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Scot Consultoria

Mercado de carbono: nova commodity?

Entrevista com a cientista ambiental, Gracie Verde Selva

Terça-feira, 10 de maio de 2022 - 11h00
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Gracie Verde Selva é cientista ambiental e doutora em Políticas Públicas Ambientais. Atualmente trabalha na Minerva Foods como Gerente de Sustentabilidade. É responsável pelo Renove, programa de engajamento e atuação colaborativa com produtores rurais para a implementação da pecuária de baixa emissão de carbono, gerando rentabilidade e sustentabilidade. O programa visa fornecer aos produtores rurais apoio técnico e capacitação, ao mesmo tempo em que permite o acesso à finanças verdes e o mercado voluntário de carbono.

Foto: ShutterStock


Gracie é uma das palestrantes convidadas para o Encontro de Confinamento e Recriadores da Scot Consultoria para falar sobre o mercado de carbono.

Scot Consultoria: Qual tema será abordado no Encontro de Confinamento e Recriadores da Scot Consultoria?

Gracie Selva: Um dos pontos que será levantado no evento é sobre o potencial de geração de crédito de carbono no agro, tomando por base os parceiros existentes da Minerva Foods.

Scot Consultoria: Durante a COP26 o Brasil aderiu ao acordo que prevê a redução em até 30% das emissões globais de metano até 2030. Quais as inovações que os frigoríficos e as empresas do setor agropecuário vêm adotando para atingir essa meta e produzir mais e de forma sustentável?

Gracie Silva: No nível de conhecimento e pesquisa que o Brasil está, essa meta é factível de ser cumprida, considerando os fatores de emissão de metano nacionais

Há alguns caminhos que servem para que a emissão seja reduzida. O primeiro deles é a implementação de tecnologias agropecuárias que sejam capazes de aumentar a eficiência e reduzir a idade de abate dos bovinos (quanto mais jovem o boi for abatido, menor será sua emissão de metano). 

A Minerva Foods já trabalha com uma cadeia muito tecnificada, com estudos feitos a partir de dados primários no Brasil e nos outros países de atuação, que mostram que os nossos fornecedores emitem em torno de 44% menos gases de efeito estufa quando comparado em âmbito internacional. Com isso, observamos que a tecnificação dos sistemas produtivos traz muitas possibilidades.

Em conjunto, estão surgindo no mercado vários aditivos nutricionais, que possuem estudos científicos robustos, mostrando que a introdução do produto na ração animal não causa prejuízos à produtividade animal e ainda reduz a emissão de metano.

Portanto, são vários caminhos que podem ser tomados e a Minerva está explorando todos eles em parceria com os fornecedores e outros parceiros.

Scot Consultoria: A senhora concorda com a metodologia utilizada para a geração de créditos de carbono? Quais são os pontos que necessitam de mais estudos?

Gracie Selva:  Existem várias metodologias que podem gerar créditos de carbono. Quando olhamos para o setor de uso de terra aqui no Brasil, existem três metodologias principais que podem ser aplicadas nas fazendas.

A primeira metodologia é quando a fazenda possui excedente de reserva legal e teoricamente poderia ter o licenciamento para desmatar essa “sobra”. Ao invés de realizar esse desmatamento, a fazenda receberia uma bonificação a partir dos créditos de carbono para manter a floresta em pé, evitando o desmatamento.

A segunda metodologia baseia-se na restauração de Áreas de Preservação Permanente (APP) e Reserva Legal, e a geração de créditos de carbono a partir do carbono estocado na biomassa.

Por fim, a terceira metodologia está ligada com o uso da terra na produção agrícola e pecuária. Dentro dessa metodologia, existem várias opções de intensificação do sistema, como implementação de ILP ou ILPF, rotação do rebanho, diminuição de uso de fertilizantes, entre outros.

São vários caminhos possíveis para gerar esses créditos. Porém, para o pecuarista, o ponto principal é que trabalhando a eficiência do seu sistema produtivo, se ganha mais com a rentabilidade e maior produtividade do que ganharia com créditos de carbono.

Então temos que enxergar isso como um sistema eficiente de produção de gado e lavoura, além de outras fontes de renda de sistemas integrados. Tudo isso trará potencial para um sistema muito produtivo e sustentável para o produtor rural.

Assim, o crédito de carbono seria um ganho a mais nesta conta toda.

Scot Consultoria: Qual seria a lição de casa que o Brasil deveria realizar para sair na frente deste mercado de carbono?

Gracie Selva: O Brasil já está na frente do mercado na questão de projetos de desmatamento evitado. Quando falamos sobre as metodologias ligadas às práticas agrícolas e pecuárias, o país tem um grande potencial.

Temos milhões de hectares de pastagens degradadas, o que quer dizer que toda essa área é passível de restauração e consequente sequestro de carbono no solo, sendo possível gerar créditos de carbono.

No entanto, existem alguns gargalos nestes processos. O sistema atualmente requer amostras de solo, por exemplo, tornando esse processo custoso e lento. Porém, em paralelo, conseguimos ver muitas inovações acontecendo no momento, com novas metodologias sendo inseridas na plataforma de registro de projetos de carbono, Verra.

Apostamos que nos próximos anos veremos evoluções metodológicas e tecnológicas facilitando a expansão deste tipo de projeto no Brasil.

Scot Consultoria: Quais países tomaram a frente deste mercado e quais as principais estratégias adotadas para chegarem nessa posição?

Gracie Selva: Existem países que têm seu próprio sistema de crédito de carbono. Não temos no Brasil um mercado regulado de carbono ainda.

Outros países que o possuem, podem criar metodologias nacionais e, a partir destas metodologias, as fazendas podem gerar créditos e vender conforme esse mercado é regulado no país. 

Como o Brasil não tem este tipo de mercado, precisamos trabalhar dentro do mercado voluntário, do qual 70% está dentro do sistema Verra, na certificação VCS (Verified Carbon Standard).

Scot Consultoria: Quais são os avanços quanto a regulamentação do mercado de carbono no Brasil? 

Gracie Selva: Conseguimos ver muitas conversas sobre este assunto, que aqueceu de novo após a COP26. Está em debate atualmente a regulamentação do mercado de carbono no Brasil, mas como tem muitos atores envolvidos e é um projeto complexo de desenvolver e implementar talvez demore um pouco para que o mercado regulado seja efetivamente implementado. Neste meio tempo, precisamos começar por outras plataformas disponíveis.

Scot Consultoria: O que faz com que esse mercado seja tão desconhecido pelos produtores brasileiros e, para os que conhecem, por que ainda há aversão à adesão das técnicas voltadas para geração dos créditos de carbono?

Gracie Selva: A comunicação é um dos grandes problemas. Estamos trabalhando com projetos de créditos de carbono em fazendas parceiras da Minerva, que serviriam como prova de conceito. Esperamos que, dentro das metodologias agrícolas, os pecuaristas comecem a ganhar créditos de carbono como uma renda extra após a intensificação do seu sistema produtivo.

Quando começar a ter projetos de sucesso, teremos maior aderência do pecuarista, porque até hoje ninguém conseguiu ver de fato este mercado funcionando.

É uma barreira que precisamos superar e, por isso, é de extrema importância que trabalhemos com assistências técnica e com linhas de créditos diferenciadas. A Minerva já está desenvolvendo uma parceria para oferecer este tipo de financiamento aos pecuaristas do Programa Renove.


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