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Scot Consultoria

Mercado de combustíveis: impactos no mercado energético em 2022 e perspectivas para 2023

Entrevista com o diretor-geral/ANP, Rodolfo Henrique de Saboia

Terça-feira, 29 de novembro de 2022 - 08h00
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Diretor-geral da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP). Bacharel em Ciências Navais pela Escola Naval, possui especialização de Máquinas para Oficiais pelo Centro de Instrução Almirante Wandenkolk, curso de política e estratégia marítimas pela Escola de Guerra Naval e Gestão Internacional pela UFRJ.

Foto: ShutterStock


Scot Consultoria/Destaque Rural: Sobre as paralisações, houve desabastecimento devido às mobilizações políticas?

Rodolfo Saboia: As paralisações alcançaram o Brasil todo e impactaram na circulação de todas as mercadorias por vias rodoviárias. Estamos enfrentando dificuldade na circulação de alguns produtos, principalmente biocombustíveis, necessários para compor teores obrigatórios mínimos de alguns combustíveis.

Nós conseguimos acompanhar a situação de uma forma bastante amiúde, acompanhando o atendimento do mercado como um todo, através de diversos representantes de vários setores e a federação de vendedores (Fecombustíveis).

A Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) alcança uma gama enorme de atividades, sendo um dos motes da agência: “do poço ao posto”. Nós tivemos a preocupação de manter contato com a ponta revendedora, obter o melhor retorno possível a respeito da situação do abastecimento para o consumidor no final e não tivemos nenhum relato de escassez de produtos. Tivemos baixas nos estoques, mas não chegou ao ponto de tomarmos alguma medida regulatória.

Scot Consultoria/Destaque Rural: Vimos, neste ano, uma grande influência da guerra entre a Rússia e a Ucrânia na questão do petróleo. Como os preços dos combustíveis esse ano foram afetados pela guerra e como está a expectativa para o ano que vem, já que ela ainda persiste?

Rodolfo Saboia: De maneira geral, viemos de dois episódios bastante dramáticos que impactaram o mundo como um todo: a transição energética - que vinha acontecendo em função das mudanças climáticas - e a pandemia do covid-19.

Durante a pandemia, o impacto no setor foi tão grande que, em algum momento, o preço do petróleo chegou a ficar negativo em alguns mercados, como na Costa do Golfo americano. Isso significa que o contratante de uma determinada carga pergunta ao fornecedor o seguinte: “quanto você quer para não me entregar o produto que eu comprei?” Porque ele não tinha mais onde estocar!

Quando iniciou o conflito entre a Rússia e a Ucrânia - dois grandes produtores de commodities, a Rússia, em particular, um grande fornecedor de energia para a Europa na forma de gás natural, óleo diesel e petróleo - houve uma onda de choque que repercutiu mundo afora. O que nós podemos observar é que houve um deslocamento das linhas de comércio. As rotas de comércio de produtos se reacomodaram no mundo com alguns consumidores tradicionais, como a Europa, por exemplo, recusando-se a receber e a consumir produtos da Rússia. Esse fluxo de comércio foi sendo redirecionado para outros países que se dispunham a fazê-lo, muitas vezes, com um desconto importante - a China e a Índia, por exemplo.

No momento, a situação encontra-se estabilizada. Entretanto, nós sabemos que a Europa conseguiu reabastecer seus reservatórios de gás natural até quase 100%. O inverno demorou para chegar na Europa e eles não tinham onde armazenar o insumo, estão armazenando hoje em navios que ficam próximos aos portos carregados, aguardando para poder descarregar o gás natural.

Nós também temos que lembrar que esse problema não se esgota nesse inverno europeu. A Europa conseguiu se reestabelecer de gás natural, em grande parte estabelecida pela própria Rússia. Essa realidade vai mudar de acordo com a introdução de sanções a partir do final desse ano, devido à maior dificuldade a partir do estabelecimento de limite de preço para a compra de produtos russos por intermédio de restrições ao tráfego marítimo.

Para o próximo ano, teremos um desafio em função desse cenário, que pode modificar a logística de fornecimento desses produtos, e o Brasil não está isento de ser impactado.

Scot Consultoria/Destaque Rural: Para 2023, com a mudança de governo, podemos esperar a volta do ICMS da gasolina e uma expectativa de aumento do biodiesel?

Rodolfo Saboia: Não podemos garantir como os aspectos serão enxergados pelo novo governo, assim como as reduções de impostos que aconteceram no antigo governo. De uma forma geral, o Brasil sofreu um impacto que já era previsto, mas com uma janela de tempo de dois anos para que o financeiro dos estados pudesse se adaptar à nova realidade de alguns impostos que foram zerados, como já era o caso do diesel e agora a gasolina.

Também não podemos esquecer que a transição energética é uma ação necessária e que deve respeitar os limites que a necessidade por energia demanda. Hoje, o mundo ainda depende mais de 80% da energia originada por combustíveis fósseis. Não é possível fazer uma transição energética restringindo a oferta desse combustível, ela tem que acontecer pelo lado da demanda, por intermédio da substituição de combustíveis fósseis pelas fontes renováveis.

Alguns políticos internacionais buscaram realizar a transição energética através da restrição da oferta de combustíveis fósseis. Essa fórmula poderia levar primeiramente a um efeito imediato de elevação dos custos da energia, efeito perverso inicial que atinge “de cara” os menos favorecidos economicamente. Portanto, é uma receita cruel para fazer uma transição energética.

A transição precisa respeitar a equação que fecha a demanda e a oferta de combustíveis renováveis - assim será feita uma transição energética racional. A segurança energética não pode ser desconsiderada.

Scot Consultoria/Destaque Rural: Falando em preços, na região Sul, outubro fechou com o menor preço de gasolina no país, a R$4,94 - um valor 2% menor comparado a setembro. Como é feita essa regulação de preços nos estados do Brasil? 

Rodolfo Saboia: Na verdade, não existe regulação de preços no Brasil. O que existe hoje é a liberdade de mercado, que dita o preço regional a partir dos insumos que são produzidos e, muitas vezes, pelos biocombustíveis que compõem os combustíveis como um todo. Na maioria das vezes, a proximidade com as fontes desses insumos pode produzir um efeito de redução nos preços.

No entanto, a ANP não administra preços, ela monitora e informa os preços. O site da ANP apresenta as informações do levantamento de preços do Brasil como um todo, para que isso subsidie políticas que possam ser direcionadas a esse mercado.

Scot Consultoria/Destaque Rural: Sabemos também que a ANP tem uma função de fiscalização. Nesse sentido, como é feita a vistoria dos combustíveis de produtos adulterados?

Rodolfo Saboia: Temos um programa de fiscalização com secretarias de fazendas e com unidades de bombeiros estaduais. Nessa atividade, promovemos em torno de 19 mil ações fiscalizadoras por mês dentro desse mercado, um sistema que fiscaliza, autua e impõe sanções.

Além do programa de fiscalização, temos o programa de monitoramento de qualidade dos combustíveis, que recolhe amostras no Brasil inteiro e envia para laboratórios para que tenhamos um acompanhamento melhor da qualidade do produto.

Resumidamente, existe uma conformidade de mais de 95% como média geral do Brasil nos combustíveis que são oferecidos ao consumidor. Então, eu diria que temos um mercado bem atendido no que tange a qualidade do produto que é oferecido ao consumidor.

Scot Consultoria/Destaque Rural: Quais são os direitos do consumidor, caso ele perceba alguma alteração no combustível adquirido?

Rodolfo Saboia: O consumidor tem direito de saber qual a origem do combustível. Na bomba que você abastece, pode checar qual é a origem daquele produto. Além disso, há testes que você pode pedir que sejam realizados pelo revendedor também. Todas essas informações estão disponíveis no site da ANP.


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