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Scot Consultoria

Radar sanitário de abril de 2024


Sábado, 30 de março de 2024 - 06h00

Médico-veterinário pela Universidade de São Paulo. É professor titular do departamento de clínica médica pela FMVZ-USP, especializado em Clínica de Ruminantes (ortolani@usp.br).


Essa coluna consta de duas partes: A) Manejo Sanitário para o mês; B) Registro recente de doenças transmissíveis ou não, sugerindo medidas para suas prevenções. Tais registros são obtidos com o apoio das Agências Estaduais de Defesa Sanitária Animal, de Professores Universitários, do MAPA, da EMBRAPA, e da rede de contato de veterinários de campo, assim como minhas observações.


Manejo Sanitário 

Tratamento estratégico contra Fasciola hepatica em bovinos no Sul, Sudeste e Centro-Oeste do Brasil

Em abril, o único tratamento estratégico sugerido é contra Fasciola hepatica, empregando para tal vermífugos a base de triclabendazole, nitroxinil, clorsulon ou closantel. Recomenda-se essa vermifugação nas seguintes áreas: todo o estado do Rio Grande do Sul – exceto região noroeste; regiões do planalto e do litoral de Santa Catarina; região litorânea do Paraná e municípios centrais em torno de Curitiba; Vales do Ribeira e do Paraíba, além do município de Buri, em São Paulo; norte do Rio de Janeiro e todo o sul do Espírito Santo; em Goiás, nos municípios de Goianira, Petrolina, Inhumas, Trindade, Indiara, Mineiros, Palmeiras de Goiás, Palminópolis, Itapirapuã, Formosa e Flores de Goiás. 


Os bovinos contraem a doença bebendo ou pastejando em torno de pequenos riachos ou áreas de baixadas alagadas, em que vive um pequeno caramujo do gênero Lymnaea (figura 1). Este caramujo serve de hospedeiro para larvas de F. hepatica, que se desenvolvem a partir dos ovos do parasita, os quais são eliminados nas fezes de bovinos e ovinos.


Com o crescimento das larvas dentro do molusco, estas saem do seu interior e esperam para serem ingeridas pelos ruminantes. Dentro desses animais, as larvas chegam aos canalículos do fígado, onde além de causar anemia, provocam perda de peso e, em casos mais severos, podem levar à morte. 


Figura 1.
Caramujos do gênero Lymnaea.



Fonte: Walther Ishikawa.


Figura 2.
Parasitas adultos de F. hepatica no fígado de bovinos.



Fonte: Teresa Mateus.


Surto de “olho rosa” em rezes maranhenses 

Um colega de campo descreveu um surto de ceratoconjuntivite (inflamação da córnea e do saco conjuntival), popularmente conhecida como “olho rosa”, em rezes de uma propriedade em Imperatriz, no oeste do Maranhão. 


A doença atacou inicialmente alguns animais, os quais não foram isolados e tratados, se espalhando rapidamente para 32,0% do rebanho, exigindo uma rápida intervenção veterinária. A infecção geralmente é causada pela bactéria Moraxella bovis


O “olho rosa” é mais comum de acontecer em épocas de chuvas, do que na seca, por alguns motivos: aumento dos raios ultravioletas, (que danificam a córnea), crescimento da população de moscas, que podem veicular a bactéria de um olho para outro e de um animal para outro, e em animais que pastejam, quando as pastagens crescem mais e podem “espetar” os olhos, abrindo porta de entrada para a bactéria. Raças europeias têm maior risco de ter a doença, embora possa ocorrer também em indianas, pois são mais sensíveis aos raios ultravioletas, mais intensos nas duas horas antes e depois do meio-dia. Árvores copadas na pastagem servem de abrigo para a boiada nesses momentos.


Bovinos jovens também têm maior chance de ficarem doentes, pois a lágrima deles contêm menos anticorpos contra a M. bovis que rezes mais eradas. No início da doença o bovino pisca e lacrimeja muito, depois apresenta um dano da córnea, a qual pode se embaçar (opacidade de córnea), desenvolver úlceras, e caso não tratado, levar a cegueira (figura 4).


Os “olhos rosas” foram tratados com um antibiótico específico, anti-inflamatório e vitamina A, e em menos de 15 dias a infecção tinha sido aplacada e controlada. Mesmo assim, em alguns casos avançados ficaram as cicatrizes da doença, porém não levando nenhum animal à cegueira total.  Foi sugerido o plantio de mais árvores na pastagem e o controle de moscas.


Figura 3.
Anatomia do globo ocular.



Fonte: https://bit.ly/3fqzhaH


Figura 4.
Fases evolutivas do “olho rosa”.



Fonte: Banco de imagem do autor.


Surto de mosca-dos-chifres em Mato Grosso do Sul

Foi relatado um grande aumento da população de mosca-dos-chifres (Haematobia irritans), nestes últimos meses, nas boiadas do sudeste do Mato Grosso do Sul, provocando redução no ganho de peso e até queda da fertilidade, nos bovinos mais susceptíveis. 


Vários estudos confirmaram, no decorrer de muitos anos, que nas regiões Centro-Oeste e Sudeste o ataque dessas moscas é mais frequente e intenso entre os meses de outubro a final de dezembro, voltando a aumentar entre maio e junho. Porém, de janeiro a abril geralmente diminui a população de H. irritans, pois o excesso de chuvas desfaz as placas de fezes do bovino, onde as moscas colocam seus ovos, matando as larvas do inseto pela maior exposição ao Sol. 


Segundo dados meteorológicos sul-mato-grossense, 85,0% dos municípios do estado tiveram déficit de chuvas, em torno de 50,0% nestes últimos meses, devido ao efeito “El Niño”, explicando a manutenção de altas na população do díptero que infernizam as boiadas.


Outra reclamação dos técnicos de um dos rebanhos da região sudeste do Mato Grosso do Sul, é que a população de mosca-dos-chifres era eficientemente controlada nos últimos cinco anos com brincos mosquicidas à base de diazinon (organofosforado), que supostamente deveriam atuar por 180 dias. No entanto, segundo relatos, esses brincos não estão funcionando por mais de 30 a 40 dias, e mesmo assim de forma parcial. Suspeita-se de resistência das moscas ao princípio ativo, mas faltam pesquisas para comprovar isso. 


No Maranhão, um pesquisador que testou um novo brinco a base um pirazol (fipronil) e diazinon verificou que a eficiência do mosquicida foi melhor, comparado aos brincos exclusivos com diazinon. Antes de fazer esse tipo de controle por meio de brincos mosquicidas, consulte sempre seu veterinário de confiança!


Figura 5.
Bovino com alta infestação de mosca-dos-chifres.



Fonte: Banco de imagem do autor.


Figura 6.
Ilustração da fêmea da mosca depositando ovos em fezes frescas de bovinos.



Fonte: Marcelo Campos Pereira.


Em Santa Catarina, carrapatos e a tristeza continuam atacando

Foi noticiado, na edição do RADAR de janeiro último, que uma quantidade enorme de carrapatos estava parasitando o gado no planalto catarinense. Essa “onda” foi precedida de um período de intensa chuvarada, nessa região, nos meses de setembro e outubro, que reduziram quase a zero a infestação por esse parasita. Isso ocorreu devido ao encharcamento do solo e das pastagens, ambiente inapropriado para a sobrevivência das larvas e carrapatas adultas (“jabuticabas”). Contudo, quando as condições voltaram ao normal em dezembro passado, ocorreu um imenso parasitismo por esse aracnídeo, acompanhado por surtos de tristeza parasitária, com destaque à babesiose.


Na região Sul normalmente ocorrem três gerações de carrapatos, uma de pequena monta, com início em setembro, outra maior no final de dezembro e a última explosiva, entre março e maio. Cada geração de carrapatos dura ao redor de 65 dias, sendo 21 dias parasitando o animal e outros 44 se desenvolvendo no ambiente. Como a infestação de carrapatos no ano de 2024 foi ininterrupta e só cresceu em intensidade, a partir de dezembro, especialista em carrapatos acredita que além de emendar as duas gerações de carrapatos, uma outra possa surgir em seguida, para compensar a geração que falhou na segunda parte do ano passado. É esperar para ver!


Um reconhecido colega de campo catarinense confirmou esse agravamento na infestação de carrapatos no planalto deste estado. Na esteira desse parasitismo surgiram vários surtos de tristeza parasitária.  Numa das fazendas de gado Angus, com 800 cabeças, tiveram que tratar mais de 35 cabeças, além da morte de seis reprodutores, de alto valor genético e econômico. Os agentes causadores de tristeza foram confirmados em laboratório, sendo que 85% deles apresentavam a babesiose tradicional (B. bigemina) ou anaplasmose (Anaplasma marginale) e os demais babesiose nervosa (B. bovis), de mais difícil tratamento e recuperação.  Outro rebanho de gado Charolês foi também bastante acometido pela tristeza, exigindo intensos cuidados veterinário (figura 7). Desta vez, o gado Nelore, criado na região passou em claro, e não teve a doença. 


Relatos de infestação por carrapatos acima da média, acompanhados por casos de tristeza, também estão sendo descritos, por dois parasitologistas, em boa parte do Rio Grande do Sul e na região de Ponta Grossa, no Paraná.  


Figura 7.
Bovino com alta infestação de carrapatos.



Fonte: Banco de imagem do autor.


Figura 8.
Bovino Charolês acometido por tristeza parasitária bovina.



Fonte: Banco de imagem do autor.


Raiva bovina pelo Brasil afora

Acende o farol amarelo para a raiva, em região paulista

As autoridades da Defesa Animal Paulista estão trabalhando duro nas proximidades do município de Ibiúna (72 km da capital), na macrorregião de Sorocaba, para controlar um surto de raiva em animais, e um caso em uma pessoa. Nessa macrorregião tem sido relatado nos últimos dois anos pelo menos oito a dez surtos de raiva bovina, em vários municípios circunvizinhos de Ibiúna, inclusive nessa cidade. 


Porém, no último mês, além da raiva ser comprovada em alguns bovinos e equinos, acometeu um cachorro, que mordeu um ser humano, e que exigiu rápido tratamento, por meio de uma sequência de vacinações na pessoa. Embora o caso do cão esteja sob os cuidados da Secretaria da Saúde, de acordo com os sintomas apresentados, acredita-se que ele tenha contraído a raiva por mordida de morcego, e não em contato com outro cão raivoso. Quando a doença é transmitida cão-cão os sintomas são, na grande maioria, de raiva furiosa, enquanto, quando surge do morcego, o canídeo exibe quadro de raiva paralítica, mas que não o impede de morder uma vítima humana.


Além da captura de morcegos em toda macrorregião sorocabana, tanto os cães como os bovinos e equinos estão sendo vacinados e os agentes de vigilância sanitária atentos para detectar qualquer foco da doença.   


Figura 9.
Em vermelho o município de Ibiúna.



Fonte: Wikipédia.


Figura 10.
Municípios da circunvizinhança de Ibiúna-SP.



Fonte: J. Braga.


Caso comprovado de raiva em gambá

Embora não seja uma informação em bovino de corte, é de saúde pública e de origem animal.

Foi descrito e comprovado um caso de raiva em um gambá-de-orelha-branca (Didelphis albiventris), popularmente chamado de Mucura, Cassaco, Timbú, Sarigué, Saruê, Raposa, Taibu, Micurê etc. 


Esse animal era uma fêmea encontrada no parque Bosque de Jequitibás na cidade de Campinas, e morreu de um quadro de meningoencefalite com isolamento de vírus rábico. A importância científica do relato é que segundo a literatura, o gambá era considerado uma espécie muito resistente à raiva e comprovou-se que não . Quem relatou o caso foi o Instituto Adolfo Lutz e a Fac. Med. Vet. e Zoot. da USP. Pelos sintomas exibidos pelo animal, antes da morte, acredita-se que o animal contraiu a raiva de uma mordida de morcego, visto na mesmo região fortam capturados estes alados, sendo que alguns deles mantinham o vírus rábico.


A notícia acende um alerta na sáude pública, pois, devido a ausência de predadores, nas últimas duas décadas os gambas proliferaram grandemente nas cidades da região sudeste, e encontrei em algumas fazendas paulistas, muitos saruês, que se alimentavam de lixo. Atendi, no começo de minha carreira dois bovinos, que contraíram raiva, com sintomas furiosos, provenientes de mordidas de um cão e outro de um quati. Se por um lado os gambás são importantes, pois comem até 500 carrapatos por dia, que transmitem a febre maculosa, por outro, hipoteticamente, podem atacar outros animais, inclusive bovinos jovens, caso estajam raivosos. Todo cuidado é pouco!


Raiva em bovinos de corte nos estados

Aqui registramos os municípios em que foram descritos focos (até três animais) ou surtos (mais de três) de raiva bovina, recomendando-se que sejam vacinados todo o rebanho, a não ser bezerros de menos de 17 dias, em que vacina não os protege.   


São Paulo: Ibiúna,  Registro, Juquiá, Pedro de Toledo e Mococa. 


Minas Gerais: Abaeté, Alterosa, Aracitaba, Cambuquira, estiva, Marmelópolis e São Pedro dos Ferros. 


Rio Grande do Sul: Uruguaiana e Dom feliciano.



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