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Scot Consultoria

Estratégias para a sucessão familiar - O caso do Chico Bento e o “copo meio cheio”


Sexta-feira, 20 de julho de 2018 - 15h00

Graduada em Gestão Ambiental pela ESALQ/USP, mestre e doutoranda em desenvolvimento econômico pela Unicamp. Pecuarista em Mato Grosso. Pesquisadora, consultora e palestrante em temas relacionados à economia.


Foto: iagro.ms.gov.br


Um tema que preocupa muitos produtores rurais é a questão da sucessão familiar. Quantos produtores realmente estão preparando seus filhos para assumir a empresa rural da família? Sucessão é um tema importante, mas que não é urgente. E, por isto, é algo que pode ser deixado “para amanhã”. Deste modo, pela minha experiência, de cada dez produtores, talvez um esteja efetivamente implantando um processo sucessório.


Este e os próximos textos irão abordar estratégias para a sucessão familiar em empreendimentos rurais. Para iniciar, a pergunta que gostaria de refletir com você, caro leitor é: Quando o processo de sucessão familiar tem início?


Para responder esta pergunta, gostaria de começar esta reflexão contando a minha experiência pessoal, que foi um dos motivos que fez com que eu me aprofundasse no tema, sendo uma das disciplinas que leciono em cursos de pós-graduação. Quando eu tinha aproximadamente nove ou dez anos, minha mãe contou para a professora da escola que morávamos no sítio e que produzíamos laranja e frango. Até então, nada demais nisto, certo?


Não lembro qual o motivo, mas a professora falou para os meus amiguinhos que meu pai “criava frangos”. Quando deu o intervalo, eu era a “Chico Bento”. Eu odiei o “bullying”. Obviamente, meus amiguinhos perceberam o meu incomodo, o apelido pegou e aquilo se tornou uma grande chateação para mim e, em especial, para a minha mãe. Dona Luzia, preocupada, me encaminhou para uma psicóloga.


A resposta da psicóloga sobre o assunto foi sensacional. Ela questionou minha mãe se alguém na família reclamava de ser “produtor rural”. Relatou que, no meu imaginário era um desafio morar na área rural. Citou inclusive que eu mencionava que as estradas eram ruins, isto porque morávamos a 12 km do centro da cidade e só tínhamos 5 km de estrada de terra.


Caro produtor, o que me levou a crer que ser o “Chico Bento” era ruim? Muito do imaginário ou inconsciente, ou o que o quisermos chamar, das crianças, é construído pela fala dos adultos. No exemplo que dei das estradas, lembro claramente que um dos meus familiares reclamava constantemente da distância e das condições da estrada de terra, ainda que fossem apenas 5 km em uma área desenvolvida do estado de São Paulo.


Outro ponto é que tudo isto aconteceu na época da concentração da indústria da laranja e também de um momento em que a avicultura não ia bem. Estes pontos foram mencionados por mim, com apenas nove anos, para a psicóloga na qual minha mãe me levou.


Então, caro produtor, a primeira estratégia da sucessão familiar é a do “copo meio cheio” e ela deve ser aplicada quando os sucessores ainda são crianças. Se no meu imaginário, eu tivesse que morar no sítio era muito melhor do que morar na cidade, quando as outras crianças me chamaram de Chico Bento, aquilo não teria me incomodado.


No caso da pecuária, por exemplo, a cadeia tem passado por diversas transformações. E, por muitas vezes, temos um “saudosismo” do passado, inclusive em relação à rentabilidade da atividade. Qual mensagem estamos transmitindo aos nossos filhos? Reforçamos mais que a atividade é lucrativa e nos dá uma grande satisfação pessoal e profissional ou reforçamos mais que o preço, seja do bezerro ou da arroba, não estão nos patamares que gostaríamos? Ou ainda, que a indústria nos rouba constantemente?


Então, caro produtor, sucessão familiar tem início na infância dos filhos (ou sucessores) e a primeira estratégia é transmitir a mensagem do “copo meio cheio”. Desafios todos os empreendimentos e negócios terão, bem como todas as profissões. Ainda que hajam dificuldades, construir no imaginário da criança a importância do empreendimento rural e dos seus aspectos positivos, certamente contribui para que o negócio continue na família. Esta é a primeira estratégia da sucessão familiar.


Embasei este texto na minha experiência pessoal. Porém, observe à sua volta. Qual a mensagem que famílias, onde os filhos querem continuar na atividade, costumam transmitir aos jovens sucessores? No próximo texto, conversaremos sobre a diferença entre sucessão familiar e herança e as estratégias de aumento da rentabilidade. Uma entrevista onde falei sobre o assunto e que pode ser um material complementar a este texto, está disponível no canal da SBA - https://www.youtube.com/watch?v=Ablf68uSWCs.



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