +17% de 2008 a arroba teria que valer R$102,00, o que seria melhor ainda. São realísticos esses valores? Bom, só para te dar uma base de comparação com o que já ocorreu no passado, em 2007 a arroba subiu da safra para a entressafra +48%. Em 2008 da safra para a entressafra a arroba subiu +32%. Até R$95,00/@ significaria da safra para a entressafra uma alta de 32%. Para R$102,00/@ seria uma alta de 42%, então, sim, altas dessa magnitude entre safra e entressafra no boi não são incomuns, como você pode ver no gráfico ao lado. A cada três/quatro anos tivemos uma alta dessa magnitude no passado. Levando em conta toda a pressão de falta de animais e a questão do mercado consumidor interno e externo demandando carne, não me surpreenderia se esse ano fosse um ano de alta na arroba. Não tenho como saber com certeza, ninguém tem, mas se isso ocorrer, o mercado futuro está mal posicionado e está mal precificado perante essa possibilidade não tão remota assim. É uma idéia. O que fiz ou vou fazer sobre isso? Bom, desde o início do ano, a cada movimento de alta na bolsa tenho feito alguns seguros de venda de boi. Esse seguro é para cobrir o custo de produção e deixar uma pequena margem de lucro. Para que eu cubra o custo de produção é o suficiente nesse estágio do ciclo pecuário, até porque a principal operação fiz entre 2006 e 2007 para me proteger contra a alta do boi magro até 2011, então estou satisfatoriamente coberto nesse quesito. De resto, simplesmente deixo parte dos bois gordos sem nenhuma trava, vai que estou errado e o boi sobe? Pelo menos pego uma parcela da alta. Se cair, sempre tenho a alternativa de vender bolsa. Aliás, sobre esse negócio de bolsa, opero em bolsa desde 1997, caro leitor, então já tenho uns quilômetros rodados aqui. Estou dizendo isso porque, no caso específico da pecuária, a cada ano que passa tenho me inclinado a sentir que a verdadeira proteção de um invernista é ficar comprado na bolsa, e não vendido. Penso assim porque o seu principal problema é a compra do bezerro ou do boi magro, é onde está seu maior risco. Não o preço de venda do boi gordo. É uma sensação que estou tendo na prática nos últimos anos e ainda é um tema a ser trabalhado. Não tenho uma posição definitiva. Fica aqui em aberto para a gente discutir mais sobre isso.
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