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Scot Consultoria

Radar sanitário para julho


Quinta-feira, 29 de junho de 2023 - 06h00

Médico-veterinário pela Universidade de São Paulo. É professor titular do departamento de clínica médica pela FMVZ-USP, especializado em Clínica de Ruminantes (ortolani@usp.br).


Fonte: IAGRO


Preparação para o nascimento de bezerros


Seguindo o calendário de cobertura, ou inseminação, da vacada de meados de outubro a janeiro, os bezerros vão começar a nascer em agosto. Assim, julho é o mês de preparo de materiais e treinamento para peões para o nascimento de bezerros.


Lave, ou compre, frascos apropriados para o tratamento do umbigo (figura 1); nos frascos, já deixe preparada solução de iodo a 6% ou o uso de produto comercial adequado (consulte seu veterinário). Treine os “materneiros” para a imersão de todo o umbigo na solução desinfetante por 30 a 60 segundos nessa solução, evitando molhar a pele do bezerro, pois provocará uma inflamação no local.


Compre uma solução de iodo forte a 10% e use 600ml dessa solução em 400ml de água filtrada ou álcool absoluto. Estoque essa solução num frasco escuro (frasco claro pode interferir no produto) e só transfira a solução para o frasco apropriado no começo da estação de parição.


Prepare também a solução de antiparasitário, para a prevenção da bicheira no umbigo, disponibilizando seringas e agulhas descartáveis para a aplicação subcutânea.


Resultados desapontantes têm sido obtidos com o uso de ivermectina, devido à alta resistência das larvas de bicheira a este princípio ativo. Embora a eficiência da doramectina esteja diminuindo a cada ano, ainda muitos técnicos têm recomendado o seu uso.


Muitos me perguntam da necessidade do uso de antibióticos injetáveis no dia do nascimento. Acompanhei uma fazenda que tratou metade dos bezerros com esse medicamento e a outra metade não. Não existiu diferença entre os grupos nas frequências de inflamações de umbigo e diarreias. Deve-se evitar o uso de antibióticos quando não necessário, pois além de ter um custo aumenta a chance de resistência de bactérias a esses medicamentos.


Figura 1.
Copo, sem retorno, para o tratamento de umbigo.

Fonte: Enrico L. Ortolani 


Morte de gado nelore por frio em MS. Entenda os motivos!

Segundo dados da IAGRO (Instituto Estadual de Defesa Animal e Vegetal), de 11 para 12 de junho, 1.071 bovinos morreram de frio (hipotermia), a esmagadora maioria da raça Nelore (figura 2), em diferentes pontos do Mato Grosso do Sul, com destaque para a região de Nhecolândia (Pantanal). Inicialmente, estima-se que o prejuízo foi a R$3 milhões de reais.


Mortes por frio já foram muitas vezes descritas (1975, 2000, 2010 e 2014) nesse estado, com destaque para a região Sudoeste, matando em conjunto provavelmente mais de 50 mil cabeças. É importante lembrar que, em 2010, foram contabilizadas mais de 5 mil mortes de gado Nelore por hipotermia no Pantanal boliviano e no paraguaio.


A hipotermia (hipo = baixa; termia = temperatura corporal) acontece pela associação de três fenômenos meteorológicos: A) alta temperatura no dia anterior à chegada da frente fria; B) seguida de chuvarada (acima de 25mm de chuva/dia) acompanhada de ventos gelados, neblina e nevoeiro; e C) queda brusca de temperatura ambiente, com mínimas inferiores a 9ºC. Nessas condições (baixa temperatura, alta umidade do ar e algum vento) a sensação térmica do animal é de 4ºC – 5ºC e não de 9ºC, como registrado no termômetro. A amplitude térmica (diferença entre a máxima do dia quente e mínima do dia frio) para ocorrer a morte deve ser superior a 17ºC, fenômeno denominado de inversão térmica.


Na região de Nhecolândia, onde mais ocorreu morte pelo frio, a amplitude térmica foi de 25ºC (34ºC máxima e 9ºC mínima), em menos de 15 horas, e choveu 30mm num dia. Em Ponta Porã, onde é mais comum morrer gado de frio, mas não foi registrada morte nesta atual “friaca”, a amplitude foi de 20ºC, mas as chuvas atingiram apenas 8mm.


Nessas condições, o gado procura abrigos contra o frio, a chuva e o vento, sendo a morte mais frequente em bovinos criados em ambientes muito abertos. Segundo apurei, 80% das rezes que morreram eram vacas paridas e bezerros desmamados, boa parte deles subnutridos, porém sucumbiram alguns poucos animais relativamente gordos.


Segundo informações que obtive com meteorologistas, em Mato Grosso do Sul, com destaque para sua região sudoeste, o fenômeno de inversão térmica é mais pronunciado e rápido, entre todos os estados do país, facilitando a morte de zebuínos.


Num estudo que realizamos na FMVZ-USP, verificamos que animais subnutridos produzem 65% menos hormônios da tiroide (T3 e T4), que estimulam o animal queimar calorias para aumentar sua temperatura, que bovinos bem alimentados e gordos. Animais bem nutridos têm uma maior capa de gordura debaixo da pele, que funciona como isolante térmico. Porém, a gordura estocada no organismo não é sinônimo de que ela possa ser empregada para gerar calorias em curtíssimo prazo, pois para que isto ocorra demora um pouco mais de um dia para esta mobilização de gordura.


A pergunta que não quer calar é por que os zebuínos são mais atingidos? A morte por hipotermia ocorre de forma idêntica em gado Brahman, de sangue zebuíno, no Sul da terra do Tio Sam.


Os zebuínos, no decorrer do tempo e por viverem em ambientes quentes, foram muito adaptados para dissipar (perder) calor do organismo, evitando o estresse térmico, e não para reter o calor, diferente do gado taurino ou meio sangue.


No dia quente que antecede a “friaca”, o zebuíno elimina muito calor. A chuva e o vento fazem o animal perder muito mais calorias para se esquentar. É o mesmo que você acabar de tomar um banho gelado e não se enxugar e, além disso, ficar no vento frio, baixando sua temperatura interna para valer.


Na madrugada do dia frio, a temperatura interna do corpo, que normalmente fica estável em torno de 38ºC, despenca para menos de 35ºC. Essa hipotermia grave diminui os batimentos cardíacos, assim como a pressão arterial, e faz o bovino perder a consciência, provocando a morte por parada cardiorrespiratória em poucas horas. Este espaço de tempo é insuficiente para desenvolver um quadro de pneumonia, que só iria acontecer se os dias muitos frios se prolongassem.


Porém, o gado zebuíno pode sobreviver em ambientes mais gelados (temos relatos de aguentarem até –1ºC), desde que a temperatura caia mais lentamente, dando tempo para que os animais possam se adaptar e começar a mobilizar suas reservas de energia para a geração de calor.        


A prevenção deve ser feita melhorando a nutrição do rebanho, combatendo as doenças, como a verminose, colocando cercas-vivas ao redor das pastagens e acendendo fogueiras para o gado se esquentar nos dias muito frios.


Figura 2.
Bovinos mortos devido frio intenso em Mato Grosso do Sul.

Fonte: IAGRO


Figura 3.
Bovinos mortos devido ao frio intenso em Mato Grosso do Sul.

Fonte: IAGRO


Figura 4.
Localização dos acontecimentos de mortalidade devido à hipotermia em Mato Grosso do Sul.

Fonte: IAGRO


Figura 5.
Fogueira utilizada para minimizar impactos das ondas de frio intensas na região.

Fonte: IAGRO


Surto de babesiose em Santarém - PA

Segundo relato de médico veterinário que atendeu o surto, numa fazenda de Santarém PA, em poucos dias, 10 vacas Nelore morreram com sintomas muito sugestivos de babesiose: tristeza, abatimento, isolamento, eliminação de urina com cor de “coca-cola” (hemoglobinúria) (figura 6), algum grau de anemia, globo ocular amarelado (ictérico), febre etc.


Na necrópsia, detectaram as seguintes alterações: acúmulo de líquido sanguinolento no saco que recobre o coração (saco pericárdico), rins com coloração mais escura (figura 7), fígado aumentado de tamanho e vesícula biliar cheia de bile com aspecto viscoso. Comprovou-se a doença ao encontrar a presença de do parasita (Babesia bigemina) dentro das hemácias (figura 8) no exame de sangue. Foram vistos ainda alguns carrapatos na pele dos animais doentes. A partir do diagnóstico, outros 10 animais adultos tiveram os mesmos sintomas, mas todos sobreviveram após o tratamento com medicamentos apropriados. 


Figura 6.
Urina cor de “coca-cola”.

Fonte: Enrico L. Ortolani


Figura 7.
Rim com cor mais escura.

Fonte: Enrico L. Ortolani


Figura 8.
Presença de B. bigemina nas hemácias.

Fonte: Enrico L. Ortolani


Essa doença é transmitida por carrapatos, embora a minoria deles esteja naturalmente contaminada com o protozoário causador da doença. Animais enfraquecidos, ou que têm poucos anticorpos e defesas contra o parasita, são os mais propensos a se tornarem doentes.


No Brasil, temos três condições em relação à presença de carrapatos em bovinos. Na pontinha do estado do RS (município de Santa Vitória do Palmar, onde fica o arroio Chuí), não tem carrapatos (livre). Do centro do PR, toda a região Sudeste e Centro-Oeste e algumas regiões da BA, TO, PA e MA, existe a possibilidade de parasitismo por carrapatos no decorrer de praticamente todo ano (estabilidade enzoótica). E nos estados do RS, SC, Sul do PR, AC, RN, boa parte da região Nordeste e em áreas do PA, AM, AP e RR, os carrapatos atacam o gado apenas em uma parte do ano, ficando ausente em outros períodos (instabilidade enzoótica). Nessa última área, se o tempo sem a presença de carrapatos for muito prolongado ocorrerá queda na produção de anticorpos contra os agentes causadores da tristeza parasitária (Babesia bigemina e B. bovis e Anaplasma marginale) ficando os bovinos, principalmente os adultos, mais propensos à doença.


Especula-se que, nesse surto em Santarém-PA, os bovinos ficaram “descarrapatados” durante o período prolongado de chuvas (dezembro a abril), em que a precipitação média ultrapassa em muito os 100 mm mensais, dificultando muito a sobrevivência de larvas de carrapatos nas pastagens. Com a diminuição das chuvas em maio e o início do ataque de carrapatos, surgiu subitamente a doença nos bovinos mais desprotegidos. Ainda faltam maiores estudos na região de Santarém para comprovar essa especulação.


Cisticercose bovina preocupa em MS

Embora a cisticercose possa ocorrer em todo o Brasil, nesse último mês, tal parasitose foi mais relatada e preocupante no MS. Segundo levantamento feito por um especialista, foram detectados, em alguns lotes de bovinos confinados, ao redor de 9% de cisticercose nos animais abatidos.


Em cerca de metade deles, a quantidade de cisticercos vivos ou calcificados na carcaça não era tão alta (até 8 cisticercos vivos ou calcificados), tendo a possibilidade de a carcaça ser “tratada” pelo frio (- 9º C) por 10 dias para a morte do cisticerco, mas as demais carcaças dos animais altamente infectados foram parar na graxaria, impróprias para consumo.


Em ambas as situações, os prejuízos são enormes para o pecuarista, pois constatei que os frigoríficos descontam em média 50% do valor pago pelo boi nos casos de carcaças “tratadas pelo frio” e a perda é total no caso de graxaria, não sendo remunerado nada para o pecuarista.


Nesse caso particular do MS, o especialista conseguiu detectar como os bovinos se contaminaram com o parasita. Depois de investigar, concluiu que os animais permaneciam numa grande pastagem, para descanso e adaptação ao ambiente, antes de entrarem no confinamento. Esse piquete era recém-formado e ficava em área com alto fluxo de pessoas, entre eles contratados para reforma de cercas, plantio de cana-de-açúcar e caçadores, que defecavam no local, contaminando o ambiente com ovos de Taenia saginata.


Esses ovos, depois de ingeridos pelo boi, se transformam em embriões no intestino e por aí penetram no organismo. Já um pouco mais evoluídos, migram e ficam encarcerados na musculatura e em outros órgãos, dando origem aos cisticercos (canjiquinhas). Para prevenir o quadro, recomendou-se cercar melhor o local e evitar a entrada de estranhos.


A cisticercose bovina pode se originar da ingestão de alimentos ou de água contaminada com fezes humanas de pessoas que têm a teníase, por comerem carne bovina, com “canjiquinha”, mal passada.


É bom que se frise que, em muitos casos, é difícil o controle da cisticercose na boiada, ou porque não se sabe onde os ovos estão, ou pela dificuldade em combatê-los nas pastagens, nas aguadas e em outras paragens. O pior é que o homem está no centro de tudo!


Berne em pleno período seco em SP

Em junho, durante o início da estação seca, continua relativamente alta a infestação de bernes nas boiadas das regiões de Sorocaba e São João da Boa Vista. Segundo minha contagem, o número de bernes médios por animal foi um pouco mais alto em junho de 2023 que no mesmo mês de 2022 (11,40 x 8,12), num rebanho mestiço (Nelore x Angus) criado na região de Sorocaba.


Estudos clássicos, no estado de São Paulo, identificaram que o maior ataque de bernes está associado aos meses cujas temperaturas (> 23ºC) e as pluviosidades (> 80mm) médias são mais altas. Porém, como esses valores (temperatura e pluviosidade) foram muito semelhantes em 2022 e 2023 acredita-se que a maior população de bernes, no presente ano, esteja ligada à maior resistência destes ectoparasitas aos bernicidas empregados, no presente caso a base de organofosforados.


A questão da resistência dos bernes a um maior número de princípios ativos parece aumentar ano-a-ano e desafia os pesquisadores e as empresas veterinárias que fabricam tais medicamentos, além de assustar os pecuaristas, principalmente das regiões Sul e Sudeste, onde o berne mais campeia.


Figura 9.
Vaca muito atacada por bernes.

Fonte: Enrico L. Ortolani


Focos e surtos de raiva pelo Brasil afora

Mato Grosso: Diamantino e Chapada dos Guimarães (INDEA)


Pará: Tomé-Açú (ADEPARÁ)


São Paulo: Tupã, Marília, Miracatu, Juquitiba, Juquiá e Pindamonhangaba. Curiosidade: foi comprovado raiva em uma anta de vida livre em Novo Horizonte. (EDA)


Rio Grande do Sul: Alegrete, Bossoroca, Cachoeria do Sul, Campo Bom, Dom Feliciano, Gravataí, Itaqui, Itati, Jari, Jaguari, Santiago, Redentora, Taquara (SEAPI)



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