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Scot Consultoria

Chegou à seca, continuo a combater as plantas daninhas na minha pastagem?


Sexta-feira, 5 de junho de 2020 - 08h50

Engenheiro agrônomo e mestre em solos e nutrição de plantas pela ESALQ-USP. Com atuação profissional desde 1985 em pesquisa e desenvolvimento em sistemas de produção agrícola em empresas nacionais e multinacionais, trabalhou por 24 anos na geração dos principais herbicidas para pastagens hoje no mercado. Atualmente, é consultor independente, fundador da NTC ConsultAgro, focado no manejo da vegetação em pastagens, reflorestamentos e áreas não agrícolas.


Foto: Scot Consultoria


Os meses de maio e junho marcam o início do período seco nas principais regiões de exploração pecuária do Brasil, com exceção do Nordeste onde, em oposição, se iniciam as chuvas.


Esse período de seca, anualmente enfrentado pelo pecuarista com maior ou menor dificuldade, dependendo da intensidade com que se impõe, é marcado por, além da ausência de chuvas, diminuição do fotoperíodo ou horas de luz diária, e diminuição das temperaturas, principalmente durante as madrugadas, com possíveis ocorrências de geadas, com temperaturas próximas ou abaixo de 0oC, de acordo com a topografia e região em que se localizam.


As forrageiras tropicais paralisam seu metabolismo, secam as folhas, não perfilham e diminuem seu sistema radicular. O pecuarista que teve oportunidade de realizar o diferimento de pastagens e/ou produziu silagem, é a hora de fazer uso delas na suplementação alimentar dos bovinos. Outros ainda, dependendo de suas capacidades, estratégias e peculiaridades econômicas, iniciam o confinamento de animais. De forma geral se estabelece uma mudança na rotina da fazenda.


Influência da seca nas plantas daninhas

Assim como nas forrageiras, a mudança do clima influencia no metabolismo das plantas daninhas que infestam as pastagens.


As espécies anuais, predominantes entre as que caracterizamos como de fácil controle, fecharam seu ciclo e sumiram da pastagem. Restaram suas sementes no solo, que germinarão no restabelecimento das condições climáticas favoráveis na primavera.


As espécies perenes também fecharam seu ciclo, possuem sementes secas em suas estruturas reprodutivas, como vagens e pendões, ou já as dispersaram pelo vento, através de animais ou outros mecanismos, porém permanecem vivas. Internamente seus talos estão verdes. As folhas se modificaram em defesa da perda de água para o ambiente. Em algumas espécies ficaram coriáceas, outras reduziram drasticamente sua área e arquitetura. A cutícula, que é a camada de cera de proteção da folha, ficou mais espessa e impermeável.  Alterações que, em resumo, caracterizam as estratégias das plantas para atravessar esse período desfavorável, com um mínimo de gasto de energia, garantindo sua sobrevivência. Seu sistema radicular está ativo, normalmente explorando camadas profundas e úmidas, muito além das exploradas pela gramínea forrageira, o que caracteriza a paisagem do momento, das pastagens secas e das plantas daninhas verdes.


Controle das plantas daninhas no período seco

Todas essas transformações metabólicas da planta indicam que devemos tê-las em consideração para seu controle. A roçada manual ou mecânica é uma das principais estratégias de combate utilizadas pelo pecuarista nesse momento, o que em alguns casos é interessante, uma vez que o dano às pastagens é mínimo, ou inexistente, e a supressão da parte aérea elimina as partes secas da planta, proporcionando um melhor rebrote na primavera, facilitando seu controle foliar em rebrotes vigorosos nos períodos chuvosos que se sucederão. Contudo essa roçada proporciona o fortalecimento do sistema radicular das plantas herbáceas, arbustivas e arbóreas, e caso não se realize uma ação de controle, imediatamente após o corte, ou foliar em seus rebrotes, teremos um fortalecimento desta planta roçada, sendo seu controle efetivo praticamente nulo nessa operação.


Faço um analogia da roçada das plantas daninhas à poda de inverno realizada em frutíferas de interesse econômico, principalmente as de origem de clima temperado, como videiras, figueiras e macieiras, onde se eliminam as partes velhas, fontes de perda durante o período seco e que dificultarão seu rebrote e se fortalece o sistema radicular. É exatamente isso que o pecuarista realiza com a roçada das plantas daninhas: uma poda com ação revigorante.


Dentre os métodos de controle das plantas daninhas nesse período devemos descartar totalmente a modalidade de aplicação foliar, restando três outras modalidades: aplicação no toco após o corte; basal sem corte e distribuição de herbicidas no solo.


Controle de plantas daninhas lenhosas no toco

É uma das principais modalidades de controle no período seco, e por sinal também uma das mais efetivas em plantas lenhosas. Muitas vezes é a única opção, aliada à modalidade basal, que proporciona controle de algumas espécies de difícil, e até mesmo impossível, controle em aplicações foliares.


Como mencionado em artigos anteriores, dentro de estratégias de controle das plantas daninhas na pastagem, se consideram aplicações foliares nas épocas quentes e úmidas, com tratamentos químicos mais baratos, que proporcionarão controle das plantas de mais fácil controle, normalmente em maiores infestações, e as plantas de difícil controle remanescentes são foco nessa ocasião.


A aplicação de produtos à base principalmente de picloram, é realizada imediatamente após o corte do caule, o mais rente possível ao nível do solo. Esse corte rente ao solo é importante porque cortes mais altos determinam um maior percurso que o produto deverá percorrer até atingir o sistema radicular, bem como representa reserva de defesa da planta tratada. A indicação da aplicação ser imediatamente, ou o mais breve possível após o corte, se deve também à defesa da planta, que sela seus vasos para evitar perdas de água e seiva, dificultando também a penetração do herbicida.


As diversas marcas de picloram comercialmente disponíveis no mercado são formulações líquidas, contendo 240 g/L de concentração. Algumas já possuem corantes, normalmente azul ou roxo, o que é bastante interessante nessa modalidade de aplicação, marcando as plantas tratadas e facilitando o trabalho no campo. Quando a formulação não contém corante, sua adição é praticamente mandatória, pelo motivo mencionado. Diversos corantes podem ser utilizados, desde os empregados em pintura até corantes alimentícios.


A prática recomenda que se trabalhe no campo em duplas ou trios, onde um ou dois trabalhadores realizam o corte com foice, machado ou motosserra, e outro fica exclusivamente dedicado à aplicação nos tocos recém cortados, utilizando pulverizador costal, pressurizado manualmente, equipado com ponta de pulverização que proporcione o jato mais concentrado possível, para que este se direcione exclusivamente no toco cortado, podendo também que algum volume escorra até o solo rente ao tronco, uma vez que o produto é absorvido tanto na área de corte como pela raiz. Outra recomendação é que se realize um bom molhamento na área de corte, o que não ocorre quando se utilizam esponjas ou pinceis, não sendo assim recomendados para uso nessa aplicação.


Uma recomendação especial na aplicação de herbicidas no toco de plantas lenhosas, se faz em espécies que possuem sistema radicular com um tipo de enovelamento de vasos próximo ao nível do solo. Caso clássico observado na espécie Memora peregrina, popularmente conhecida como “ciganinha”, uma bignoniácea arbustiva, da família dos ipês. Planta importante nos cerrados de São Paulo, Minas Gerais, Goiás e principalmente Mato Grosso do Sul. Nesse caso só o corte rente ao solo não é suficiente. Deve-se utilizar enxadas, ou outras ferramentas de corte, que atinjam esse enovelamento no início da raiz, abaixo do nível do solo, normalmente a 10, 15 ou até 20 cm de profundidade, para que o produto seja aplicado nessa região. Um trabalho bastante mais exigente em qualidade, demandando treinamento dos aplicadores e cuidadoso acompanhamento durante a aplicação, mas também sendo bastante efetivo no controle quando bem feito.



Campo infestado com Ciganinha (Memora peregrina) – Foto: N. Caceres



Detalhe do sistema radicular profundo da ciganinha, e o ponto de enovelamento de vasos onde deve ser feito o corte e aplicação no toco – Foto: N. Caceres



Aplicação basal em plantas lenhosas

A aplicação basal, assim denominada por ser realizada na base da planta, é realizada sem o corte e direcionada no terço ou metade inferior dos troncos ou ramos da planta a ser controlada. Uma modalidade de controle bastante interessante tratando-se de plantas que possuem caules finos ou com numerosas ramificações. Importante que a aplicação seja em todos os ramos da planta e que o molhamento seja em toda a circunferência dos ramos ou tronco.


A barreira para penetração do produto na planta é a casca dos troncos ou ramos, muitas vezes espesso e corticoso, e para penetrá-los a calda herbicida não pode ser diluída em água, mas em um solvente orgânico, como óleo diesel ou querosene, o que vem a ser um inconveniente pelo custo adicional, mas é mais prático e rápido que a aplicação no toco.


Os produtos principais para esse uso são à base de triclopir ou picloram + triclopir, e como dito anteriormente, diluídos predominantemente em óleo diesel. Por essa razão também que o direcionamento do jato de aplicação deve ser o mais restrito possível aos ramos, uma vez que o que cair no capim não será efetivo na planta daninha e causará a queima da forrageira.



Aplicação basal – Foto: Corteva


Aplicação no solo

Finalmente temos como possibilidade de controle de plantas daninhas na época seca, a aplicação de herbicidas sólidos no solo, ao redor das plantas. Essa modalidade bastante prática para controle de plantas arbustivas e lenhosas, encontra-se hoje mais limitada pela pouca disponibilidade de produtos comerciais, predominantemente formulações peletizadas, contendo 100 g/kg (10%), do ingrediente ativo tebutiuron. Esse produto é essencialmente absorvido pelas raízes, assim, uma vez aplicado na superfície do solo, necessita ser solubilizado e penetrar no perfil para ser absorvido pelas raízes. Isso se dá nas primeiras chuvas, ou até mesmo através da movimentação de água capilar do solo, ao longo dos ciclos dia/noite.


Além de plantas de folhas largas, esse produto também controla as chamadas tabocas, ou bambus, que são monocotiledôneas que infestam pastagens em muitas regiões do Brasil.


A recomendação se dá em gramas de produto por m2, sendo as doses indicadas nas bulas dos produtos, e variam com a espécie da planta alvo de controle.


Conclusão

Bem, comentamos aqui de modo breve, as modalidades de controle de plantas daninhas durante o período seco em pastagens. Uma época em que as invasoras até exercem pouco poder de competição com as forrageiras, uma vez que estas estão com baixa atividade metabólica, porém é uma época capital para controlá-las, reduzindo sua população, tornando esse trabalho facilitado, e com menores perdas, no período das águas, onde a pastagem deve produzir em toda sua potencialidade, contudo, como mostrado no texto, exige alguns cuidados especiais para bem aplicar as técnicas.



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