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Scot Consultoria

Ciclo pecuário


Segunda-feira, 6 de setembro de 2010 - 15h03

Administrador de empresas pela PUC - SP, com especialização em mercados futuros, mercado físico da soja, milho, boi gordo e café, mercado spot e futuro do dólar. Editor-chefe da Carta Pecuária e pecuarista.


Esta semana me vi pensando bastante sobre o ciclo pecuário. O que ele significa para nós? Qual a sua importância? Algumas vezes tenho essa necessidade de voltar ao básico, de olhar novamente os fundamentos, os pilares da nossa atividade. Sem conhecer os fundamentos que guiam o nosso negócio, como ter segurança em se precaver e se preparar para o futuro? Obviamente muito do que a gente escreve aqui toca em passagem pelo ciclo do boi, sempre para complementar algum outro argumento que na hora estamos formulando. Mas ciclo pecuário? Já tinha escrito algo sobre isso, e lembrei! Já tinha feito a pesquisa para embasar a teoria que gira ao redor das expectativas de oscilação do ciclo pecuário. Curiosamente escrevi o texto há um ano. Que coincidência pensar sobre o ciclo pecuário nessa mesma época. Todos nós já sabemos que o ciclo é o acompanhamento do mercado de fêmeas, em primeiro lugar, do bezerro, em segundo lugar, e do boi, por último. Quem manda no boi é a vaca, costumo dizer. Mas não acredite no que digo. Vamos a três definições do que é o ciclo pecuário feita pelos americanos. Primeiro a definição do professor James Mintert, da Universidade do Kansas. A história do negócio de gado tem sido uma de ciclos de produtores de bezerro ampliando estoques em resposta aos lucros e, em última análise, a contração do tamanho do seu rebanho em resposta a perdas. Enquanto na história não há dois ciclos exatamente os mesmos, há um número de padrões repetitivos que ocorrem em ciclos que podem ser usados para julgar onde estamos e para onde estamos caminhando dentro de um determinado ciclo de gado. Uma segunda opinião? Essa é do Serviço de Pesquisa Econômica do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA). O ciclo de gado dura cerca de 10 a 12 anos. É constituído por cerca de 6 a 7 anos de expansão do efetivo bovino, geralmente seguido por 1 a 2 anos em que os números bovinos são consolidados, em seguida, 3 a 4 anos de declínio do número antes da nova expansão começar. (...) Flutuações cíclicas do número de cabeças nos Estados Unidos têm sido observadas desde, pelo menos, 1867. Essa terceira definição vem até nós da Universidade de Chicago, do Serviço Nacional de Pesquisa Econômica. Estoques de gado bovino dos Estados Unidos estão entre os mais periódicos da série temporal em economia. A teoria dos ciclos pecuários é calculada, com base em decisões racionais de inventário de matrizes, na presença de gestação e retardamento da maturação entre produção e consumo. As baixas taxas de fertilidade das vacas e as substanciais defasagens entre a fertilidade e as decisões de consumo fazem com que a estrutura demográfica da população do rebanho responda a choques exógenos na demanda por carne bovina e aos custos de produção. Então veja você, caro leitor, como são as coisas. Passados dois mil e dez anos desde a morte e ressurreição de Cristo, cá estamos, negociando, apartando, refugando, comprando e vendendo gado como os romanos faziam. A gente negocia gado da mesma forma que os egípcios faziam mil anos antes dos romanos! Desde lá de trás, no império romano ou no Egito, ou na época do descobrimento do Brasil ou tão próximo quanto 50 anos atrás, gado era moeda. Era, tal como hoje, moeda forte. O ciclo pecuário é o acompanhamento do abate e retenção de fêmeas. Essas duas ondas geram choques distintos na cadeia pecuária. Quando a onda é de retenção, o choque é a diminuição na oferta de bezerros e consequentemente valorização da arroba do boi. Quando a onda é de aumento no abate de fêmeas, o choque se dá via aumento na oferta de bezerros e uma queda na valorização da arroba. Buscar entender aonde estamos nessas duas forças, onde nos localizamos no tempo do abate ou da retenção é buscar saber o que poderá ocorrer para frente com os preços e com a quantidade de animais, bezerros, vacas e bois. É esse tipo de raciocínio, esse tipo de mentalidade que tento mostrar aqui toda semana. Os preços do boi sobem e descem mediante a evolução dessas forças. Isso me leva a pensar em outra coisa paralela. Produtividade é hoje em dia não mais uma atitude de bom-senso ou de necessidade que o produtor naturalmente fazendo dentro de sua propriedade, mas um produto empacotado e embalado para ser vendido. Tal qual qualquer produto, ele precisa ser anunciado e o pessoal tem que acreditar que ele é importante. É mais ou menos nessa linha que enquadro como se tenta explicar a teoria pela qual essas forças de preço de longo prazo são definidas pela produtividade do abate dos animais gordos ou pela velocidade do abate. Só estou falando de abate aqui, como se o abate fosse a parte mais importante da pecuária. Sabemos que não é. O poder de oferta de animais novos em escala geométrica de um ciclo de retenção de fêmeas como esse que tivemos nesses últimos anos eclipsa qualquer aumento linear de produtividade em qualquer fazenda de engorda. Então, a minha visão de pecuária e do ciclo do boi é a mesma dessas universidades americanas. Não é a produtividade quem define o ciclo pecuário, nem os preços da arroba do boi ou da vaca e nem, consequentemente, a taxa de reposição entre o boi e o bezerro. Isso daí está muito mais ligado ao abate de fêmeas e a oferta de bezerros daquele momento específico e, principalmente, friso, principalmente ao momento econômico ao qual o país está vivendo ao redor daqueles anos. Lembre-se do que disse antes: boi é moeda. A taxa de reposição, por exemplo, sobe em períodos inflacionários. Em períodos sem inflação (como o atual), a taxa média cai. Então, aonde estamos no ciclo pecuário atual? A melhor forma é olhar para os gráficos. Vamos lá. Abaixo temos o principal medidor do ciclo, o abate de fêmeas. Observe que ainda está havendo retenção de fêmeas — seus abates anuais estão próximos a zero e estão vindo de dois anos de diminuição pura e simples. A principal consequência dessa retenção de fêmeas é a diminuição na importância delas nos abates, como a gente pode ver acima. Isso é que gera a grande valorização da arroba dos machos no longo prazo e isso daí é mais importante que o aquecimento da economia para fazer subir a arroba. A economia dá as cartas no curto prazo, mas é a oscilação do abate de fêmeas quem muda o patamar de preço. É o que os frigoríficos já sabem. O balizador da pecuária é a oferta, não a demanda. Tanto é que os preços hoje, ajustados pela inflação, estão em um momento historicamente excelente. Observe no gráfico. Acho que já coloquei esse gráfico umas 20 vezes ultimamente. É porque ele é realmente importante, caro leitor. Hoje você consegue trabalhar seus animais nos melhores patamares de preço desde o início do plano real. Isso não é pouca coisa. Não é mesmo. É hora de aproveitar a oportunidade, tanto para 2010, quanto, se possível, para 2011. Por que falo de 2011 aqui? Primeiro por que 2010 já está acabando, se você aproveitou esses preços para vender seus animais desse ano. Em segundo lugar que para 2011 também a bolsa está mostrando bons preços. A razão desse raciocínio é simples. Já que estamos passando pelo final do período de retenção de fêmeas, o abate delas já começou a aumentar (elas não cabem mais nos pastos!). Só que tem muita vaca por aí, e esse estoque está gerando uma maior quantidade de bezerros desde 2007. É só fazer as contas. 2007 mais três ou quatro anos entre a bezerra virar novilha, entourar e desmamar a cria chegamos em 2010 e 2011. Esses bezerros estão começando a chegar ao mercado. Este ano já deu para sentir um pouquinho dessa nova oferta, mas como essas coisas tomam tempo é a partir de 2011 que a coisa será mais nítida sob o ponto de vista do invernista. Então, como disse desde o início do ano, sou otimista para 2010, mas para 2011 já quero jogar um jogo mais seguro. Escrevi isso daqui sobre 2011 porque senti ultimamente entre o pessoal com quem converso a idéia que 2011 será melhor que 2010. Em bom português, o pessoal está falando que em 2011 a arroba vai explodir, baseado no que temos hoje de mercado. Será? Não sei. Penso que muito do que será 2011 depende do que acontecerá com o mercado até o final de 2010. Até agora estamos passando por uma entressafra típica, com preços dentro do esperado historicamente para essa fase do ciclo pecuário, ou seja, o mercado está dentro da oscilação que ele deveria estar. Será 2011 um ano fora da curva, atípico, para cima? Posso estar errado, mas ainda não focalizei 2011 direitinho dessa maneira. Com base no que falei aqui hoje sobre ciclo pecuário, não consigo enxergar esse otimismo todo, principalmente se a inflação voltar a acelerar, como parece que está ocorrendo ultimamente.
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