• Quinta-feira, 25 de abril de 2024
  • Receba nossos relatórios diários e gratuitos
Scot Consultoria

Carta Gestor - Em tempos de crise, a única coisa que não se deve fazer é nada!


Quinta-feira, 29 de outubro de 2015 - 05h51




Uma crise anunciada há um bom tempo tem se agravado cada vez mais no Brasil. A leitura dos jornais tem sido uma tortura cotidiana. É um sem fim de notícias negativas, sempre alimentando o desânimo e fazendo-nos projetar um futuro nada alentador. Nesse ambiente profundamente contaminado de pessimismo, fica-se excessivamente avesso ao risco da mudança, sobrepondo-se o imobilismo e, pior, a inação.


Todavia, não existem crises sem fim e, depois que elas passam, pode-se esperar um período de crescimento acelerado, fato já bem descrito na sabedoria do dito popular "Depois da tempestade, vem a bonança!". Esse padrão "tempestade/bonança" não ocorre ao acaso, mas porque um dos efeitos colaterais das crises é forçar cada um a ser mais eficiente e efetivo no que faz, na busca pela sobrevivência. Reestabelecidas as condições favoráveis, os sobreviventes aumentam seu desempenho em função dos ajustes feitos por força do ambiente hostil.  


Ainda que esses "efeitos colaterais" tragam benefícios, isso não quer dizer que crises sejam desejáveis, principalmente quando elas não são desastres naturais ou causados por ciclos econômicos incontroláveis, mas por inépcia e irresponsabilidade.


O objetivo aqui é propor algumas formas de enfrentar estes tempos cinzentos e, em especial,  de maneira a se preparar para estar mais forte quanto o sol voltar a brilhar no horizonte.



1)     
Investir em informação:


Sem dúvida, estar bem informado é uma das ferramentas para tomar decisões certeiras. Isso inclui monitorar o meio externo e, hoje, a Internet permite obter muita informação. Como quantidade e qualidade quase sempre são excludentes, na internet é a mesma coisa. O desafio aqui, portanto, é separar o joio do trigo. Tomando-se esse cuidado, problema resolvido. Agora, um ponto que apenas o produtor pode resolver para si mesmo é ter informações sobre seu próprio negócio. A lógica é que, só podemos resolver problemas se pudermos identificá-los. Ter, na fazenda, sistemáticas de coleta e organização de dados é um grande passo (intermediário) para se chegar lá. Se os dados forem usados, eles transformam-se em informação que, por sua vez, pode ser usada para tomar melhores decisões. Um dos melhores exemplos disso, seria ter uma boa planilha de custos. A Embrapa Gado de Corte tem uma ferramenta que pode ajudar chamada ControlPec (veja no link http://cloud.cnpgc.embrapa.br/controlpec/ )  Por mais simples que seja a solução, uma vez que a planilha de custos reflita bem a realidade da fazenda, ela ajudará a mostrar o peso de cada item e será um ótimo guia para priorizar as mudanças que possam resultar nos maiores benefício. Dessa forma, na hora do aperto, temos condições de nos concentrar no mais importante.  



2)     
Investir em formação:


Selecionando a capacitação mais necessária para as pessoa que mais possa aproveitá-la, obtém-se um trabalhador mais efetivo, contribuindo para redução da necessidade de mão-de-obra. Por exemplo, peões treinados para manejo racional dos animais reduzem o tempo de manejo no curral e causam menos acidentes. Uma outra característica interessante desse investimento é que a pessoa que recebe o treinamento, mesmo involuntariamente, acaba repassando pelo menos parte do que aprendeu, potencializando seu efeito. É a beleza do conhecimento, uma riqueza que, quanto mais se divide, mais aumenta. Além disso, investir em no crescimento profissional é uma das formas de criar uma experiência positiva e aumentar o vínculo do empregado com a fazenda, ajudando na manutenção de bons colaboradores. Ainda que algumas opções possam ser bem caras e inapropriadas para tempos de dinheiro curto, hoje há opções acessíveis via Internet, bem como boas opções disponibilizadas pelo SENAR, em geral subaproveitadas. É possível, também, que um grupo de produtores possa atuar para sensibilizar o SENAR de sua região para cursos específicos, com a vantagem não só de redução de custos, mas de atender alguma necessidade local premente.



3)     
Rever estratégias


Em tempos felizes, em qualquer negócio, costuma prevalecer a máxima futebolística do "em time que  ganha, não se mexe!". Talvez o mais sensato seria "em time que se está ganhando, deve-se sempre considerar mexer para continuar ganhando!" ou, nas crises bravas, "mexer para perder menos!". Momentos de crise forçam o saudável questionamento se o sistema de produção atual e práticas adotadas são a melhor opção mesmo. As mudanças podem ser uma resposta à crise, como a redução de compra de suplementos alimentares por falta de caixa, mas as interessantes são aquelas em que não há forçosamente necessidade de serem adotadas. Um exemplo disso pode ser uma nova logística de fornecimento de suplementos que economize deslocamento e mão-de-obra. Ao passar a crise, pode-se voltar a investir nos suplementos, tendo o benefício da melhor logística já estar incorporada. Outra situação que a revisão de estratégia permite economia é quando ela revela haver consumo de luxo, isso é, maior do que o necessário. Esse seria o caso do uso um sal mineral com teores mais altos do que o recomendado para as condições da fazenda, passível de ser substituído por outro produto menos concentrado e, portanto, mais barato. Deve-se, também, procurar por práticas e produtos usados regularmente cuja utilização seja suspeita de não trazer benefícios, evitando usar algo apenas por tradição ou porque é tão barato que, mesmo se não funcione, faça pouca diferença. Uma revisão completa do que se faz e a busca por melhorias no manejo podem resultar em maior margem, tanto por menores gastos, como por maiores ganhos, que, inclusive, podem ocorrer simultaneamente.



4)     
Não necessariamente comprar mais barato, comprar melhor  


Uma das respostas óbvias em épocas difíceis é cortar custos. Não costuma ser muito difícil, pois sempre há alguém que vende determinado produto por um preço menor do que você compra. A pergunta crucial nesse caso é "Por que ele vende mais barato? A qualidade é a mesma? O resultado será o mesmo?". Certas vezes é fácil perceber a razão de ser mais barato e, sendo falta de qualidade, fica claro que a escolha coloca em risco o resultado. Na maioria das vezes, contudo, há incertezas. Por causa disso, antes de ir pelo caminho mais fácil do preço baixo, deve-se tentar comprar melhor. Uma das estratégias para isso é tentar comprar em quantidades maiores, pois isso o faz um consumidor mais interessante para o fornecedor. Concentrar as compras, nesse sentido, é uma boa opção e pode ser melhor ainda se sincronizá-la com uma época de menor demanda do produto, quando  há maior disposição de concessão de descontos. Uma opção trabalhosa, mas que vale à pena tentar, é montar um "pool" de compras com seus vizinhos. O esforço nesse convencimento entre vizinhos pode ser um bom começo para outras colaborações onde todos ganhem (Dividir os custos da viagem de um consultor em comun, por exemplo). Importante finalizar esse tópico lembrando que é válida a procura por opções mais baratas, pois não necessariamente elas são piores, todavia procurar aumentar o volume adquirido a cada compra e procurar acertar no timing das compras pode ser suficiente para não ter que abrir mão do fornecedor com o qual se tem confiança ou que trás alguma vantagem agregada ao produto.



5)     
Investimento anticíclico


Uma característica de época de crise é uma baixa demanda por mão-de-obra, bens e serviços. Pela ação implacável da lei da oferta e demanda, os preços caem. Assim, especialmente para aqueles pecuaristas que estejam capitalizados, pode ser uma boa oportunidade para fazer investimentos estruturais e estruturantes nas fazendas. Um investimento estrutural pode ser um novo curral que, além de poder ser um projeto que incorpore as novidades do bem estar animal (o tal do "curral anti-estresse"), pode ser mais bem localizado, melhor construído, pois compra-se materiais de construção de melhor qualidade (afinal estão mais baratos) e com valor final de construção mais barato (a mão-de-obra também está mais barata).  O exemplo de um investimento estruturante pode ser a sub-divisão das pastagens, ação para qual se espera as mesmas vantagens com material e mão-de-obra citadas no caso do curral. Seria estruturante, pois é um investimento que permite mudar o manejo da fazenda, seja por possibilitar a subdivisão do rebanho em lotes mais homogêneos, seja por permitir a adoção do pastejo rotacionado. Além da vantagem em se conseguir fazer melhor os investimentos na fazenda, quando a crise passa, a estrutura para aproveitar o melhor momento do retorno ao crescimento já está pronta para ser usada e potencializar os resultados.



6)     
Diversificação de atividades


Finalizando as ideias para tempos de crise, algo que não devemos desconsiderar é a possibilidade de diversificação de atividades. No caso da pecuária, então, é impossível não pensar nas integrações com agricultura, com florestas ou ambas combinadas. A pesquisa e vários bons exemplos em fazendas espalhadas pelo Brasil mostram resultados fantásticos. Assim, no mínimo, compensa fazer um diagnóstico para avaliar a aptidão da propriedade (bem como seus gestores) para incorporar alguma integração. Para o pecuarista, fazer parcerias com bons agricultores pode ser uma boa maneira de viabilizar o projeto, bem como facilitar andar com as próprias pernas depois de uma fase inicial nesta parceria. Caso, decididamente, esse seja um passo muito grande, as vezes a diversificação está em incorporar um confinamento na propriedade que pode ter o uso ampliado como "boitel" e gerar receita extra com a venda do esterco, de preferência agregando valor a ele pela compostagem. No caso do confinamento, a vantagem comentada no item anterior, se aplica a estrutura do confinamento, incluindo as instalações para os animais e os imprescindíveis anexos (galpões para alimento e fábrica de ração) e equipamentos. Ainda assim, antes de ter a estrutura definitiva, pode ser vantagem fazer um confinamento menos estruturado para uma fase de aprendizado. Isso significaria, por exemplo, poucos piquetes com estruturas provisórias (cochos e bebedouros móveis) e um vagão de mistura total no lugar da fábrica.


Há previsões tenebrosas de fechar esse ano com um encolhimento de 3 unidades percentuais do produto interno bruto, algo que reduz bastante a chance de qualquer setor passar imune à crise. Todavia, como o economista Roberto Macedo escreveu outro dia em um de seus brilhantes textos, não devemos esquecer dos outros 97% que sobram. Com o pensamento concentrado neles, esperamos inspirar ações anti-crise que ajudem nosso país voltar ao trilho do desenvolvimento o quanto antes, só que mais bem lubrificados pelas decisões certas tomadas nessas horas incertas.


*Por Sergio Raposo de Medeiros, pesquisador - Embrapa Gado de Corte



<< Notícia Anterior Próxima Notícia >>

Buscar

Newsletter diária

Receba nossos relatórios diários e gratuitos


Loja