A recente decisão do Conselho Nacional de Biossegurança (CNBS) que confirmou o parecer favorável da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio) quanto à liberação comercial de duas variedades de milho transgênico é uma ótima notícia para o Brasil. O placar de sete votos contra quatro, dentro de um Conselho eminentemente político, criado pela Lei de Biossegurança de 2005 para ajudar o Presidente da República em suas decisões nessa área, pode significar uma nova fase e forma de abordar a biotecnologia no Brasil.
Espera-se que, em breve, novos produtos possam chegar ao mercado, e que novas pesquisas sejam feitas, principalmente quando se observa as novas gerações de transgênicos, que trarão benefícios claros para os consumidores: arroz com betacaroteno (pró-vitamina A), soja rica em Ômega 3 e microorganismos, como bactérias e vírus, que poderão ser muito úteis em várias áreas.
Outra notícia que merece destaque é que, de acordo com o Relatório 2007 do Serviço Internacional para a Aquisição de Aplicações em Agrobiotecnologia (ISAAA), publicado no início de fevereiro, 23 países plantam produtos transgênicos e outros 29 já autorizaram importações.
Apesar dessas boas notícias, o Brasil enfrentará, nos próximos meses, uma negociação difícil, que pode trazer impactos negativos para o desenvolvimento da biotecnologia. Trata-se das reuniões do Protocolo de Cartagena, que discutirão a criação de um mecanismo de responsabilidade e compensação por danos causados por sementes, grãos para processamento, bactérias, vírus e outros microorganismos vivos geneticamente modificados que sejam levados de um país para outro.
O que mais preocupa nessa negociação é que ela avança sem a definição de temas essenciais, como o conceito de dano e qual sua natureza. Em outras palavras, as partes do Protocolo discutem se esses danos seriam limitados ao uso e à conservação da biodiversidade, como previsto pelo Protocolo, ou se danos patrimoniais, à saúde e socioeconômicos deverão ser cobertos por um mecanismo de responsabilidade e compensação.
Não parece seguro negociar temas como esses quando se pisa em um chão que mais se assemelha a areia movediça. Além disso, o Brasil tem participado dessas discussões como se não tivesse muito a defender, esquecendo sua biodiversidade exuberante e o papel de celeiro do mundo. Já é hora de enxergar esses dois elementos como complementares e não como contraditórios. E a biotecnologia é um caminho natural nesse cenário.
Há vários pontos dentro dessa negociação que merecem muita cautela ao serem discutidos. Em primeiro lugar, a responsabilidade de produtores, transportadores, empresas desenvolvedoras da biotecnologia, exportadores. Depois, a necessidade de se fazer seguros contra danos, sem que se saiba o que é um dano. E o que se sabe é que a responsabilidade dos países está praticamente fora de cogitação!
O Brasil participará das próximas reuniões do Protocolo, em Cartagena (na Colômbia, em março) e Bonn (na Alemanha, em maio), e terá chance de defender propostas que resguardem os interesses do País. O grande problema é que os ministérios que compõem o Conselho Nacional de Biossegurança não conseguem chegar a um acordo, o que prejudicou, até o momento, um posicionamento enfático do Brasil.
É exatamente aí que moram os riscos relacionados ao Protocolo de Cartagena. As dissidências entre os ministérios que tratam de biotecnologia e biossegurança no Brasil serão eternas. Seja por ideologia, medo, desconhecimento ou até mesmo ignorância, a defesa de um Brasil livre de transgênicos continuará a existir durante muito tempo. E é por isso que, para muita gente, o Protocolo funciona como uma arma para lutar contra a biotecnologia.
O maior ou menor grau de adoção da biotecnologia é uma questão de tempo. Cabe ao governo brasileiro defender posições muito claras nas reuniões do Protocolo. Já é mais do que chegada a hora de o Brasil deixar de lado o obscurantismo arraigado nas infindáveis dissidências internas, e tratar os temas da biotecnologia com seriedade. Os agricultores - grandes ou pequenos -, as empresas processadoras de alimentos, os consumidores, os importadores dos produtos brasileiros e o meio ambiente serão somente alguns dos beneficiados.
Rodrigo C A Lima
Gerente Geral / General Manager
Instituto de Estudos do Comércio e Negociações Internacionais
Institute for International Trade Negotiations
<< Notícia Anterior
Próxima Notícia >>