Já pensou em imprimir o seu jantar? Engenharia tecidual poderá produzir couro em massa até 2017

O diretor de uma empresa chamada Modern Meadow revelou os detalhes do plano de ação para a bio-impressão 3D de carne e couro, começando com amostras de tecido de animais doadores.

As informações sobre a Modern Meadow tem sido sigilosas desde que foi divulgada em agosto que a empresa recebeu financiamento da Fundação Thiel, empresa de Peter Thiel co-fundador do Paypal, para a bio-impressão 3D de carne e couro.

Impressoras tridimensionais já existem e são usadas para produzir implantes, peças de bicicletas, réplicas de armas. É uma técnica para produzir objetos sólidos com dispositivos não muito distintos de uma impressora de computador, criando-os linha por linha e, por conseguinte, verticalmente camada por camada.

Mas, em uma entrevista exclusiva para o Txchnologist, a empresa co-fundadora e o diretor Andras Forgacs quebrou o silêncio e revelou alguns detalhes sobre os objetivos da Modern Meadow. Seu primeiro projeto? Produção in vitro de couro.

"A nossa ênfase, primeiramente, não está na carne, mas no couro", diz Forgacs. "A principal razão é que, tecnicamente, a pele é uma estrutura mais simples do que a carne, tornando-a mais fácil de produzir."

A bio-impressão é uma linha de pesquisa recente que vem apresentando importantes desenvolvimentos, mundialmente. Alguns tecidos podem ser produzidos mais facilmente que outros. A cartilagem, que é amorfa e não possui muita estrutura interna e vascularização, tem sido um ponto de entrada nessas pesquisas.

A empresa também precisa aclimatar os potenciais clientes para a ideia de engenharia de tecidos. Acontece que, pelo menos inicialmente, muitos consumidores podem não querer comer uma maravilha tecnológica moderna. "Curiosamente, descobrimos que cerca de 40% das pessoas estaria disposta a experimentar a carne de cultura", diz ele. "Há muita controvérsia em torno de usar menos couro que não envolva matar animais."

Existem muitas barreiras nesse processo de impressão 3D. Entre eles está o econômico, ou seja, em viabilizar este processo industrialmente, já que em seu custo estará embutido uma alta tecnologia de pesquisa e engenharia.

Enquanto aperfeiçoa seu processo de produção de couro o laboratório irá trabalhar em carne, entretanto Forgacs tem a expectativa que o processo de regulamentação poderá manter os hambúrgueres Modern Meadow fora do prato por mais 10 anos. A escala completa de produção de couro, por outro lado, pode ser instalada e executada em 5 anos.

A equipe da empresa, que anteriormente fundou a bio-impressão médica da empresa Organovo, irá trabalhar para nos próximos dois anos aperfeiçoar seus processos e materiais, assim como a criação de um pequeno volume de produtos.

A tecnologia da bio-impressão é uma ramificação da bio-fabricação, e consiste da aplicação da prototipagem rápida para a fabricação aditiva e automatizada de tecidos e órgãos baseada na estruturação por blocos de construção conhecidos como esferóides teciduais.

"Temos um sentimento muito bom de como proceder, mas ainda estamos em fase de desenvolvimento", diz ele.

A expectativa é de que a bio-impressào ainda leve, no mínimo, 10 anos para atingir seu maior grau de maturidade. Diversas universidades e centros de pesquisa, principalmente, nos Estados Unidos e Europa, vêm perseguindo a fabricação de rins, fígados, bexigas, vasos sanguíneos.

Produção em larga escala de tecido é um problema de engenharia, não um salto de fé científica.

Como está agora, há cinco passos que Modern Meadow usará para a cultura de tecidos, couro e alimentos.

Passo 1 - Coleta de células por punção tecidual de animais doadores, que podem ser de animais que já foram utilizados no processo de fabricação de couro e alimentos, ou animais exóticos normalmente mortos por sua pele. Isolar as células extraídas e, eventualmente, fazer modificações genéticas benéficas para couro. Forgacs diz que células destinadas à produção de carne não seriam modificadas geneticamente.

Passo 2 - Proliferam as milhões de células extraídas em bilhões e bilhões em um biorreator ou outro aparelho de crescimento. Os produtos são centrifugados para eliminar o meio de cultura e, em seguida, as células são fixadas em conjunto para criar esferas de agregados celulares.

Passo 3 - Os agregados celulares são colocados em camadas conjuntas permitindo a fusão entre si, num processo denominado bio-montagem. A Modern Meadow está considerando uma série de técnicas para isso, incluindo Impressão 3D de tecidos.

Passo 4 - As células recém-fundidas são colocadas em um biorreator para amadurecerem. "Nós criamos o precursor embrionário e no biorreator aplicamos os sinais físicos para deixar a natureza tomar conta", diz Forgacs. "Isto estimula a produção de colágeno no caso das células que se tornarão couro, e crescimento muscular nas que se tornarão carne".

Passo 5 - Depois de várias semanas, encerra-se o fornecimento de alimento. Pele é convertida em couro. Tecido muscular e gordura são convertidos em alimento. Pelo fato do couro não possuir pêlo ou por ser um tecido mais resistente que a pele, ele passa por um processo abreviado de processamento que diminui a quantidade de produtos químicos tóxicos necessários.

"Nada do que estamos fazendo requer um salto de fé científica", Forgacs diz. "Não há quem não esteja confiante com a ciência que estamos usando. Isto não é sobre os riscos científicos, é sobre desafios de engenharia."

Como a produção pode ser manipulada com diferentes tipos de células é possível tentar produzir alimentos funcionais com teores maiores de nutrientes, assim como reduzir também a quantidade de substâncias que fazem mal à saúde como, por exemplo, colesterol. Mas ainda há muito o que se pesquisar, e discutir, antes de pensarmos em imprimir nosso filé de cada dia.

Tradução, adaptação e comentários de Priscila Montanheri, médica veterinária e analista júnior da Scot Consultoria.