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Scot Consultoria

Mais uma razão para não comer carne


Sexta-feira, 12 de dezembro de 2008 - 09h02

Adepto de um bom bife e pai de uma vegetariana, tenho dificuldade em contar essa história. Mas foi descoberta mais uma razão para evitarmos comer carnes vermelhas. Em 1991, Ajit Varki, cientista da Universidade da Califórnia, foi a um supermercado e comprou alguns quilos de glândulas salivares de porco. A partir da saliva dos porcos, preparou um açúcar chamado de ácido siálico (Neu5Gc). No dia seguinte, ele se internou no hospital universitário e bebeu a saliva de porco (ugh!). Amostras de diferentes partes do seu corpo foram analisadas, o que permitiu que Varki descobrisse que o Neu5Gc de porco se acumulava em suas células. Com o experimento foi possível explicar um aparente paradoxo. Anos antes o grupo de Varki havia descoberto que, ao contrário da maioria dos mamíferos, o ser humano não possui genes para sintetizar o Neu5Gc. Mesmo assim ele é encontrado na superfície de nossas células. O que Varki demonstrou é que o Neu5Gc que ingerimos é absorvido e incorporado nas nossas células. Isso porque temos em nossas células um açúcar que somos incapazes de sintetizar. Vegetarianos e pessoas que consomem somente frango ou peixe não possuem esse açúcar. A história estava nesse ponto quando, em 1993, diversas crianças morreram intoxicadas após comer hambúrgueres contaminados por uma cepa tóxica de uma bactéria que secreta uma toxina capaz de liquidar o rim das vítimas em poucos dias. Nos anos seguintes um casal de cientistas australianos descobriu que essas bactérias utilizam um componente da sua superfície chamado SubAB para aderir às células humanas. Assim como uma chave encaixa na fechadura, a SubAB se encaixa em uma molécula na superfície de nossas células. Mas o que tem a ver uma história com a outra? O último capítulo dessa história é que Varki e o casal Adrienne e James Paton demonstraram que a fechadura na qual a SubAB se encaixa é o açúcar Neu5Gc em nossas células. Na ausência desse açúcar, a bactéria tem dificuldade em infectar seres humanos. Moral da história: comer carne facilita a contaminação por essa bactéria. Minha filha vai ficar feliz, mas eu vou argumentar que se as crianças fossem vegetarianas elas sequer teriam sido contaminadas; suas mães nunca as deixariam chegar perto de um hambúrguer. O fato é que a biologia por trás desse fenômeno é muito interessante. Essas bactérias se propagam nas carcaças das presas. Os carnívoros, ao comer a carne contaminada, ingerem não somente a bactéria, mas uma grande dose do receptor que a bactéria necessita para se fixar nas células do hospedeiro. Resta explicar a razão que levou a espécie humana a perder a capacidade de sintetizar o Neu5Gc ao longo de sua história. Por que isso não ocorreu com nossos primos macacos nem com os mamíferos que utilizamos para nos alimentar? Esse deve ser um dos problemas que ainda tiram o sono de Ajit Varki. Fonte: O estado de São Paulo. 11 de dezembro. Escrito por Fernando Reinach, Biólogo (fernando@reinach.com).
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