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Scot Consultoria

Hemisfério Ocidental é a solução


Terça-feira, 11 de julho de 2006 - 18h30

Engenheiro agrônomo formado pela ESALQ-USP, com doutorado pela Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da USP. Desde julho de 2003 é Diretor Geral do Instituto de Estudos do Comércio e Negociações Internacionais (ICONE).


por marcos s. jank As exportações brasileiras cresceram 9,3% ao ano desde 1996 e, nos últimos cinco, anos essa taxa atingiu 21% ao ano. O bom desempenho recente deriva do forte crescimento da demanda mundial, da taxa de câmbio desvalorizada até o ano passado e do baixo crescimento interno, que estimulou as empresas a buscarem oportunidades lá fora. O boom recente das exportações tem motivado a produção de estudos que procuram analisar o impacto dos preços e das quantidades no valor exportado e os novos vetores da nossa inserção mundial. Na semana passada, Sidney Nakahodo e eu concluímos o estudo A nova dinâmica das exportações brasileiras: preços, quantidades e destinos (disponível em www.iconebrasil.org.br), no qual procuramos traçar uma radiografia da pauta comercial nos últimos dez anos. Utilizando as classificações de mercadorias da OCDE e da Unctad, dividimos a pauta exportadora em quatro categorias de produtos diferenciados - alta tecnologia (7% das exportações), média-alta (25%), média-baixa (13%) e baixa tecnologia (8%) - e três categorias de commodities: agronegócio (31%), minerais (10%) e combustíveis (6%). Ao mesmo tempo, analisamos cinco regiões como destino das exportações: América Latina (23%), União Européia (22%), EUA (20%), Ásia (15%) e outros (20%). A pesquisa confirma que as exportações brasileiras crescem puxadas mais pelas quantidades demandadas que pelos preços. Com exceção de uns poucos produtos de alta tecnologia, combustíveis (petróleo, álcool e derivados), ferro e aço, em todos os demais segmentos o fator que melhor explica o crescimento do valor das exportações são os volumes exportados, com uma clara diversificação em termos de produtos e destinos. A análise do destino das exportações confirma antigas percepções dos estudiosos. Costuma-se dizer que o Brasil é um "global trader" no comércio internacional, já que nossa pauta é relativamente bem distribuída em termos geográficos. Porém, quando observamos o comportamento das sete categorias de produtos, vemos que o Brasil é "global" apenas em commodities, que crescem em todas as direções, mas nos produtos diferenciados somos apenas um "regional trader". Ocorre que, ao observarmos o conjunto da pauta exportadora, nossas exportações mostram surpreendente dinamismo na direção da América Latina e dos EUA. Nosso comércio hemisférico acumulava um déficit de US$ 4,2 bilhões com os países americanos, em 1996. No ano passado atingimos um superávit de mais de US$ 25 bilhões. Todas as categorias de produtos crescem, mas chama a atenção o ótimo desempenho dos produtos diferenciados, que responderam por 87% do saldo positivo em 2005, com destaque para automóveis, máquinas, celulares e aeronaves. Já no caso da Europa, nossas exportações mostram baixo dinamismo, com algum crescimento das exportações do agronegócio, acompanhado de um déficit crônico nos produtos de maior tecnologia, que se mantém inalterado nos últimos dez anos. A mudança mais importante ocorre no padrão de comércio com a Ásia. Aqui, o crescente saldo comercial do agronegócio e dos minérios é contrabalançado por déficits cada vez mais expressivos no grupo de produtos de alta e média-alta tecnologia. Os dados indicam que o déficit com os países emergentes tende a crescer mais do que com o mundo desenvolvido, um fato que deveria servir para afastar o temor infundado de parte da indústria com a integração com as Américas e a Europa. A concorrência da China tende a ser muito mais agressiva, para o Brasil, do que a dos EUA e da União Européia, aqui e lá fora. O resto do mundo tem menor importância para o País, já que o grosso do comércio se concentra em exportações de commodities agropecuárias e importações de petróleo. Os embarques para a África são irrisórios e o quadro dificilmente se vai alterar, a despeito da obstinação diplomática com o comércio com os países mais pobres. A conclusão do estudo é que a orientação prioritária da política comercial brasileira não deveria ser "Norte-Sul" ou "Sul-Sul", mas sim "Oeste-Oeste", qual seja, voltada para nossos vizinhos latinos e anglo-saxônicos. É no chamado Hemisfério Ocidental - que compreende as Américas do Norte, Central e do Sul - que observamos o real dinamismo no comércio exterior brasileiro, e não na velha dicotomia do planeta estabelecida no final da era colonial e que hoje perde completamente o sentido prático. Portanto, a análise do saldo comercial brasileiro por destino confirma o acerto da política comercial da década passada, que priorizou a integração dos 34 países da Área de Livre Comércio das Américas (Alca), hoje moribunda. A falta de vontade política dos governos e as resistências de certos grupos de interesse - indústrias protegidas, sindicatos, Igreja, grupos de esquerda e ambientalistas - jogaram uma pá de cal no processo de integração. O acordo da Alca morreu sem nunca ter nascido, no final de 2003, com mais de 7 mil colchetes ainda por serem retirados e uma nítida falta de liderança dos co-presidentes, EUA e Brasil. A Alca foi substituída por uma dezena de acordos de pequena envergadura entre os EUA e países pequenos da Costa do Pacífico e também por blocos regionais com um crescente risco de esfacelamento, como o Mercosul e a Comunidade Andina. Ao mesmo tempo, a diplomacia brasileira apostou numa integração sul-americana que se mostra cada vez mais complicada, ante a ascensão de líderes com visões políticas opostas como Chávez, Morales e Kirchner, de um lado, e Bachelet, Uribe e García, do outro. A prioridade central da política comercial deveria ser o comércio. Muito poderia ser feito nesse sentido se os governos se preocupassem um pouco menos com ideologias e novas geografias e um pouco mais com a melhoria do ambiente institucional para facilitar a vida das empresas.
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