Tarifas impostas pelos Estados Unidos podem colocar em xeque as exportações de café brasileiras.
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Os Estados Unidos são, há mais de duas décadas, um mercado consolidado para o café brasileiro, com faturamentos anuais que frequentemente ultrapassam US$700,0 milhões (figura 1). Em 2024, o país importou 453,2 mil toneladas (16,2% da exportação brasileira), gerando uma receita FOB de US$1,9 bilhão. No primeiro semestre de 2025, a exportação foi de 181,1 mil toneladas (16,3% da exportação brasileira), com faturamento de US$1,2 bilhão e preço médio de US$6,24/kg, reforçando a posição de parceiro comercial estratégico.
Figura 1.
Exportação de café para os Estados Unidos, em volume e faturamento, e preço médio (US$/kg), de 1997 até 2025, considerando café em grãos e café não torrado.
Fonte: Secex/ Elaboração: Scot Consultoria
*Até junho
No cenário brasileiro de exportação de café para os Estados Unidos, Minas Gerais é o principal fornecedor. O estado foi responsável pela exportação de 146,6 mil toneladas, resultando em um faturamento de US$953,9 milhões, ou 80,9% do total nacional. Na sequência, São Paulo ocupa a segunda posição, com 21,2 mil toneladas exportadas e uma receita de US$139,4 milhões. O volume restante, de 12,3 mil toneladas, é distribuído entre os outros estados (figura 2).
Figura 2.
Exportação de café para os Estados Unidos em 2025, em volume e faturamento, por estado, de janeiro a junho.
Fonte: Secex/ Elaboração: Scot Consultoria
Segundo dados do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA, sigla em inglês), a demanda por café tem aumentado nos Estados Unidos. Em 2024/2025 foi estimada em 25,3 milhões de sacas de 60kg, aumento em relação às 23,5 milhões de sacas importadas em 2023/2024.
Além disso, até o levantamento mais recente do USDA, prevê um aumento para 25,5 milhões de sacas de 60kg em 2025/2026, o que indicava até dados mais recentes uma expectativa de aumento na demanda por café.
Nisto, é importante considerar que a produção local é pequena: em 2024 e 2025, o país produziu cerca de 50,0 mil sacas de café, o que o torna inteiramente dependente das importações para suprir a demanda interna.
Em 2024, as importações de café pelos Estados Unidos totalizaram 1,5 milhão de toneladas. Deste volume, o Brasil foi responsável pelo fornecimento de 453,2 mil toneladas, o que representa uma fatia de 30,7% do mercado.
Para 2025, os dados mais recentes da Comissão Internacional de Comércio dos Estados Unidos (USITC) indicam que, no acumulado do ano (de janeiro a julho), as importações de café brasileiro já somam 196,6 mil toneladas.
Desta forma, fica evidente que mais de um terço do suprimento de café norte-americano pode ser comprometido pela tarifa de 50,0% anunciada, com vigência a partir de 1 de agosto, uma medida que, na prática, inviabiliza este fluxo comercial.
O mercado de café dos Estados Unidos é estruturalmente dependente das importações, sendo um consumidor relevante e um polo de processamento, onde o café brasileiro é torrado e embalado, agregando valor localmente. O Brasil é o principal fornecedor de café para os Estados Unidos (figura 3).
Figura 3.
Maiores exportadores de café para os Estados Unidos, em mil toneladas, em 2024 e 2025.
Fonte: United States International Trade Commission / Elaboração: Scot Consultoria
Considerando isto, é necessário analisar dois cenários: um de antecipação e outro de manutenção das tarifas.
No cenário de pré-implementação das tarifas, o anúncio é um fator altista. A preocupação de diferentes cadeias (especialmente nos Estados Unidos) em se antecipar ao aumento de preços e formar estoques pode causar uma pressão de demanda de curto prazo. Esse movimento de compra antecipada, visando mitigar o impacto da tarifa, tende a elevar as cotações na Bolsa de Nova York (ICE), como observado na reação imediata do mercado após o anúncio (figura 4).
Figura 4.
Preços futuros do café arábica na bolsa de Nova Iorque (NYBOT).
Fonte: ICE / Elaboração: Scot Consultoria
A manutenção da tarifa em 50,0% sobre o café brasileiro, com vigência a partir de 1 de agosto de 2025, caso venha a se concretizar, cria um cenário complexo. A medida é um fechamento de mercado, gerando um vácuo de oferta nos Estados Unidos, que como resultado dependem do Brasil para cerca de um terço de seu consumo. Esse déficit não poderia ser preenchido por concorrentes como a Colômbia — que, de acordo com a Federação Nacional dos Cafeicultores (FNC) e o USDA, enfrenta uma redução da produção para 2025/2026 superior a 1,0 milhão de sacas, ou o Vietnã, cuja produção majoritariamente de robusta é inadequada para substituir o arábica brasileiro, essencial para os blends americanos.
Como resultado, os Estados Unidos enfrentariam uma crise de abastecimento e inflação, gerando aumento do preço ao consumidor.
Com o mercado norte-americano efetivamente fechado, o Brasil precisaria redirecionar a exportação para outros parceiros como a União Europeia e a Ásia. Essa reorganização comercial, mais lenta que a oferta disponível, geraria um excesso de produto e exerceria pressão sobre as cotações fora dos EUA. O resultado provável seria a bifurcação do mercado global: preços inflacionados e escassez nos EUA, e preços em queda e excesso de oferta no resto do mundo, alterando de forma significativa os diferenciais de preço e as rotas comerciais globais
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