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Scot Consultoria

Uma nova safra de laranja em gestação


Quinta-feira, 23 de dezembro de 2010 - 09h38

Para quem não conhece esta não é uma boa época do ano para se visitar uma fazenda de laranja de porte comercial em São Paulo. Vistas do alto, as fileiras do exército de árvores desta propriedade localizada em Analândia, na região de São Carlos, estão totalmente verdes. Aqui, e na citricultura paulista em geral, os últimos vestígios alaranjados sumiram no segundo trimestre do ano, quando terminou a colheita do ano-agrícola 2009/10. Há pouco movimento nas quadras de árvores que se multiplicam como um grande tabuleiro de xadrez. Não há colhedores mascarados. O silêncio prevalece. E chove. Neste dezembro chove muito, todos os dias, acima da média. E, no entanto, tudo não poderia estar melhor. O mesmo clima propício a uma sessão de filmes na televisão está favorável aos pomares. Na Fazenda Santa Maria, a pouco mais de duas horas de carro da capital de São Paulo, a primeira florada da temporada atual, a 2010/11, veio a contento da Cutrale, que arrenda a propriedade desde 2002. Não fosse a doença conhecida como greening, maior ameaça fitossanitária à produção de laranja deste início de novo milênio, estaria tudo ótimo na unidade em Analândia. Pouco maiores que bolinhas de gude, as laranjas, verdinhas, enchem os galhos da propriedade-modelo. A Santa Maria é uma das cinco fazendas escolhidas pela Cutrale para serem auditadas pela Ernst&Young em uma tentativa de demonstrar transparência nas negociações com os fornecedores independentes de matéria-prima. Maior exportadora de suco de laranja do mundo, a Cutrale conta com 40 fazendas nos principais polos paulistas, mas compra cerca de 60% de sua demanda total pela fruta de citricultores independentes, por meio de contratos de fornecimento com prazos a partir de um ano ou no mercado spot. A empresa lidera o grupo das quatro grandes indústrias de suco radicadas em São Paulo - as outras são as brasileiras Citrosuco e Citrovita, em processo de fusão, e a francesa Louis Dreyfus, que administra o negócio a partir do Brasil - nas conversas com citricultores que visam à criação do Consecitrus, "ambiente" no quais questões como preços e fitossanidade possam ser discutidos de forma civilizada e cujo projeto ganhou força nos últimos meses. Para os padrões da Cutrale, a Santa Maria é uma fazenda pequena, quase média. Mas altamente produtiva e de excelente patamar de custos. A Santa Maria tem 758 hectares no total, 554 deles ocupados por laranja e o restante com reserva legal. Em 2009/10, a produção chegou a 781,9 mil caixas de 40,8 quilos, e a produtividade foi de 1.411 caixas por hectare. Segundo a publicação "O Retrato da Citricultura Brasileira", coordenada por Marcos Fava Neves, professor de Planejamento da FEA/USP e especialista na cadeia citrícola, apenas 2% da área paulista de laranja superou a produtividade de 1,4 mil caixas por hectare no ciclo. Por causa do avanço do greening, a Cutrale já sabe que a Santa Maria não será tão eficiente na safra 2010/11, mesmo que o clima tenha ajudado a primeira florada. Ainda há muitas incertezas pela frente, mas a empresa calcula que aqui a colheita ficará em 630 mil caixas de 40,8 quilos, queda de quase 20%. Com isso, o custo por caixa subirá, mas nada capaz de comprometer a propriedade, que opera com gasto abaixo da média. Segundo a CitrusBR, entidade que representa as quatro grandes indústrias de suco, em 2009/10 o custo médio dos pomares das empresas foi de R$ 7,26 por caixa. Na Santa Maria, foi de R$ 5,68. Em parte, explica Valdir Guessi, diretor agrícola da Cutrale, a elevada produtividade e o baixo custo decorrem de uma estratégia de renovação de pomares que vale para todas as 40 fazendas do grupo. No sistema interligado da empresa, as quadras produtivas também são divididas em estratos de produtividade. Se a quadra em questão produz 800 caixas de laranja por hectare ou mais, ótimo. Entre 500 e 800 caixas, tudo depende da maturidade do pomar, que ainda pode ter potencial para evoluir ou já pode ter entrado em declínio. Pomares maduros com produtividade abaixo de 500 caixas começam a ser renovados, a taxas de pelo menos 5% por temporada. Essa renovação, necessária em qualquer fazenda de qualquer produtor, tornou-se vital com a disseminação do greening. Identificada pela primeira vez em São Paulo em 2004, a doença hoje está disseminada pelo Estado, que reúne o maior parque citrícola do mundo. Segundo o trabalho coordenado por Fava Neves, eram 164,2 milhões de árvores adultas produtivas (acima de dois anos) em São Paulo e no Triângulo Mineiro na safra 2009/10, além de 16,4 milhões de árvores jovens. Na Flórida (EUA), que abriga o segundo maior parque global, havia 59,4 milhões de árvores adultas produtivas no mesmo ciclo, além de 4,6 milhões jovens. E greening, muito greening. Ocorre que a doença é transmitida por um inseto comum de entre 2 e 2,5 milímetros. Como não há cura para a doença e é impossível matar os pequenos psilídeos com um tiro de canhão, que seria compatível com os estragos que vem sendo causados - 5,3 milhões de árvores foram erradicadas por causa do mal nos últimos anos -, restam técnicas tradicionais que vem sendo melhoradas (ver matéria abaixo). E mesmo assim, como demonstra a projeção de produção da Santa Maria em 2010/11, o problema deixa seus prejuízos. Parâmetro importante para a negociação de preços com os citricultores independentes, a fazenda de Analândia também expõe a encruzilhada na qual se encontra o segmento de suco de laranja. Com a demanda internacional em retração nos últimos anos, em boa medida devido à proliferação de bebidas concorrentes mais baratas, indústrias e produtores de laranja dependem de problemas na oferta para verem os preços subirem. Foi o que aconteceu em 2009/10, com adversidades climáticas e/ou fitossanitárias em São Paulo e na Flórida. Para 2010/11, por enquanto o clima é bom. Mas o greening preocupa, o que, para desgosto do pessoal de campo da Cutrale e de qualquer outra fazenda, pode ajudar a manter os preços sustentados. Fonte. Valor Econômico. Por Fernando Lopes. 22 de dezembro de 2010.
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