Leonardo Alencar é graduado em Zootecnia pela Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (Unesp), possui especialização em Gestão do Agronegócio com ênfase em Gestão de Riscos pela Universidade Federal de Lavras e em Estratégia Competitiva pela Ludwig. Ele também realizou MBA em Estoque e Mercado Futuro pela Fundação Instituto de Pesquisas Contábeis, Atuariais e Financeiras (Fipecafi), em Inteligência de Mercado pela Fundação Instituto em Administração (FIA) e em Big Data pela Fundação Getúlio Vargas.
Foto: Visual Hunt
Atualmente vimos notícias sobre o aparecimento de focos da ferrugem asiática (Phakopsora pachyrhizi) em lavouras da safra 2018/2019 em alguns estados da região Sul, Sudeste e do Centro Oeste. As informações preocupam produtores, que temem os prejuízos que a doença pode causar a produção.
De acordo com a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), a produção do grão para essa safra é de aproximadamente 119,2 milhões de toneladas, e a instalação da ferrugem asiática no campo, pode ser um fator de correção para esse número.
Para esclarecer algumas dúvidas e entender sobre a doença e seus reais impactos a soja, a Scot Consultoria convidou Rafael Moreira Soares, pesquisador da Embrapa Soja para uma entrevista.
Rafael possui graduação em agronomia pela Universidade de Passo Fundo (1994), mestrado (em 1997) e doutorado (em 2001) em agronomia na área de Proteção de Plantas pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (UNESP). Trabalhou na Fundação de Pesquisa Agropecuária do Rio Grande do Sul (Fepagro) entre os anos de 2002 e 2004, e desde 2004 é pesquisador da Embrapa Soja. Tem experiência na área de agronomia, com ênfase em fitopatologia, atuando principalmente na realização de pesquisas para o manejo de doenças da cultura de soja (Glycine max), com foco no desenvolvimento de cultivares resistentes à doenças e controle químico. Veja a entrevista a seguir:
Scot Consultoria: O senhor poderia comentar sobre a importância da ferrugem asiática para a cultura da soja e qual o seu potencial de dano?
Rafael Soares: A ferrugem asiática da soja é um fungo e é a principal doença da cultura no Brasil atualmente, isto porque é uma doença bastante agressiva que causa desfolha e perda de produtividade na lavoura e está disseminada em praticamente todas as regiões produtoras do grão no Brasil, com exceção do extremo Norte do país, como Roraima, que ainda não foi detectado o problema.
Nós temos várias ferramentas para o manejo da doença e entre elas, a principal é o uso de fungicidas, ou seja, o controle químico. Mas a nossa maior preocupação tem sido o aparecimento de resistência do fungo aos fungicidas utilizados. Então, produtos que lá no início, quando a ferrugem apareceu, em 2003 e 2004, funcionavam muito bem, hoje já possuem defeitos.
Scot Consultoria: Em relação as moléculas disponíveis no mercado para controlar a doença, o senhor acredita que o produtor está bem amparado com as opções encontradas?
Rafael Soares: Com certeza nós necessitamos de mais opções. O agricultor ainda tem produtos bons para serem utilizados, podendo utilizar uma mistura de duas ou três moléculas diferentes comerciais que já vem pronta.
Também temos a recomendação de utilizar produtos “multi-sítios” que são produtos de contato que não são tão modernos e eficientes como essas moléculas utilizadas mais comumente, são produtos efêmeros que penetram na planta. Mas a mistura desses “multi-sítios” tem ajudado a melhorar o índice da doença e controle e, além disso, eles auxiliam também a manejar esse problema da resistência, pois não estão sujeitos a esse fator como os produtos “sítio-específicos” que são os produtos sistêmicos.
Então, nós temos a necessidade de que as empresas que desenvolvem esses produtos lancem novas moléculas, para que nós não fiquemos correndo o risco de ficarmos sem essa ferramenta de controle, pois já foi registrado resistência sobre as três principais moléculas que são utilizadas.
Scot Consultoria: Quais as novas linhas de pesquisa em relação ao combate à doença?
Rafael Soares: São diversas as formas manejo. O correto é começar na entressafra, com o agricultor adotando o vazio sanitário e cuidando da sua área para que não tenha plantas espontâneas de soja, que se perde no transporte após a colheita, porque pode ter sobrevivência do fungo, essa é a primeira medida que o agricultor, antes de plantar a soja, já deve adotar para começar a controlar a doença.
Há também a parte de manejo cultural, que seria semear o mais cedo possível e com cultivares mais precoces, isso tem ajudado no que nós chamamos de escape da doença, pois você planta mais cedo e colhe mais cedo, escapando do período mais crítico quando a população de fungos está mais alta no ambiente. Por isso que nós somos a favor de que a janela de plantio não seja muito longa, pois quanto mais tarde for plantado, pior, tendo maiores chances de manifestação da doença e tendo que aplicar maior quantidade de fungicida.
E, além disso, as novas tecnologias que nós temos mais esperança para melhorar o controle da doença, é o uso de cultivares resistentes à ferrugem. Já existem algumas cultivares no mercado, a Embrapa lançou a Tecnologia Shield, que é o nome comercial para nossas variedades que possuem genes de resistência à doença.
Não são cultivares imunes à doença, elas ainda irão precisar de aplicação de fungicidas como as outras, mas em caso de epidemias mais fortes, ou o agricultor não conseguir ir ao campo devido às chuvas para a aplicação no momento exato, serão materiais que suportam mais a doença, que não se multiplicam tanto. Essas cultivares talvez sejam, no momento, a tecnologia mais inovadora que nós temos.
Scot Consultoria: Quais os principais manejos que devem ser adotados para a diminuição da infestação quando a doença já está inserida?
Rafael Soares: O ideal é que o agricultor entre com o controle químico preventivamente, pelo menos que a primeira aplicação seja realizada antes de visualizar a doença. Mas para isso, ele deve utilizar ferramentas informativas disponíveis, por exemplo, o site de consórcio de ferrugem que tem as primeiras ocorrências, além de outras informações, como o clima, para fazer essa aplicação preventiva bem-feita, para que ele possa evitar ao máximo que a doença evolua em sua lavoura.
Eventualmente, principalmente nos cultivos mais tardios, a doença vai entrar, porque não tem como ter 100% de proteção. A partir disso, ele tem que ir realizando as aplicações de fungicidas e fazer o monitoramento. O residual da maioria dos produtos está entre 15 a 20 dias, então o agricultor terá que fazer a aplicação novamente após esse tempo se a doença ainda estiver presente.
Além disso, é necessário observar outras doenças. Em via de regra, as aplicações estão sendo feitas para a ferrugem, mas outras doenças, como doenças de final de ciclo, como Oídio em épocas mais secas, mofo branco, mancha alta, são doenças que podem demandar aplicações de fungicidas.
Scot Consultoria: Como o custo de produção é afetado em caso de foco da doença na propriedade?
Rafael Soares: Nós calculamos que anualmente, no Brasil, a ferrugem tem um custo de US$2,00 bilhões. Esse custo basicamente tem sido de perda, mas o produtor tem conseguido diminuir significativamente as perdas, e basicamente então, esse custo é a aplicação do fungicida. Os melhores produtos têm um custo relativamente elevado, essas misturas de sítios também têm um custo elevado, então você está fazendo uma aplicação, mas nesta aplicação você está colocando dois ou três produtos, o que aumenta o custo por hectare da aplicação.
É esse que tem sido o maior custo de produção a respeito da ferrugem. E, evidentemente que se o agricultor entrar no momento errado ou não conseguir controlar a doença, ela pode causar perdas, que podem variar de 5% a 20%, e em caso de perder a mão mesmo pode até ser maior. Há casos, em ensaios, que não são feitas as aplicações, que as perdas chegam a 80%-90%.
Receba nossos relatórios diários e gratuitos