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Scot Consultoria

Depois das trevas...


Segunda-feira, 16 de novembro de 2009 - 17h09

Administrador de empresas pela PUC - SP, com especialização em mercados futuros, mercado físico da soja, milho, boi gordo e café, mercado spot e futuro do dólar. Editor-chefe da Carta Pecuária e pecuarista.


Para onde você olhar, a sensação é de desconforto. Não que a coisa toda esteja errada, não é bem assim. O mercado não é feito para satisfazer nossas vontades. Mas a coisa pressiona, e pressiona, e pressiona, e eu me pergunto. O que é está acontecendo? No último mês as escalas de abate avançaram bastante. A idéia de escala de abate avançando é um indicativo de oferta, e bota oferta nisso! Fazia anos que não tínhamos um horizonte de animais como vem ocorrendo. Observe o gráfico 01. Chame isso de efeito chuva, de confinamentos, de boi de pasto, do cara vendendo para repor, vendendo para pagar as contas, chame do que você achar que veste melhor à situação. Não sei qual a razão das vendas, é impossível saber, dada a magnitude e complexidade do mercado pecuário. Mas dá para a gente perceber as consequências desse movimento. É que nem você andar nesses carros mais modernos. Você pode estar na estrada correndo, mas a sensação é outra. O carro parece que está parado. É impressionante o conforto. Você só acredita que está naquela velocidade porque olha para o velocímetro. O nosso caso na pecuária é o mesmo, caro leitor. A gente não consegue enxergar o mercado de frente. Só podemos observar os seus velocímetros, os seus indicadores, as suas tendências. E meu compadre, minha comadre, como a pecuária tem desses indicadores! Tem para todo gosto! Olha só, hoje em dia os que mais uso são o preço à vista da arroba, o ciclo pecuário, a taxa de reposição, a arbitragem arroba/ouro, a razão do preço da arroba VS sua média de curto-prazo e nossos dados relativos ao custo da operação de engorda das fazendas. Não irei colocá-los aqui, mas acredite — todos estão baixos, historicamente falando. Ou seja, para onde quer que você olhe, a arroba está pressionada. Agora fica interessante. Na última semana a coisa se pressionou mais ainda. Essa queda já se tornou a maior do plano real até agora. Sim, caro leitor, estamos passando pela pior queda da arroba desde que o Real entrou em circulação em 1994. Não é pouca coisa. Existe uma luz no fim do túnel nessa história? Por mais difícil que seja enxergar algo positivo na situação atual, sim, dá para se tornar otimista à medida em que o mercado vai caindo. Você não leu errado. Quanto mais a arroba cai, mais otimista vou ficando. É porque existem duas coisas que estão escritas na pedra, caro leitor. Uma é em mercado financeiro — os preços oscilam. A oscilação é para baixo... e para cima. A outra é em commodities — os preços agrícolas não caem por muito tempo abaixo dos custos do produtor mais eficiente. O produtor tende a reduzir sua produção no prejuízo. Isso quer dizer que agora estamos passando por essa pressão de baixa nos últimos ano e meio, porém quando a coisa virar — e vai virar, só não sabemos quando — a pressão de alta será praticamente a mesma, ou até mais intensa que a força que está levando os preços para baixo enquanto falamos. Essa é a razão pela qual a venda na atual conjuntura, principalmente a venda nos mercados futuros, não é recomendável de jeito nenhum. Está arriscado demais. Demais! Para o meu entendimento e para a minha tolerância à risco, não entraria nesse barco agora. Por quê? Ora, já está embutida uma forte desvalorização dos preços em relação à inflação nos contratos futuros de 2010. Na atual curva de preços do mercado futuro, os preços da arroba nos informam que a arroba estará sendo negociada com um desconto de 10% sobre a inflação. Observe a tabela 01. A inflação come o valor da arroba, então é por isso que mesmo o mercado futuro apostando na estabilidade a coisa só vai piorando. Observe os contratos de maio, junho e outubro de 2010. Os três estão com uma arroba beliscando um desconto de 10% da arroba sobre a inflação. Hei, isso é uma excelente notícia! Para o produtor? Não. Para o elo seguinte da cadeia, para os frigoríficos adiante. Quem é que não gostaria comprar carne barata? Isso significa carne mais em conta ano que vem no atacado e, se levarmos em consideração que o mercado está se aquecendo, então haverá maior consumo. Maior consumo, maior abate. Agora vem a pergunta. Perceba a sutileza e a ironia, caro leitor. Pare um pouco o raciocínio e pondere comigo. Há nesse horizonte de preços do mercado futuro um estímulo ao aumento da produção de boi gordo ano que vem? Há um estímulo ao confinamento? Hum... Não sei se consegui me fazer claro aqui, mas a economia ano que vem está se desenhando altista e temos hoje um mercado futuro da pecuária em seu nível mais baixista de muitos, muitos anos. Lembre-se que a carne é extremamente sensível aos níveis de renda da população. Com a economia crescendo, temos um aumento da renda e do emprego dessa mesma população. É no mínimo interessante notar a discrepância entre a realidade do país e a aposta do mercado futuro. Isso para mim não está certo. O Tico e o Teco aqui se colidem quando tentam entender a razão de tanto pessimismo com a pecuária. Posso estar errado. Como me disse na semana passada um corretor de mercado futuro de boi, “O mercado está sabendo de algo que não estou conseguindo descobrir o que é. Estou achando que sou o pato dessa história.” Pode ser que sim, podemos todos estar dando uma de patos desta história, mas o que vejo não é isso. Vejo é uma tremenda oportunidade. Há tempos o mercado futuro não abria o seu flanco dessa maneira. Mas e o mercado físico, Rogério, vai continuar a cair? Não sei, caro leitor. Não sou bom em analisar o curto-prazo. Como disse no início, as escalas de abate estão muito elevadas, mas tenho minhas dúvidas se conseguirá se manter assim para sempre. “A noite é mais escura e fria no limiar da alvorada”, diz o ditado, e está implícito aqui para a gente agüentar esse momento de pessimismo, pois isso também vai passar. Isso é uma boa notícia, não é?
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