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Scot Consultoria

Pessimismo dos futuros


Segunda-feira, 20 de dezembro de 2010 - 11h48

Administrador de empresas pela PUC - SP, com especialização em mercados futuros, mercado físico da soja, milho, boi gordo e café, mercado spot e futuro do dólar. Editor-chefe da Carta Pecuária e pecuarista.


Algumas ocasiões toco nesse assunto, que é o espírito de época do mercado atual. É o sinal dos tempos ou, no alemão, zeitgeist, como esse termo é mais conhecido. O que é zeitgeist? Segundo o Wikipédia, é um termo alemão cuja tradução significa espírito de época, espírito do tempo ou sinal dos tempos. O zeitgeist significa, em suma, o conjunto do clima intelectual e cultural do mundo, numa certa época, ou as características genéricas de um determinado período de tempo. Aplicando esse conceito para o boi, qual é o zeitgeist do mercado do boi atualmente? Bom, a melhor forma de sentir isso é olhar para o mercado futuro. Deixe-me começar mostrando o gráfico da curva dos preços futuros. O que é a curva dos futuros? É a organização em um gráfico de todos os vencimentos dos contratos futuros sendo negociados atualmente na bolsa. Isso dá para a gente uma idéia do que o mercado está esperando para os preços em 2011. Daqui para baixo é só uma descrição do estudo que fiz sobre os preços e a discrepância entre o físico e os futuros no passar dos anos. Bom, não sei o que você acha. Para mim esse tipo de gráfico quer dizer, no mínimo, que o mercado não está otimista para 2011. Observe a queda nos vencimentos. O mercado futuro está esperando uma queda forte de agora até a safra de 2011. Nem vamos falar da entressafra, ok? Daí quando a gente coloca uma lupa nesse gráfico e olha os detalhes sórdidos da coisa, a história fica ainda mais interessante. Repare a queda entre o indicador de hoje e o contrato de janeiro. Fiz as contas — é uma queda ao redor de 7%. Vamos focar somente no contrato de janeiro, ok? O discurso nos contratos de fevereiro e março são parecidos. Poxa, Rogério, e daí? Aonde você está querendo chegar? É simples, caro leitor. Tenho aqui um pequeno controle de todos os contratos futuros desde 1994. Quero dizer com isso que tenho todos os fechamentos de todos os contratos desde 1994, e isso nos dá humildemente uma perspectiva de longo prazo que nos ajuda a responder a seguinte pergunta. O que aconteceu nessa mesma época do ano, nos anos anteriores? Bom, gastei uns bons 10 minutos para achar a resposta. Essa época atual é o segundo momento mais pessimista do mercado futuro para o contrato de janeiro desde que o indicador começou em 1994. Isso quer dizer que, se você esperaria que o mercado estivesse pessimista, como o pessoal vem falando ultimamente sobre o que poderá acontecer em janeiro, ele de fato está super pessimista para o início do ano que vem. Mas a história fica ainda mais interessante à medida que a gente aprofunda na análise. Veja você, caro leitor, como são as coisas. De um lado temos as apostas do mercado futuro e a conversa dos analistas. De outro, temos a realidade do que concretamente ocorreu nos anos passados. Ou seja, uma coisa é o que o mercado futuro acha; outra é o que o mercado físico fez. O mercado futuro achou, em média, que dessa época no final do ano até o final de janeiro seguinte a arroba teria uma queda de 3% sobre o preço atual. Entendeu? O mercado futuro esperava uma queda de hoje até janeiro. Mas, surpresa! Na realidade o mercado físico não fez nada disso e subiu, em média, nesse período, 3%. Ou seja, de –3% que era a expectativa do mercado futuro, o mercado fez o contrário e cravou +3% no período. Um erro de 6%, certo? Como disse no início, a expectativa do mercado futuro atualmente é uma queda de 7% até o final de janeiro/11. Na história dos contratos dos janeiros passados essa é a segunda maior expectativa de queda. A pior foi em 2007 para o contrato de janeiro de 2008, queda de 9%. Puxa vida. Queda de 9%? O mercado devia estar enxergando alguma coisa importante, alguma oferta enorme de gado, alguma informação para uma queda tão forte em tão pouco tempo, não é mesmo? Estava nada, caro leitor! O mercado físico fechou com alta de 11% no final de janeiro. Na pior expectativa de queda na bolsa, com o mercado na certeza de queda forte, veio o maior fiasco. O erro foram enormes 20% na precificação. Acho ótimas essas coisas. Nos mostra o que se deve saber e seguir sobre mercado. Nos mostra que o mercado não é perfeito. Ele está ali para nos servir, e não para nos ditar o que fazer. Ele está ali para nos servir no sentido em que aparecem situações dos preços meio que saem fora de sintonia com a realidade. Nesses momentos você deve olhar para o mercado futuro como um meio e não como um fim em sua análise. Mais como um instrumento, não como objetivo. Somos nós que devemos fazer as contas do que esperamos dos preços, e não seguir o mercado futuro e apenas as cotações do mercado futuro, pois elas podem nos indicar um caminho que pode não ser um caminho certo, naquele momento. Então, exatamente agora o mercado futuro está dizendo que haverá uma queda de 7% na arroba entre agora e o final de janeiro. Haverá mesmo? Pode ser, caro leitor. Tudo tem a sua primeira vez. Posso queimar a língua aqui. Mas, me acompanhe. Olhe para o que aconteceu com o mercado nesse segundo semestre e pergunte a si mesmo se o mercado virou definitivamente baixista. O mercado consumidor deixou de consumir? A produção de carne aumentou bruscamente nesse período? As escalas de abate aumentaram explicitamente nesse tempo? Não sei qual a sua opinião, mas a história nos diz que o zeitgeist do mercado futuro esses dias aqui em meados de dezembro está precisando ir ao oftalmologista para uma correção do grau. É miopia. Faz anos que ele vem precisando trocar de óculos olhando ao olhar o futuro próximo e trocando B por O. Ah, mas rapidamente um espertinho pode levantar a mão e dizer: “Essa diferença ou desatenção ou falta de foco com os contratos é porque ninguém está olhando além do contrato de dezembro agora, Rogério. O pessoal está mais preocupado com o mês presente.” Pode ser verdade. Aliás, acho que há um forte componente disso daí sim. Mas para isso eu respondo. As oportunidades só aparecem nos lugares em que ninguém está olhando e quando a sua lente está corretamente ajustada para enxergá-las. Mas, como diz Caetano, para confundir ainda mais. “Ou não.”
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