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O que eu faria se voltasse a ser um extensionista? - Texto escrito por Polan Lacki


por Otaliz

Terça-feira, 30 de agosto de 2005 - 17h24

É médico veterinário e instrutor do Senar – RS.


  • Recentemente, completei 40 anos de exercício como engenheiro agrônomo extensionista. Decidi celebrá-los com a seguinte reflexão: o que eu faria se, depois de quatro décadas, tivesse que começar tudo outra vez?
    SE VOLTASSE A SER EXTENSIONISTA...
  • Se isso acontecesse, eu não atribuiria aos outros a culpa pelos problemas dos agricultores, não pediria que os outros solucionassem os seus problemas, não solicitaria que os governos outorguem mais créditos e subsídios aos nossos produtores rurais, tão pouco reivindicaria que os países ricos deixassem de concedê-los aos seus privilegiados agricultores.
  • Adotaria tal atitude por estar convencido de que continuar fazendo essas propostas estéreis significaria perder tempo e por entender que existem atitudes e atividades muitíssimo mais construtivas que um extensionista pode e deve adotar e executar. Em substituição a essas reivindicações inviáveis e/ou ineficazes, eu trataria de desenvolver as capacidades e competências das famílias rurais para que elas mesmas possam resolver os seus problemas, sem necessitar de ajudas externas. Com tal fim, faria algo tão simples e "descomplicado" como o seguinte: 1. Convidaria os agricultores a um diálogo franco e realista, no qual lhes diria, sem rodeios nem meias palavras, o seguinte: não percam tempo esperando que os governos, atuais ou futuros, solucionem os seus problemas, pois tal probabilidade é extremamente remota, não necessariamente porque os governantes não queiram, mas sim porque não reúnem - e não reunirão em um futuro previsível - as condições políticas, operativas nem financeiras para fazê-lo. Em virtude da crônica - e aparentemente incorrigível - inoperância e ineficiência governamental, proporia a eles que adotem a medida radical de emancipar-se da dependência do paternalismo estatal. 2. Com a finalidade de demonstrar-lhes que eles realmente podem diminuir a sua dependência de ajudas externas e que eles mesmos podem solucionar seus problemas, diria a eles que: a)- Sem querer e sem dar-se conta, eles mesmos cometem erros que são importantes causadores dos seus problemas e que, conseqüentemente, eles mesmos podem e devem evitá-los e corrigi-los; junto com eles, identificaria quais são esses erros e posteriormente sugeriria como poderiam ser corrigidos. b)- As ajudas do paternalismo estatal não são tão imprescindíveis como costuma afirmar-se; para confirmar isso, descreveria para eles várias alternativas tecnológicas, gerenciais e organizacionais que eles poderiam adotar, sem necessidade de contar com decisões políticas nem de recursos adicionais aos que eles já possuem. 3. Eu os advertiria de que, no contexto do neoliberalismo e da globalização, eles só poderão sobreviver como agricultores se forem muito eficientes na produção propriamente dita, na administração das suas propriedades, no acesso aos insumos e na comercialização de seus excedentes. Dir-lhes-ia que os agricultores parcialmente eficientes ou ineficientes, infelizmente, serão expulsos da atividade agrícola. Consciente do imperativo de que todos os agricultores, especialmente os mais pobres, necessitam tornar-se mais eficientes, recomendaria a eles iniciar tal "eficientização" adotando medidas elementares e de baixo custo. Demonstraria que, em uma primeira etapa de tecnificação, eles podem tornar-se mais eficientes, mesmo que não disponham de animais de alto potencial genético, maquinaria sofisticada nem tecnologias de ponta, pois, na referida etapa, esses fatores escassos e de alto custo, geralmente são prescindíveis. Para demonstrar-lhes esta "prescindibilidade",descreveria para eles vários exemplos que, mesmo sendo de baixo ou zero custo, são muito eficazes no incremento da produtividade da agricultura e da pecuária; idem na redução nos custos por quilo produzido, idem na obtenção de melhores preços na comercialização. 4. Procuraria torná-los conscientes de que, no mundo moderno, o êxito econômico dos agricultores depende, muitíssimo mais, de conhecimentos adequados que de recursos abundantes. Por esta razão lhes sugeriria que não percam tempo fazendo protestos, "caminhonaços" e "tratoraços" em frente ao Banco Central, ao Banco do Brasil ou ao Ministério da Fazenda, pelo simples motivo de que não é lá que estão as verdadeiras causas dos seus problemas. Sugeriria a eles que façam os seus protestos em frente ao nosso disfuncional sistema de educação rural (escolas fundamentais rurais, escolas agrotécnicas, faculdades de ciências agrárias e serviços de extensão rural), porque é lá que estão as causas mais profundas do subdesenvolvimento rural e, conseqüentemente, lá deverão ser eliminadas. Sugeriria que se organizem não para mendigar migalhas de créditos paternalistas, e sim para exigir que essas quatro instituições educativas proporcionem, aos extensionistas e às famílias rurais, conhecimentos úteis, aplicáveis e eficazes na correção das ineficiências e na solução dos problemas dos agricultores e da agricultura. Insinuaria que não percam tempo ouvindo os teóricos de gabinete e os políticos eloqüentes, e que ocupem o seu tempo de maneira útil ouvindo os extensionistas competentes, os professores e pesquisadores com real vivência de campo e os agricultores eficientes.
  • Nota: : o autor deste artigo é o Engenheiro Agrônomo POLAN LACKI – que durante 23 anos atuou na Organização das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação – FAO-ONU.
  • Na próxima edição deste informativo estaremos publicando a segunda parte deste texto. Contato como o autor: polanlacki@terra.com.br
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