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Scot Consultoria

Procuradora detalha o que levou os MPs a ingressarem ação contra os frigoríficos


Segunda-feira, 25 de abril de 2011 - 09h19

A Ação Civil Pública (ACP) com multa acima de R$2 bilhões a 14 frigoríficos locais e ao Ibama será alvo de inúmeras polêmicas ao longo da sua tramitação. Sendo assim, quem tem a palavra agora para esclarecer a posição dos Ministérios Público Estadual (MPE), Federal (MPF) e do Trabalho (MPT) com a ACP é a procuradora de Justiça Patrícia de Amorim Rêgo. Para ela, deve-se ficar bem claro que se a ação não fosse ajuizada, os MPs estariam cometendo um ‘crime’ grave não só de ordem jurídica, bem como ao legítimo progresso sócio-ambiental e econômico do Acre. Para abrir a sua base de argumentações, a procuradora começa rechaçando qualquer fundo ‘perseguidor, preconceituoso ou pessoal’ na ação. Como prova, ela destaca que o propósito maior da ACP é fazer com que a pecuária acreana passe a ser desempenhada conforme rege a Legislação Ambiental em vigor, independente de qualquer alteração que ela sofra mais adiante. “Queremos que a atividade se desenvolva sim. Mas de forma correta, legal. Não adianta alegarem que estamos contra o avanço do Estado, ou que não tivemos bom senso ao instalar a ação. Isso tudo é mentira! Só estamos cumprindo nosso dever, e bem atentos a realidade local, para fazer com que os produtores acreanos sigam o que manda a Lei”, declara Patrícia. E, para não deixar seus argumentos soltos no ar, é justo com a Lei dos Crimes Ambientais (Decreto federal no 6.514/2008) em mãos que a procuradora começa a entrar em detalhes. Segundo ela, a ACP tem efeito de fazer com que os 14 frigoríficos autuados parem, de imediato, de adquirir bois para abate nas áreas embargadas pelo Ibama. Determinação esta expressa no art. 54 do decreto, que prega ser proibido ‘adquirir, intermediar, transportar ou comercializar produto ou subproduto de origem animal ou vegetal produzido sobre área objeto de embargo’. “Área que está embargada não pode oferecer animais ao frigorífico. Está na Lei. Se não, quer dizer que se embarga um lugar e fica por isso? Não é assim. E o Ibama informa no seu site todas as fazendas daqui que estão embargadas. Ora, nada justifica que estas áreas sigam tendo produção e que os frigoríficos comprem delas. Portanto, o que fizemos na ação foi pedir as vias de trânsito dos animais ao Idaf e ver quem recebia e comprava destes locais. Já o Ibama entrou no caso porque, a rigor, era ele quem deveria autuar tudo isso”, resume. E é com base no mesmo artigo que a procuradora justifica o valor afixado da multa de R$2 bilhões - que os produtores rurais alegam ser ‘estratosférica e fora da realidade’ do Acre. De fato, a multa por transgredir o art. 54 é afixada em R$500,00 por Kg ou unidade. “Então, que fique claro que não fomos nós que decidimos a quantia de R$2 bilhões. É a própria Lei que preconiza este valor. Nós só calculamos e aplicamos, sem fazer vista grossa”, emenda ela. Outro ponto que Patrícia Rêgo fez questão de enfatizar é que a ação não deveria ser tão temida caso os grandes produtores rurais tivessem mais vontade de regularizar a sua produção. Conforme dados extra-oficiais apresentados por ela, o Acre tem cerca de 5 mil propriedades de médio e grande porte produtivo (isto é, acima de 100 cabeças de gado). Destas, apenas 60 fazendas (1,2%) são totalmente regularizadas e 300 (6%) estão em fase de regularização. “Um item da ACP que também não vem sendo tocado é que o frigorífico que comprar de área embargada deve, sim, ser penalizado. Mas há exceções. Aquele que estiver buscando meios de se legalizar terá bem chances maiores de se livrar da ação. Tanto é que um dos maiores da região, o JBS - Friboi, de novo já está em vias de vir assinar conosco o acordo (TAC) pra se regularizar. Estão considerando nossos termos porque viram que é muito menos rígido do que o que já assinaram em outros estados. Então, que eles sirvam de exemplo para os outros. O que queremos é que os frigoríficos nos procurem e assumam essa mesma responsabilidade”, convoca ela. Os motivos que levaram até a Ação Civil Pública Para basear melhor seus argumentos, Patrícia Rêgo detalha como todo este impasse começou. Segundo ela, a ACP não partiu do nada. Primeiro, ela se originou de um programa do MPF aplicado em toda Amazônia (não é exclusivo ao Acre) para regularizar esta cadeia, intitulado ‘Carne Legal’. Daí, surgiu a investigação sobre as áreas embargadas pelo Ibama. Por sua vez, o MP do Acre tinha um inquérito civil sobre a licença das grandes e médias propriedades rurais. Foi quando as instituições se uniram ao MPT para combater a suposta clandestinidade no setor. Mas só as investigações não bastavam para gerar a ação. Antes de qualquer medida judicial mais drástica, era melhor tentar negociar acordos. Seguindo tal lógica, foram assinados Termos de Ajustamento de Conduta (TACs) com produtores e frigoríficos no Pará, em Mato Grosso e em outros estados. Todos assumindo o compromisso de buscar alternativas pra sair da ilegalidade. Quando chegou a vez do Acre, a procuradora lembra bem que chegou até a achar que o estabelecimento do acordo seria fácil. Afinal de contas, o Governo do Estado tem políticas públicas e programas bem claros de regularização do pequeno, médio e grande produtor. Só que a realidade foi bem diferente. Na versão de Patrícia Rêgo, os MPs correram atrás dos frigoríficos durante mais de 1 ano e meio tentando acertar as cláusulas do acordo (atitude esta que só foi tomada no Acre, para se adaptar à realidade local), mas sem obter sucesso. Diante da indisposição em firmar um acordo, o grupo de promotores e procuradores do MPE, MPT e MPF se reuniram e decidiram entrar com a Ação Civil Pública, afim de acabar de vez com a comercialização tida como clandestina dos bois oriundos das áreas embargadas. “Convocamos os frigoríficos e demos um prazo para que eles pudessem se regularizar. E eles não o fizeram. Por isso, entramos com a ação, olhando, sim, pra nossa realidade. O governo investiu milhões em alternativas e no Programa de Valorização do Ativo Ambiental para que os produtores saíssem do litígio. Poucos aderiram. Portanto, deixar as coisas como estavam não era uma opção. Seria injusto com o pequeno produtor que procura se regularizar ver os outros, em especial médios e grandes proprietários, não tomarem a mesma iniciativa”, prega. Só vai faltar carne no Acre se for por má vontade deles Mais um esclarecimento prestado por Patrícia Rêgo foi sobre o abastecimento de carne em todo o Estado. Na avaliação da procuradora, tratar desta questão neste primeiro momento - antes mesmo de sequer tentar sentar pra definir um acordo - é uma postura um tanto ‘exagerada’ dos pecuaristas. Segundo ela, a ação acabou de ser impetrada, e o juiz ainda nem sequer ouviu a versão de ninguém (nem do Ibama). Logo, ela presume que o único risco de faltar ou de subir o preço da carne no Acre é se os produtores e/ou os frigoríficos assim o determinarem. “Tivemos o maior cuidado pra não interferir no abastecimento. O único efeito que a ACP causa é de que os frigoríficos se regularizem. Se a cadeia produtiva sofrer algum impacto, isso vai ser da alçada dos atores que a compõem. E se fizerem isso, a tal falta de bom senso que nos acusam vai ser é deles. Ainda assim, não vamos permitir que sigam produzindo sem fazer o que é certo”, defende. Nesse sentido, Patrícia conta que o promotor ambiental da região de Cruzeiro do Sul - onde os dois frigoríficos da área não estariam mais querendo abater carne em protesto à ACP - já está agendando uma reunião para conscientizar o efeito que tal decisão terá sobre a cidade e tentar, mais uma vez, frisar o quão importante será se eles assinarem o acordo para a regularização. Para finalizar, a procuradora também elucidou sobre a notícia de que os Ministérios Públicos teriam recomendado aos supermercados locais de não comprarem as carnes dos frigoríficos investigados (segundo ela, isso só aconteceu nos outros Estados. Os mercados daqui só foram oficiados a prestar informações se compravam ou não dos frigoríficos. Não houve nenhuma recomendação) e criticou a postura da Aleac ao realizar uma sessão na última terça (19) sobre a questão e não chamar algum representante do MP para expor a sua versão. Independente da polêmica de quem está certo ou não sobre a ACP, fato é que a carne já está em falta nos mercados de Cruzeiro do Sul (os frigoríficos de lá suspenderam as suas atividades até que se resolva o impasse) e isso é algo que também pode ocorrer na Capital. Produtores afirmam que processo pode sim quebrar economia do Acre Em declarações anteriores, o presidente da Federação da Agricultura e Pecuária do Acre (Faeac), Assuero Veronez, criticou a Ação Civil Pública por entender que ela é, sim, desatenta ao momento atual do setor, baseada em premissas falsas do passado, inconseqüente e de alto tom punitivo à cadeia inteira da produção local de carne (começando pelo frigorífico, passando pelo grande e indo aferir com seus prejuízos o pequeno produtor). A seu ver, ela representa mesmo a ‘contramão do desenvolvimento e da política de industrialização’ do Estado. Ele também contesta a real necessidade da ação, uma vez que hoje a pecuária do Acre é uma atividade que consegue movimentar um alto PIB de R$700 milhões (80% disso graças à atuação distribuída dos pequenos produtores) e gerar mais de 24 mil empregos, limitando-se a uma agricultura nos moldes da subsistência (produz só o que é necessário pra sobreviver) e com um nível de desmatamento hoje em dia já ‘estancado’ e ‘menor a cada ano’. Assuero diz que a ação é sim fora da realidade e pode quebrar pequenos produtores Sem contar, o que os pecuarista apontam de ‘irregularidades’ na elaboração da medida processual. A maior delas é direcionada aos tais embargos nas fazendas. Segundo eles, os embargos (motivados, principalmente, por falta do licenciamento da terra, transgressão a reserva legal e APPs, desmatamento e mão-de-obra irregular) devem valer só para uma parte das propriedades, e não para todo o seu território. Tal ressalva não estaria sendo considerada, já que a ACP não especifica na sua investigação quais são os trechos da fazenda interditados (proibidos de vender gados). Inclusive, é por tal incerteza que os donos de frigoríficos alegam que os animais adquiridos nas fazendas embargadas vieram todos certificados com o Guia de Transporte do Idaf - que torna lícito o seu comércio e abate. Ou seja, ao mesmo tempo em que os MPs consideram o abate deste animal irregular, o Idaf certifica que eles vinham, sim, de origem legal. Tal divergência tece a crítica de que os MPs teriam interpretado e feito ‘mau’ uso da Lei de forma a prejudicar os produtores. Sobre o famoso Termo de Ajustamento de Conduta aos frigoríficos, em artigo publicado no caderno especial Acre Economia, o presidente da Faeac explica que tal acordo feria a autonomia dos produtores, não tinha nenhum tipo de embasamento legal para ser traçado e seria algo irrelevante. “Tentamos dissuadi-los (promotores) da proposta de assinatura de TAC com os frigoríficos, tendo em vista a absoluta desnecessidade de tal medida e ainda a impossibilidade de cumprir as obrigações impostas, muitas delas sem previsão legal”, escreveu Assuero. Já sobre a alegação de que a atividade estaria sendo exercida na clandestinidade, Veronez a rebate duramente no mesmo texto e ainda diante da tribuna da Aleac, destacando que os produtores rurais de todos os portes vêm, sim, adotando e sendo parceiros do Governo do Estado nas políticas focadas na preservação ambiental. “Construiu-se a pactuação com os diversos segmentos sociais e econômicos no âmbito do projeto de Zoneamento Ecológico-Econômico e outras leis, como a da Valorização do Ativo Florestal e a do Sistema de Serviços Ambientais”, prega Assuero, acrescentando que a ACP vem justo para atrapalhar este processo de adesão. Quanto à defesa que os MPs alegam fazer ao pequeno produtor, os pecuaristas elucidam que a ação vai gerar justamente o efeito contrário. Segundo eles, a multa aplicada aos frigoríficos vai abalar toda a cadeia local (com um dos elos quebrados toda a corrente se rompe). Com isso, o grande produtor vai sofrer algum abalo, mas vai conseguir vender seus produtos pra fora. Já o médio vai se apertar ainda mais e cortar gastos, mas vai conseguir seguir o grande. Já o pequeno, sem opções e verbas para investir, vai quebrar completamente. Por último, a respeito do abastecimento no setor, os pecuaristas alegam que, por maior que seja o cuidado dos MPs, eles jamais terão propriedade para falar pelo setor. Segundo tal linha de raciocínio, se já há uma ação com uma multa ‘impagável’ - “Todo o rebanho do Acre não vale isso (R$2 bilhões)”, cravou Assuero Veronez, na Aleac - quais garantias os frigoríficos terão de que não vão tomar multas ainda maiores se seguir trabalhando? E os bois oferecidos pelos produtores que os MPs enxergam como ‘legalizados’ seriam suficientes pra abastecer toda a cadeia acreana? Na dúvida, os dois frigoríficos de Cruzeiro já decidiram parar as suas atividades e é bem provável que esta atitude seja seguida pelo restante do Estado. Órgãos ambientais afirmam que as 18 áreas que MPF propõe embargo já passam por processo de regularização ambiental Os diretores do Instituto de Meio Ambiente do Acre (Imac) e Instituto do Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama) afirmaram esta semana que já estão procedendo o trabalho de regularização e licenciamento ambiental de propriedades rurais. Cinco delas, inclusive, já estariam devidamente licenciadas e atendendo a todos os requisitos previstos em lei. No último dia 11, o Ministério Público Federal (MPF) e Ministério Público Estadual (MPE), oficiaram ao Imac e Ibama e recomendaram a multa para essas áreas. De acordo com o documento, as áreas em questão descumprem a legislação ambiental, pois apresentam desmatamento em área de preservação ambiental permanente. Tais áreas, estariam sendo utilizada para a prática de pecuária, o que impede a recuperação da mata nativa. MPF e MPE consideram em sua recomendação que “somente o embargo das áreas de preservação permanente desmatadas poderá possibilitar a regeneração natural da vegetação destruída”. O diretor-presidente do Imac, Sebastião Fernando Ferreira de Lima, o superintendente interino do Ibama, Diogo Selhorst, garantem que já há algum tempo que as duas instituições têm buscado regularizar a situação das áreas citadas na recomendação. “Louvamos a ação do MPE e MPF, mas consideramos que é desnecessária a multa e embargo imediato dessas áreas, haja vista que, cinco delas já estão em processo de regularização, inclusive com o licenciamento ambiental em vias de liberação”, afirmou Fernando Lima. “O processo de licenciamento ambiental já prevê tudo isso que os promotores e procuradores federais e estaduais estão recomendando. Proceder o embargo e multa antes mesmo de termos o processo de licenciamento encaminhado não é a forma correta de se lidar com o problema”, complementou o diretor-presidente. “Quanto às demais áreas, estamos chamando seus proprietários para esse mesmo processo. Para tanto, a ação fiscalizadora é fundamental, o que significa que se for constatada a necessidade de multa e embargo, será feito”, garante Diogo. O secretário de Meio Ambiente do Acre, Edegard de Deus, disse que, diante dos procedimentos que já vêm sendo executados pelo Imac e Ibama, não será preciso seguir a recomendação proposta pelo MPF e MPE. O secretário informou que as 2 instituições devem responder aos promotores e procuradores afirmando sobre as 5 áreas já licenciadas e as medidas tomadas contra as demais. As respostas do Imac e Ibama deve ser envida ao MPF e MPE já nos próximos dias. Nela, serão detalhadas todas as ações que serão tomadas e as demais que já foram ou que estão sendo tomadas para regularizar a situação de todas as áreas citadas na recomendação. (Assessoria) Audiência Segundo contou o deputado Moisés Diniz, em sessão na Aleac, o governador Tião Viana já tem conhecimento sobre a questão e pediu para que os produtores aguardem a votação no Congresso do Novo Código Florestal (que pode pôr fim a todo o impasse), que deve sair nesta semana. Se a questão não for solucionada após a votação, será marcada uma reunião para intermediar o consenso entre a classe e os procuradores dos MPs, com a presença de deputados e senadores, no dia 3 de maio. Fonte: A Gazeta do Acre. Por Tiago Martinello. 23 de abril de 2011.
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