Foto: Bela Magrela
Trazendo algumas ponderações sobre os movimentos do ciclo pecuário e seu momento, como está o mercado do boi gordo, perspectivas para o mercado de reposição e outros pontos importantes para você que está aí se perguntando “e aí, o ciclo virou?”, conversamos com Pedro Gonçalves, engenheiro agrônomo, formado pela FCAV/Unesp, analista de mercado da Scot Consultoria, e responsável por análises sobre as áreas de bovinocultura de corte e insumos agrícolas.
Pedro, será um dos palestrantes no Encontro de Confinamento e Recriadores, da Scot Consultoria, que acontecerá entre 8 e 11 de abril, em Ribeirão Preto e Barretos, São Paulo.
Scot Consultoria: Pedro, o começo do ano foi marcado por especulações sobre uma possível virada do ciclo pecuário, passamos por dois anos de baixa no ciclo pecuário e agora o pecuarista está na expectativa da chegada da fase de alta. Podemos dizer que estamos em qual momento do ciclo?
Pedro Gonçalves: Essa é realmente uma pergunta que temos recebido bastante. No mercado pecuário, o preço subiu forte no final de 2024. Em três meses, a arroba do boi gordo passou de R$240,00 para R$340,00, R$350,00 em São Paulo. Ou seja, houve uma inflação de preços muito grande em um curto espaço de tempo e muitos começaram a se questionar: viramos o ciclo?
O início de 2025 surpreendeu bastante, com a expectativa de diminuição da oferta de fêmeas para o abate. Esperávamos que fosse diferente do que aconteceu em 2024, que foi um ano recorde de abate e participação de fêmeas. No entanto, está acontecendo o contrário, pois o final de 2024 foi bastante impactado pela seca, queimadas, incêndios, entre outros fatores que afetaram a estação de monta.
Em algumas praças monitoradas, vimos a participação de fêmeas no abate chegar a 60,0%, 65,0%, um abate muito mais acelerado do que em janeiro de 2024.
Com essa participação de fêmeas, observamos uma oferta muito alta, então os preços têm trabalhado um pouco mais baixos. Estamos vendo em fevereiro, inclusive, queda nos preços, mais próximos hoje de R$315,00 e R$320,00 por arroba, em São Paulo.
Os preços da reposição e do boi gordo subindo forte no fim de 2024 não necessariamente sinaliza uma entrada na fase de alta - pode ser, dependendo do aspecto que estivermos analisando - mas, considerando o principal pilar da virada de fases, a participação de fêmeas nos abates, essa foi recorde em 2024 e ainda está elevada no começo de 2025. Por isso, por enquanto, enxergamos como um momento de transição.
Os preços futuros já apontam para negociações mais próximas de R$300,00 por arroba nos próximos meses. O ciclo pecuário, que é fora do período anual das condições de pastagem, ainda “tem chão para andar”. Dentro do ano, ainda vemos uma grande oferta, que inclusive deve perdurar durante o primeiro semestre, acompanhando a sazonalidade do descarte de fêmeas da estação de monta e a diminuição da capacidade de suporte das pastagens a partir de meados abril.
Scot Consultoria: E olhando para essa grande participação de fêmeas no abate, que é um grande indicativo de virada de fase no ciclo, de que forma isso impacta o mercado de reposição?
Pedro Gonçalves: Se estamos abatendo matrizes, ou seja, quem dá à luz ao bezerro e dá continuidade ao rebanho, não temos mais o animal que vai entrar. Sem produção, diminuímos a oferta de todas às categorias seguintes.
Considerando nove meses de gestação da vaca e oito meses de desmama, são necessários praticamente 17 a 24 meses para sentirmos o impacto. Ou seja, a safra de bezerros que estamos vendo agora, em 2025, é resultado da estação de monta de dois anos atrás, final de 2023 e início de 2024.
Todo mundo começou a querer produzir, boi gordo, investindo mais devido à alta no final do ano passado. Isso aumentou a demanda para bovinos de reposição, tanto que em 2025, os preços da reposição estão praticamente 30,0% mais altos do que no mesmo período do ano anterior. A expectativa, continuando esse abate de fêmeas intenso, é que para 2026, resultado da estação de monta de 2024, a oferta de bovinos de reposição seja muito menor e os preços, possivelmente, mais altos.
Essa é a dinâmica: temos a estação de monta de um ano e sentimos os efeitos dois anos à frente. Continuar os abates de matrizes vai depender do produtor, se ele vai colocar a matriz para o abate ou segurar na propriedade. Cada produtor tem sua estratégia de comercialização.
Scot Consultoria: E como tem sido o comportamento de preços nos últimos anos? O que podemos observar olhando para a evolução do preço das categorias de reposição ano a ano?
Pedro Gonçalves: Nos últimos cinco anos, vimos uma grande expansão na atividade de confinamento. Algumas categorias, principalmente a negociação do boi magro, atreladas ao confinamento. Com um grande investimento na estratégia de confinamento para a produção, observamos uma demanda muito aquecida para o boi magro, especialmente nas janelas do primeiro e segundo giro. O primeiro giro ocorre no primeiro semestre e próximo a abril devemos ter uma demanda mais aquecida por bovinos para reposição erados, do que agora.
O início do ano é um pouco mais parado, com comercializações baixas. Nos relatos de pecuaristas e leilões, vemos uma movimentação menos intensa nesse momento. Mas, com a chegada do primeiro giro de confinamento, isso deve mudar, aumentando as ofertas.
Os bovinos de reposição no país, em geral, são produzidos em pasto. Não temos a estratégia de sequestro ou resgate tão forte como nos Estados Unidos, onde fazem bastante a cria e recria dentro de confinamentos para compensar o período de neve.
No Brasil, não temos esse problema climático e conseguimos produzir bezerros o ano todo, com a recria dentro da pastagem. A oferta de bovinos de reposição acompanha o boi gordo produzido a pasto. No primeiro semestre, a oferta é maior devido às melhores condições de pastagem, que aumentam conforme o ciclo de chuvas se encerra.
No segundo semestre, os produtores tendem a adotar estratégias diferentes, incluindo compras mais próximas de novembro, quando a pastagem cresce um pouquinho mais. Ou seja, o bovino de reposição acompanha o momento de pastagem, seja na época de secas ou de águas.
Scot Consultoria: Um grande indicador que pode ajudar o pecuarista na hora de fechar a conta é relação de troca com o boi gordo, como está essa relação de troca e o que ela nos diz sobre a atual situação do mercado de reposição?
Pedro Gonçalves: Contextualizando, a relação de troca é, basicamente, quantas arrobas de boi gordo são necessárias para comprar um bovino de reposição, ou quantos bovinos para reposição eu compro com a venda do meu boi gordo – em nossas análises, indexado em 19 arrobas. Por exemplo, se o bovino de reposição, um garrote, por exemplo, custa R$3.000,00 e a arroba do boi gordo está R$300,00, seriam necessárias 10 arrobas para comprar este garrote.
No fim de 2024, com a arroba saindo de R$240,00 para R$340,00, a relação de troca ficou muito favorável para quem estava comercializando o boi gordo. Inclusive, ao calcular a rentabilidade dentro de um confinamento, na janela de 90 dias, o pecuarista que comprasse e vendesse nesse período conseguiria uma rentabilidade de 50,0% por bovino comercializado, muito alta para a bovinocultura de corte.
Normalmente, a rentabilidade gira em torno de 1,5% a 3,0%, chegando a 10,0% em alguns momentos, mas ainda bem abaixo dos 50,0%, alcançados naquele período. É claro que estamos falando de confinamento, que gira um pouco mais rápido. E para o restante?
Nos últimos três meses, essa relação de troca piorou um pouco, ou seja, são necessárias mais arrobas de boi gordo para comprar um bovino de reposição. Os preços das categorias de reposição começaram a acompanhar os preços do boi gordo e agora a relação de troca está praticamente estável.
Scot Consultoria: A situação está estável, mas o pecuarista precisa ficar atento. De que forma Encontro de Confinamento e Recriadores pode ajudá-lo a se preparar nessa fase de transição?
No nosso evento abordaremos muitos cenários, especialmente sobre o custo de produção. Quando falamos da comercialização do bovino de reposição, ele entra como custo produtivo, e, querendo ou não, a compra do animal representa de 60,0% a 80,0% do custo total, dependendo da região.
Entre outras coisas, vamos discutir diversas práticas dentro da recria e do confinamento, que podem trazer insights muito bons para os produtores. Falaremos sobre a exportação e demanda interna. Vamos discutir como podemos atender mercados bastante exigentes, utilizando todas essas tecnologias que temos no confinamento e na produção de recria do nosso país.
Até lá, possivelmente, já teremos uma resposta do Japão em relação às primeiras tratativas para a abertura de comercialização da carne bovina brasileira. Quem sabe, também teremos algumas respostas em relação às tarifas que Trump pode estar trazendo para o Brasil e como isso pode impactar toda a nossa atividade.
Clique aqui para saber mais sobre o Encontro de Confinamento e Recriadores da Scot Consultoria.
Engenheiro agrônomo, formado pela FCAV/UNESP. É analista de mercado das áreas de bovinocultura de corte e insumos agrícolas
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