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Carta de Campo Grande


Quarta-feira, 22 de dezembro de 2010 - 10h54

O Conselho Regional de Medicina Veterinária do Estado de Mato Grosso do Sul, através de sua Comissão Estadual de Leishmaniose, realizou, nos dias 27 e 28 de novembro de 2010, o “I Simpósio Sul-Mato-Grossense de Leishmaniose” que teve como objetivo informar, atualizar, discutir e orientar Médicos Veterinários, Médicos, Advogados, Juízes, Promotores e Delegados sobre os aspectos técnico-científicos e jurídicos da Leishmaniose. Decidiu-se registrar as conclusões em documento com o intuito de tornar público o que foi apresentado e discutido e, consequentemente, priorizar diretrizes para a continuidade dos trabalhos da Comissão Estadual de Leishmaniose do CRMV/MS, que passam a fazer parte da presente CARTA DE CAMPO GRANDE Considerando que: 1. A Leishmaniose Visceral (LV), forma mais agressiva das leishmanioses e que leva o ser humano ao óbito, é considerada uma das sete endemias mundiais prioritárias pela OMS (Organização Mundial da Saúde), está presente em quatro continentes, é endêmica em 88 países, acometendo novos 500 mil casos por ano e provocando 50 mil óbitos; 2. Na América Latina, a doença ocorre em 12 países e o Brasil detém cerca de 90% dos casos. Está presente em 21 estados brasileiros, apresentando cerca de 4.000 novos casos por ano, com letalidade variando entre 5,5% a 20%; 3. Mato Grosso do Sul figurou, em 2007, como um dos 10 estados brasileiros mais acometidos pela LV e Campo Grande, a capital, ficou em 3º lugar, em relação ao número de casos no país; 4. A população brasileira demonstra grande interesse pelo tema, demonstrado claramente através de buscas na internet e inúmeras matérias publicas na mídia impressa e eletrônica; 5. Desde 1990 a OMS publica, em seu Informe do Comitê de Expertos, que “na maior parte dos países, a eutanásia dos cães domésticos infectados se reserva, cada vez mais, para casos especiais”. São trabalhos que demonstram que a eutanásia canina, como forma prioritária de controle da LVC, não é uma prática cuja eficácia seja cientificamente evidenciada; 6. O documento da OPAS (Organização Pan-Americana de Saúde) de 2005 registra, em suas conclusões, que “o tratamento canino não é uma medida de controle da LV. Não obstante, nas situações especiais em que se aplique o tratamento, se recomenda que se apliquem medidas que impeçam o contato do cão tratado com o vetor de LV”; 7. Trabalhos científicos demonstraram que entre 2000 e 2007, somente na cidade de Belo Horizonte, MG, foram eliminados quase 13.000 cães falso-positivos e que cerca de 2.000 falso-negativos deixaram de ser eutanasiados; 8. Já estão estabelecidas evidências científicas de que gatos e gambás, animais urbanos, tem a infecção e por isso podem se constituir em reservatórios do protozoário; 9. A Revisão Sistemática da OPAS, de Janeiro de 2010, estabeleceu explicitamente que as estratégias, ora adotadas no Brasil, não demonstram eficácia e sugerem que o controle do vetor seria melhor aceita e obteria melhores resultados. Declara, ainda, que “a rotina das estratégias de controle contra o reservatório canino e os insetos vetores são baseadas em fracas e conflitantes evidências. As estratégias de controle e desenvolvimento de vacinas deveriam se constituir em prioridades nas pesquisas”, e que, “a eliminação canina é a medida de controle menos aceita e tem baixa eficiência devido à alta reposição dos cães eliminados com filhotes susceptíveis”; 10. O Ministério da Saúde, em seu Programa Nacional de Controle da LV, aponta como estratégia de controle, ações integradas com o diagnóstico e o tratamento precoce dos casos humanos; redução da população de flebotomíneos (vetor) com aplicação de inseticidas e correto manejo ambiental; controle de reservatórios domésticos infectados em área de transmissão e atividades de educação em saúde; 11. O controle e a redução da população do vetor exigem o desenvolvimento de pesquisa intensiva e o constante acompanhamento da comunidade científica; 12. É conhecida a falta de atividades de manejo ambiental, até porque não é cientificamente comprovável como esse manejo deveria ocorrer; 13. É conhecida, também, a insuficiência ou até a inexistência de atividades de educação em saúde, 14. É perceptível que, embora os médicos veterinários clínicos de pequenos animais e patologistas clínicos estejam inseridos e comprometidos com a saúde pública, suas condutas profissionais sejam desconhecidas pelos médicos veterinários que atuam nos serviços públicos de saúde, e vice e versa, gerando, com isso, entendimentos controversos sobre os procedimentos a serem adotados e sobre as orientações a serem fornecidas à sociedade, causando dúvidas e incertezas a todos; Concluiu-se que: 1. A Comissão de Leishmaniose do CRMV-MS deverá disponibilizar aos profissionais que participaram do Simpósio, aos Conselhos Regionais de Medicina Veterinária, ao Conselho Federal de Medicina Veterinária, aos palestrantes e às autoridades que participaram das mesas redondas uma síntese dos assuntos tratados e dos trabalhos técnico-científicos apresentados durante o evento. 2. As conclusões também deverão ser encaminhadas para as autoridades competentes nas esferas federal, estadual e municipal e nos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, como também para as entidades que apoiaram o evento. 3. A partir de 2011, convites para integrar a constituição da Comissão de Leishmaniose do CRMV/MS, deverão ser feitos a outras entidades de classe, objetivando a multidisciplinaridade das discussões. Esse convite também se estenderá aos Promotores Públicos do Meio Ambiente e da Saúde. 4. A constituição da Comissão abrangerá, também a partir de 2011, médicos veterinários do interior do Estado e instituições a eles ligadas. Para isso, o CRMV/MS deverá fazer investimentos em Tecnologia da Informação (TI), o que facilitará a comunicação à distância, a exemplo do que ocorre nas conferências online. 5. Todo o material técnico-científico obtido pela Comissão deverá ser organizado e disponibilizado no site do CRMV-MS, com acesso restrito aos médicos veterinários. 6. Em face da atual portaria que proíbe o tratamento dos cães com medicamentos destinados a humanos ou sem registro e licença no MAPA, das evidências científicas apresentadas nos documentos oficiais dos órgãos internacionais citados sobre a ineficácia da eliminação canina e da forte comoção pública decorrente dessa eliminação, que as autoridades sejam instadas a rever a atual política pública de controle da leishmaniose visceral. 7. Deve-se levantar e defender a discussão ética em relação ao sacrifício de animais com resultados falso-positivos. 8. A classe médica veterinária deve buscar, apoiada pela legislação e com a colaboração de parceiros estratégicos interessados e legalmente aptos, uma participação efetiva na elaboração das políticas públicas relacionadas ao tema. 9. Faz-se necessário o desenvolvimento de um programa de educação ambiental de controle da LV focado no vetor, já que ele, ao longo dos últimos anos, se adaptou bem ao ambiente urbano, é de fácil procriação e pode se deslocar a grandes distâncias levado pelas correntes de ar, sendo, portanto, o principal responsável pela expansão da doença, infectando os animais e o homem. 10. A utilização das coleiras repelentes e a aplicação das vacinas nos cães são consideradas estratégias importantes no controle da LV e que, independentemente de serem adotadas pelo serviço público de saúde, devem ter seu uso amplamente propagado para minimizar aos efeitos deletérios da disseminação da doença. 11. A Comissão deverá propor a criação de um programa estadual que vise integrar os médicos veterinários da iniciativa privada e do Poder Público na padronização das ações relativas à leishmaniose, no que se refere ao exercício profissional, zelando, assim, pela qualidade dos serviços prestados à sociedade; 12. A proibição, por parte do Ministério da Saúde (MS) e do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), através da Portaria Interministerial nº 1.426/2008, aos médicos veterinários brasileiros de tratarem seus pacientes caninos com leishmaniose visceral com medicamentos de uso humano ou sem registro e licença no MAPA, tem causado grande preocupação à classe, pois enquanto impedidos de prestarem um serviço de qualidade aos seus clientes, muitos donos de cães podem estar se aventurando sozinhos na condução do tratamento dos seus animais, gerando, com isso, conseqüências desconhecidas que podem colocar todos em situação de risco. 13. Foi considerada lamentável a saída dos representantes da Secretaria Estadual de Saúde e do CCZ de Campo Grande da Comissão Estadual de Leishmaniose do CRMV/MS, sem qualquer justificativa, o que deixou uma lacuna importante na organização do Simpósio, no que diz respeito à elaboração da programação, e, da mesma forma, deixará uma lacuna na condução dos trabalhos daqui por diante. 14. Também foi considerada lamentável a ausência de representantes do Ministério da Saúde, da Secretaria Estadual de Saúde e do CCZ de Campo Grande no Simpósio, como palestrantes, ainda que a convite por indicação dos demais membros da Comissão. Destes, apenas o CCZ confirmou a sua participação, mas na última hora não se fez presente. 15. Foi de extrema importância e relevância o apoio do Conselho Regional de Medicina de Mato Grosso do Sul (CRM/MS) e da Ordem dos Advogados do Brasil/Mato Grosso do Sul (OAB/MS) na realização do Simpósio, bem como a participação da Procuradoria Geral de Justiça, do Juiz Federal, do Presidente da Comissão de Meio Ambiente da OAB/MS, do Presidente do CRMV/TO e do Presidente do CFMV no evento. 16. Participaram do Simpósio 150 profissionais entre médicos veterinários, médicos e advogados, e também acadêmicos de medicina veterinária. 17. A Comissão firma o compromisso de realizar o “II Simpósio Sul-Mato-Grossense de Leishmaniose” no ano de 2011. Campo Grande, 28 de novembro de 2010. Fonte: Conselho Regional de Medicina Veterinária do Estado de Mato Grosso do Sul CRMV-MS.
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