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Scot Consultoria

Duas perguntas!


Terça-feira, 28 de março de 2006 - 21h03

Administrador de empresas pela PUC - SP, com especialização em mercados futuros, mercado físico da soja, milho, boi gordo e café, mercado spot e futuro do dólar. Editor-chefe da Carta Pecuária e pecuarista.


Rogério Goulart Este é um texto com um forte viés de produtor. Duas perguntas que sempre fiz quando era mais novo e nunca ninguém me deu uma resposta suficientemente boa. “Quantos bois cabem nesse pasto?” Quando era mais novo, ao olhar para os bois no pasto, ficava maravilhado com a capacidade do capataz. Ao ser perguntado quantos bois cabiam naquele pasto, ele parava, olhava profundamente para a área e, com a devida pausa para meditação, respondia: “cabem 80 bois”. Nossa! Era demais! Que inteligência, que visão! Que besta que eu era. Aquilo era um chute, nada mais, e iria ser corrigido quando o pasto começasse a baixar (e jogar fora o investimento em capim) ou, se estivesse sobrando, iria colocar mais animais para dar conta de pastar. Veja bem, não estou dizendo que não dê para dizer quantos animais cabem naquele pasto, lógico que dá. O peão que está lá por bastante tempo também não é bobo – ele já testou várias quantidades de animais e chegou a uma quantidade que aos olhos dele sejam apropriados quanto ao consumo do capim e ao aspecto geral do pasto. Mas isso se adquire com a experiência na mesma área, e não na primeira visita à fazenda, sem saber o tamanho do pasto e sem saber o histórico do capim e da análise do solo. É por isso que sou fã de como se faz hoje, e esse é um conhecimento vindo das universidades e dos centros de pesquisa. É mais fácil, rápido e objetivo. Quer saber quantos animais cabem na área? Primeiro colhe-se o capim para medir sua massa e obtêm-se quantos quilos de capim disponível no total temos no pasto. A partir daí, sabendo que tipo de animal se quer colocar, pode-se estimar o consumo desse animal, e então uma continha simples de dividir nos dá quantos animais cabem naquela área para esses próximos 30 dias que é, no modo geral, o prazo de renovação do capim. A beleza nisso é tirar da cabeça do dono da fazenda ou desse peão experiente o conhecimento e o transferir para a rotina da fazenda. Depois de ensinado qualquer funcionário pode fazer, e se delega para eles a obrigação de fazer esse serviço rotineiramente. Mas o que o fazendeiro vai fazer, então? Vai cuidar do seu negócio, ora. É de sua competência estabelecer a lotação máxima da fazenda como um todo, e não dos pastos individualmente. Se na fazenda cabe 1.000 cabeças e ele só tem lá 800 é óbvio que os pastos ficarão folgados. O negócio do proprietário é saber comprar, saber engordar e saber vender. É saber lucrar no que faz, e fazer isso bem. O controle da lotação é fundamental nesse aspecto de saber engordar. Em regime de pasto apenas, como é na grande maioria dos fazendeiros, esse pequeno detalhe faz toda a diferença. Uma lotação menor facilita o manejo, a engorda, o controle de pragas, reduz a quantidade de funcionários e diminui o gasto financeiro com sal, ração e medicamentos; por outro lado, aumenta o custo unitário por cabeça que, a meu ver, é compensado com o maior ganho de peso e a maior rotatividade do rebanho. Mas reduzir a capacidade da fazenda para quantas cabeças? Essa pergunta não tem resposta simples, pois cada região é de um jeito. Diria que o sistema dos antigos de “o capim tem que estar acima das canelas do boi para ele engordar” e “deixar sempre um pasto vazio” é um bom começo. Deixar o capim acima das canelas do boi é uma tarefa de três passos: - Saber qual a estação do ano que se encontra – se for verão, o pasto caberá mais; no inverno é necessário reduzir a carga (isso provavelmente no primeiro e segundo ano, adiante, tendo o pasto melhorado, pode-se manter a carga o ano inteiro); - Ter conhecimento de quantos hectares tem o pasto através de medição (e não por olhômetro), e; - Definir a capacidade de suporte do jeito que coloquei no começo desse texto, que pode começar, a título de exemplo para pastos bons entre 0,7 a 1,0 U.A. por ha; pastos mais fracos entre 0,3 e 0,5 U.A. por ha. U.A. é a abreviação de Unidade Animal, que corresponde a um animal de 450 kg de peso vivo. Só uma ressalva: se forem pastos muito bons, mas muito bons mesmo, até que se poderia definir a capacidade em acima de 1,0 (como 1,2; 1,5; 1,8 até 2,0 U.A. por ha), mas em condições normais de fazenda uma lotação dessas só acontece quanto o pasto é uma formação nova sem adubação; quando em anos de muita chuva em terra boa e quando há a correção do solo e adubação. Mesmo assim, mesmo nessas condições excepcionais é razoável se dizer que no ano seguinte o pasto não conseguirá manter a mesma carga de bois se não for feito investimento em adubação de manutenção. Com uma carga reduzida de bois se consegue exatamente isso – manter o pasto produtivo por muito mais tempo do que quando se utiliza todo o seu potencial no curto-prazo. Afinal de contas quero manter os pastos produtivos e bonitos por cinco, sete anos pelo menos, e não por três anos. Por favor, considere essas informações como inspiração, e não como manual de como fazer em sua propriedade. Cada lugar é de um jeito e obedece a um regime da natureza. Essas são sugestões que foram formadas em nossas propriedades, tanto no MS quanto no TO, e que foram evoluindo com o passar dos anos para engorda de bois. Não sei se funcionariam para uma fazenda de cria ou de recria. O que importa para nós é que conseguimos aumentar a rotatividade do rebanho no MS para ao redor de 80% a 120% do rebanho por ano (onde esse sistema está funcionando por mais tempo e os pastos são adubados) e no TO estamos conseguindo esse ano uma rotatividade de 40%; para ano que vem é esperada uma rotatividade de 60% a 70% do rebanho. “Quanto custa um boi gordo?” Outra coisa que quando eu era mais novo batia a cabeça, mas não sabia como fazer: cálculo de custo de um boi gordo (ou de uma arroba, sendo que para isso basta dividir o custo do boi pelo seu peso). Nossa! Como era difícil. A gente já tinha os custos da fazenda por causa da contabilidade, mas como transformar esses dados em informações? Nessa hora dava um nó na cabeça; tudo ficava nebuloso, cercado de dúvidas. Resultado: nem sabíamos por onde começar. Com o passar do tempo vimos que o buraco era mais embaixo. Antes mesmo de saber os custos era preciso ter o controle do rebanho, mas não o controle numérico puro e simples; tínhamos que ter o controle financeiro do rebanho, assim: preço, idade, peso, frete e comissão de compra. Esses dados eram jogados numa planilha e daí adiante que vinha o controle de custos. O controle de custo que fazemos não é o melhor, é claro, mas para nossa realidade é bastante útil e fácil de fazer. Assim ó: somamos quanto as fazendas gastaram no mês em tudo que envolvem os seus dia-a-dias: sal, ração, vacinas, medicamentos, funcionários, energia, impostos, manutenção de máquinas, cercas, currais, sede e casa dos peões, etc. Sei lá, cada um tem seus gastos. O importante é somar tudo. Por exemplo, vamos supor que em fevereiro o custo total foi de R$11 mil, e o total de animais na fazenda for de 2,3 mil cabeças, então o custo por cabeça em fevereiro foi de R$4,78/ cabeça (R$ 11.000 ÷ 2.300). Esses R$4,78 é o custo que entra na planilha que falei acima, do financeiro do rebanho. Em fevereiro coloco lá esse valor que se soma ao que tinha sido colocado em janeiro, dezembro... e para frente também, até o abate daquele lote. Mas qual lote sabemos que está sendo abatido agora? Os lotes abatidos seguem a regra “os bois com mais tempo dentro da fazenda e mais erados tem prioridade”. Com o passar dos anos trabalhando dessa forma é gerada dentro da planilha uma tendência, um índice de custos que varia racionalmente com o passar do tempo. Esse é o índice de custos mensal do negócio, e é esse índice que utilizo como base para o cálculo de custo futuro dos bois de reposição. Claro, sendo conservador, sempre pioro um pouco o índice a fim de me indicar um aumento nos custos. É por isso que saber a capacidade produtiva e quanto custa os animais é necessário ANTES que se comece a pensar em mexer com bolsa. É o mesmo que pegar um trator para operar sem saber como ele funciona; é entrar no mato sem cachorro e montar num cavalo sem saber se ele é manso. Pode dar certo, mas as chances estão contra você. Essas duas perguntas, “quantos bois cabem no pasto” e “quanto custa um boi gordo” são básicas para uma pecuária que quer se manter produtiva, saudável e lucrativa. Tivemos que correr atrás das respostas; em nenhum momento nos foi dado de bandeja esse conhecimento. É por isso que esse texto é íntimo e pessoal para mim, e uma das mais importantes que escrevi. Espero que ajude.
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