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Scot Consultoria

Entrevista com Liliane Suguisawa


Terça-feira, 3 de julho de 2012 - 13h17

Liliane Suguisawa é doutora em Marcadores Moleculares para Qualidade da Carne pela UNESP-Botucatu e diretora técnica da empresa DGT Brasil.

Scot Consultoria: Dentre os aspectos que podem influenciar a produção e a produtividade dos rebanhos de corte e leite estão a nutrição, o manejo, a sanidade, o ambiente e a genética. Como a senhora avalia o papel que vem sendo desempenhado pelo melhoramento genético? Ainda há muito que avançar nessa área?

Liliane Suguisawa: O melhoramento genético para peso corporal e taxa de crescimento avançou muito nos últimos quinze anos. No entanto, não observamos a mesma evolução no melhoramento das características de carcaça e carne, dado a necessidade de testes de progênie que, além de caros e trabalhosos, apresentam demora na resposta sobre o potencial de um reprodutor, pois incide diretamente no abate da progênie.

Para solucionar esta questão, a ultrassonografia se apresenta como técnica consolidada, pois a informação pode ser obtida diretamente no animal a ser selecionado. Ainda, por permitir a avaliação de um grande número de animais (machos e fêmeas), esta técnica proporciona o retorno da informação genética de um reprodutor em menor tempo e custo, quando comparado ao teste de progênie tradicional.

Hoje, os três principais programas de melhoramento genético já incorporaram as medidas de ultrassonografia em sua base de dados. PMGZ/ABCZ, Geneplus/Embrapa e Promebo/Angus possibilitam o melhoramento genético das características de carcaça e carne de maneira objetiva e complementar às características anteriormente selecionadas. Apesar dos esforços, ainda há muito a avançar nesta área, pois poucos pecuaristas têm acesso à tecnologia de ultrassonografia. Esta realidade está longe de alcançar todos os pecuaristas.

Quando as medidas de ultrassonografia fizerem parte da rotina de avaliação das fazendas de seleção, as informações geradas pelos programas de melhoramento possibilitarão, em todo cenário nacional, a melhoria da qualidade da carcaça e da carne dos reprodutores, em velocidade superior às obtidas pelas características de crescimento.

Neste momento, poderá ser fomentada a produção de animais comerciais que, no momento do abate, sejam pesados, precoces para acabamento (jovens e com gordura subcutânea para proteção do frio da câmara frigorífica e com carne macia), e com boa marmorização. Todas estas diretrizes afetarão significativamente o sistema de produção de gado de corte, pois reduzirão a idade ao abate, encurtando o ciclo pecuário e promovendo aumento da rentabilidade da propriedade, além de melhorar a qualidade e maciez da carne ofertada ao consumidor.

 

Scot Consultoria: Quais as características da carcaça bovina que podem ser medidas através da ultrassonografia?

Liliane Suguisawa: A ultrassonografia de carcaça tradicional avalia a área de olho de lombo (AOL), a espessura de gordura subcutânea (EGS) e/ou espessura de gordura subcutânea na garupa (RUMP) e marmoreio (MAR). Estas medidas fenotípicas, por apresentarem altos valores de herdabilidade, são correlacionadas ao potencial genético do animal para musculosidade (produção de carne), precocidade de acabamento (idade ao abate e proteção ao frio da câmara, garantindo a maciez da carne) e qualidade da carne (sabor e suculência).

Nossos softwares (Bia Field, Bia Pro Plus e Bia International Feedlot) avaliam também a relação AOL e EGS com o peso vivo do animal (AOL/100 kg e EGS/100 kg), possibilitando a comparação da musculosidade e precocidade potencial de animais provenientes de diferentes ambientes. Outra medida exclusiva é o ratio (relação altura x largura do contrafilé), importante por correlacionar-se ao enchimento de cortes cárneos na carcaça sem sofrer influência da idade e da alimentação. Atualmente, tanto a EGS, o MAR como o ratio são critérios fundamentais para fornecimento de cortes especiais para restaurantes de alta gastronomia.

 

Scot Consultoria: Qual uma amplitude de adoção desta prática na pecuária brasileira? Quais os principais entraves à utilização da mesma?

Liliane Suguisawa: Na pecuária brasileira, a ultrassonografia tem duas aplicações práticas: melhoramento genético e confinamento comercial.

Avaliações de carcaça por softwares de ultrassonografia (Bia Field e Bia Pro Plus) em fazendas de seleção são essenciais para a detecção dos melhores indivíduos da propriedade, para musculosidade, precocidade de acabamento e marmoreio, que em termos práticos, indica melhoramento genético para bezerros com maior potencial de ganho de peso médio diário e produção de carne; redução da idade ao abate (menor ciclo de produção) e maior suculência e sabor da carne (valor agregado).

Além disso, é possível o cálculo da eficiência dos touros utilizados para inseminação artificial, a escolha das melhores novilhas de reposição e geração das DEP (diferenças esperada na progênie) das características de carcaça e carne do rebanho.

A apartação de lotes por software de ultrassonografia (Bia International Feedlot) em confinamento comercial é fundamental para reduzir os custos com alimentação (diminuição no número de diárias de cocho), padronizar as carcaças no abate (uniformidade); eliminar o boi-ladrão (animais que não apresentam potencial de resposta à alimentação); programar antecipadamente os abates, além de diferenciar lotes quanto à qualidade da carne (acabamento e marmoreio).

Como no momento da apartação o software já prediz a data de abate e as características de carcaça de cada animal, muitas vezes detectam-se animais de alto potencial para deposição de gordura de acabamento e marmoreio, podendo ser direcionados para mercados de melhor remuneração (bonificações) pela superioridade da carcaça produzida. Por outro lado, animais que já tiverem atingido o acabamento mínimo necessário, estarão disponíveis em menor tempo e sem excesso de gordura, pois este é um processo caro para o produtor, devido ao maior gasto energético para deposição de tecido adiposo. Como as informações geradas através do software permitem a tomada de decisões importantes e maiores possibilidades de negociação, consolida-se esta como ferramenta economicamente vantajosa para execução da pecuária de precisão.

 

Scot Consultoria: A remuneração do produtor pela qualidade da carcaça apresentada é uma realidade possível. Assim, qual o papel que a ultrassonografia pode ter nesta mudança?

Liliane Suguisawa: A remuneração de carcaças por qualidade já é uma realidade, pois a cada dia há aumento das marcas de carne ofertadas nas boutiques e supermercados, cada qual criada para atender determinado nicho. Além disto, restaurantes da alta gastronomia se conscientizaram que a diferenciação de "carne" para "carne especial" atrai clientes de alto poder aquisitivo, injetando ânimo aos produtores tecnificados, mesmo que o número destes ainda seja incipiente frente ao rebanho nacional.

A utilização do software para apartação de lotes comerciais confere alta uniformidade das carcaças no abate, por padronizar os animais pela genética de resposta. Desta forma, a utilização do software para apartação dos animais pode facilitar a avaliação de padronização de carcaça solicitada pela maior parte dos sistemas de bonificação da indústria frigorífica. Além disto, através da extrapolação das informações geradas pelo software, consegue-se diferenciar lotes quanto à qualidade da carne. Com isto, animais de alto potencial para deposição de gordura de acabamento e marmoreio, podem ser mais facilmente direcionados para mercados de melhor remuneração, enquanto animais sem potencial genético para atendimento destes são apartados para o confinamento de giro rápido, produzindo a carcaça solicitada (gordura escassa) com maior rapidez e menor custo de arroba produzida.

O software permite identificar com precisão o potencial genético dos animais para atendimento das exigências de qualquer mercado de interesse. Sem o uso do software, o número de carcaças a serem desclassificadas, por não atender ao padrão de qualidade exigido pela indústria frigorífica, pode ser grande, pois tanto o peso, raça e características visuais não são indicativos precisos de que tipo de carcaça o animal irá produzir.

A identificação e escolha dos touros e matrizes são cruciais para determinar o sucesso e assertividade do confinamento voltado à produção de cortes especiais. Por exemplo: mesmo que se utilizem touros de centrais já testados (marmoreio) e que haja disponibilidade da melhor dieta, pelo maior tempo de permanência em confinamento controlado, há necessidade de escolher somente matrizes para reprodução que apresentem a característica de marmoreio superior, para que, seus produtos também apresentem o marmoreio solicitado pelos mercados mais exigentes.

Como uma única avaliação na vida do animal é suficiente para aferir o potencial genético deste para características de carcaça e carne, somente selecionando as novilhas de reposição que apresentem acabamento, marmoreio, entre outras características, para o plantel de matrizes, será possível garantir muito do aproveitamento dos bezerros da mesma forma.


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