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Scot Consultoria

Decifrando a bioeconomia


Segunda-feira, 24 de julho de 2023 - 06h00

Alcides Torres é engenheiro agrônomo, formado pela Escola Superior de Agricultura "Luiz de Queiroz" - ESALQ, da Universidade de São Paulo, é diretor-fundador da Scot Consultoria. É analista e consultor de mercado, com atuação nas áreas de pecuária de corte, leite, grãos e insumos agropecuários. É palestrante, facilitador e moderador de eventos conectados ao agronegócio. Membro de Conselho Consultivo de empresas do setor e coordenador das ações gerais da Scot Consultoria.

Ana Paula Oliveira é Médica-veterinária, zootecnista, mestre em Produção Animal pela FMVZ Unesp e analista de mercado da Scot Consultoria.



Bioeconomia é um conceito de economia sustentável que consome recursos biológicos de forma eficiente e sustentável. Não existe um consenso para a definição de bioeconomia brasileira ou mundial, são mais de 40 definições distintas pelo mundo.

O Observatório de Conhecimento e Inovação em Bioeconomia, da Fundação Getúlio Vargas (FGV), define o conceito de bioeconomia como o estoque, uso e transformação de recursos naturais, baseado no tripé: economia, social e ambiental (Cicero Zanetti de Lima – Pesquisador).

A bioeconomia procura promover uma transição do atual modelo econômico baseado em recursos não renováveis e poluentes para um modelo que valoriza a biodiversidade e os processos biológicos. Ela busca minimizar o uso de recursos fósseis e promover a utilização de recursos renováveis, como biomassa, de maneira sustentável, passando do modelo vigente e globalizado para um “mundo verde”.

Mesmo no Brasil, não existe uma definição única e/ou exclusiva. A bioeconomia abrange diversos setores, como agricultura, pesca, silvicultura, energia renovável, indústria química, farmacêutica, biotecnologia e meio ambiente. Ela busca integrar diferentes disciplinas, como biologia, química, engenharia, economia e ciências sociais, para desenvolver soluções inovadoras que possam promover o desenvolvimento sustentável.

Alguns exemplos de aplicações da bioeconomia incluem o uso de bioplásticos derivados de fontes renováveis, como o amido de milho, a produção de biocombustíveis a partir de culturas energéticas, como o etanol de cana-de-açúcar, e o desenvolvimento de medicamentos e terapias baseados em recursos naturais.

A bioeconomia tem como objetivo principal conciliar o crescimento econômico com a preservação do meio ambiente e a promoção da sustentabilidade, visando criar um futuro sustentável e resiliente, no qual os recursos naturais sejam utilizados de forma responsável e eficiente.

Diferença entre o PIB Bioeconômico e o PIB do Agronegócio

O PIB bioeconômico é um conceito mais amplo que abrange todas as atividades econômicas relacionadas à utilização sustentável dos recursos naturais. Ele considera não apenas as atividades ligadas ao agronegócio, mas também a extração mineral, turismo e outras atividades que dependem dos recursos naturais, leva em conta não apenas a produção de bens primários, mas também os serviços e o valor agregado gerados por essas atividades.

Já o PIB do agronegócio é calculado por um setor específico (agronegócio) da economia que engloba todas as atividades relacionadas à produção, processamento, distribuição e comercialização de produtos agropecuários. Ele abrange desde a produção agrícola (cultivo de alimentos, fibras, energia renovável) até a criação de animais (pecuária), passando pelo processamento industrial desses produtos e sua distribuição para os mercados interno e externo.

O agronegócio é um dos principais pilares da economia em muitos países, especialmente aqueles com abundância de recursos naturais e uma forte base agrícola.

O PIB bioeconômico busca levar em consideração o valor econômico dos serviços ecossistêmicos, como a purificação da água, a polinização de cultivos e a regulação do clima. No entanto, a valoração exata desses serviços é complexa e subjetiva, pois nem todos os serviços ecossistêmicos têm um valor de mercado facilmente mensurável.

Além disso, pode não capturar adequadamente os custos ambientais associados às atividades econômicas. Por exemplo, a degradação ambiental, a perda de biodiversidade e a poluição podem não ser devidamente apuradas nos números do PIB, levando a uma subestimação dos impactos ambientais negativos, mantém uma ênfase significativa na medição do crescimento econômico quantitativo, que pode não refletir adequadamente o bem-estar humano e a sustentabilidade ambiental.

Fatores como qualidade de vida, equidade social, distribuição de renda e impactos sociais podem não ser totalmente considerados nessa abordagem. Também não é capturado como os estoques estão variando ao longo do tempo, por exemplo, quando ilegal, não há estoque ambiental de perda, não são considerados as variáveis de estoque, não existem métricas para isso, por isso a necessidade de estudos e definições que levem a construções de métricas.

Com isso, o Observatório de Bioeconomia, a fim de mensurar o valor econômico da bioeconomia no Brasil (PIB Bioeconômico), está desenvolvendo estudos que têm como objetivo a definição de métricas e realizaram o mapeamento setorial para compreensão e definição das atividades que têm viés bioeconômico. No qual engloba renda, emprego, variáveis econômicas, atualização sistemáticas de dados, acompanhamentos de novas tecnologias e adaptações do setor. Além do desenvolvimento sustentável do setor e aproveitamento do potencial dos biomas brasileiros e direcionamento de políticas voltadas para bioeconomia.

Nas tabelas 1 e 2, estão os setores contabilizados no cálculo do PIB Bioeconômico, em relação ao PIB do Agronegócio.

Tabela 1.
Setores considerados 100% bio-based.

Atividades SCN 2010 Nome do setor no Sistema de Contas Nacionais Classes CNAE 2.0 (4 dígitos) Bio-based Origem
0191 Agricultura, inclusive o apoio à agricultura e a pós-colheita 0111; 0113; 0114; 0115; 0116; 0119; 0121; 0122; 0131; 0132; 0133; 0134; 0135; 0139; 0141; 0142; 0161; 0163 100% Vegetal
0192 Pecuária, inclusive o apoio à pecuária 0151; 0152; 0153; 0154; 0159; 0162; 0170 100% Animal
0280 Produção florestal; pesca e aquicultura 0210; 0220; 0230; 0311; 0312; 0321; 0322 100% Extrativismo
1091 Abate e produtos de carne, inclusive os produtos do laticínio e da pesca 1011; 1012; 1013; 1020; 1051; 1052; 1053 100% Bioindústria
1092 Fabricação e refino de açúcar 1071; 1072 100% Bioindústria
1093 Outros produtos alimentares 1031; 1032; 1033; 1041; 1042; 1043; 1061; 1062; 1063; 1064; 1065; 1066; 1069; 1081; 1082; 1091; 1092; 1093; 1094; 1095; 1096; 1099 100% Bioindústria
1100 Fabricação de bebidas 1111; 1112; 1113; 1121; 1122 100% Bioindústria
1200 Fabricação de produtos do fumo 1210; 1220 100% Bioindústria
1300 Fabricação de celulose, papel e produtos de papel 1710; 1721; 1722; 1731; 1732; 1733; 1741; 1742; 1749 100% Bioindústria
1700 Fabricação de celulose, papel e produtos de papel 1710; 1721; 1722; 1731; 1732; 1733; 1741; 1742; 1749 100% Bioindústria
1992 Fabricação de biocombustíveis 1931; 1932 100% Bioindústria

Fonte: Observatório de Bioeconomia da FGV

Tabela 2.
Setores e suas parcelas bio-based que compõem a cadeia de valor da bioeconomia.

Atividades SCN 2010 Nome do setor no Sistema de Contas Nacionais Classes CNAE 2.0 (4 dígitos) Bio-based Origem
1400 Confecção de artefatos do vestuário e acessórios 1411; 1412; 1413; 1414; 1421; 1422 49% Indústria bio-based
1500 Fabricação de calçados e de artefatos de couro 1510; 1521; 1529; 1531; 1532; 1533; 1539; 1540 20%
1600 Fabricação de produtos e madeira 1610; 1621; 1622; 1623; 1629 18%
1800 Impressão e reprodução de gravações 1811; 1812; 1813; 1821; 1822; 1830 14%
1991 Refino de petróleo e coquerias 1910; 1921; 1922 9%
2093 Fabricação de produtos de limpeza, cosméticos/ perfumaria e higiene pessoal 2061; 2062; 2063 21%
2100 Fabricação de farmoquímicos e farmacêuticos 2110; 2121; 2122; 2123 7%
2200 Fabricação de produtos de borracha e de material plástico 2211; 2212; 2219; 2221; 2222; 2223; 2229 5%
3180 Fabricação de móveis e de produtos de indústrias diversas 3101; 3102; 3103; 3104; 3211; 3212; 3220; 3230; 3240; 3250; 3291; 3292; 3299 6%
3500 Energia elétrica, gás natural e outras utilidades 3511; 3512; 3513; 3514; 3520; 3530 9,45%

Fonte: Observatório de Bioeconomia da FGV

Figura 1.
Taxa de crescimento PIB-Bio x PIB-Brasil

Fonte: Observatório de Bioeconomia da FGV

Com o aumento dos custos de produção e as incertezas geradas pela pandemia e o impacto posterior, observamos deslocamentos nesses setores. É crucial ressaltar que, quando a economia se retrai, a bioeconomia tende a ser menos afetada, o que reforça a importância de monitorar esses indicadores.

Em conclusão, é essencial investir no desenvolvimento das contas econômicas ambientais e aprimorar sua construção, para integrar essas contas às tradicionais que valorizam o PIB. Isso nos fornecerá métricas adequadas para ter um controle, o que determinará se estamos verdadeiramente avançando em direção a uma economia 100% bioeconômica, ou não.

Esse esforço de integração das contas econômicas ambientais com as métricas tradicionais representa um reconhecimento do valor da biodiversidade e bioeconomia brasileira em comparação com o restante do mundo. Ao priorizarmos a sustentabilidade, estabelecemos nossos próprios padrões, em vez de adotar as métricas de outros países. Afinal, as condições brasileiras são únicas, com clima e recursos naturais distintos. Portanto, é mais confiável e apropriado que o Brasil desenvolva suas próprias métricas, alinhadas com sua realidade.


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