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Código Florestal: sonhar paga imposto


Quarta-feira, 30 de junho de 2010 - 11h47

Professor universitário, especialista em direito empresarial, ex-procurador do banco central do brasil, procurador da fazenda nacional, autor dos livros curso de direito ambiental, código florestal comentado e multa ambiental (ed. atlas).


O Código Florestal de 1965 está em discussão na Câmara dos Deputados para uma adequação contemporânea. Há quase meio século, quando publicado, o café reinava praticamente sozinho do total das exportações brasileiras e a produção de soja era desconhecida. Éramos um país agrícola e agrário, vendedores de produto único e que, ainda mais grave, obrigatoriamente importava alimentos. Agricultura era primitiva: poucos insumos agroindustriais e baixa mecanização. Ninguém falava em impactos ambientais. Como não foi modificado ao longo desses anos, o código ainda reflete em um país que não existe mais. Hoje, somos o segundo produtor mundial de mercadorias agrícolas. Impossível ignorar esta crucial produção de alimentos no momento em que a FAO (Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação) divulga a necessidade de aumento em 40% da atual produção até 2030, indicando a América Latina como essencial para que isso ocorra. Outro foco ainda ignorado diz respeito às consequências econômicas da aplicação do Código como está. Usando dados exclusivamente oficiais (pesquisas realizadas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE e pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária - INCRA), calcula-se uma considerável redução da área produtiva pela efetiva implantação das “reservas legais”: 96 milhões de hectares deixarão de ser ativos na agropecuária brasileira. Com esta evidência, verificou-se o impacto macroeconômico por município, na quantia representativa da produção das áreas cultivadas, mas que deveriam estar em vegetação nativa, na proporção do atual Código Florestal. Ignora-se muito que a agropecuária integra diversas cadeias produtivas – compra insumos, produtos e serviços; venda de matéria prima – e que, por isso, os impactos da redução de área plantada podem cair com intensidade sobre a sociedade urbana. Para isto, um indicador altamente conservador, derivado de estudos públicos e acadêmicos (IBGE e UFV – Universidade Federal de Viçosa), apontou que para cada real perdido na agropecuária, outro R$1,82 se perderá nas outras partes da cadeia. Segundo os cálculos realizados, em valores de 2007, os impactos anuais diretos na agropecuária seriam de R$26,31 bilhões, mas, somados à redução na totalidade das cadeias produtivas, se atingiria a astronômica cifra de R$74,3 bilhões. Este valor, em 2007, correspondia aos atuais 55% da meta de crescimento estipulada pelo governo, o que reflete diretamente nos objetivos econômicos e sociais do país. O custo não é baixo, mas verificados os dados por município, em centenas deles, a perda representaria mais da metade do valor agregado bruto municipal, o que comprometeria irremediavelmente a saúde financeira daqueles entes federativos que já são os mais debilitados. Ou seja, o reflexo tributário produziria igualmente um contexto de lesão das finanças públicas. Verificada a distribuição das receitas nos diferentes níveis, a União deixaria de arrecadar R$13 bilhões por ano. No total, ao incluir estados e municípios, a aplicação do atual Código Florestal implica na perda total de R$22 bilhões aos cofres públicos por ano, com base nos valores de 2007. As cidades menores, com até 30mil habitantes, perderiam entre 7% a 15% do total de suas receitas. Isso significa 70% a 150% do orçamento de livre dispêndio desses municípios. Exemplo: Holambra – SP, a cidade das flores, com orçamento de R$26,3 milhões, deixa de arrecadar R$15,16 milhões de tributos (federais, estaduais e municipais), dos quais, direta ou indiretamente, R$2,51 milhões seriam do município (16,59%), significando redução de 9,53% de suas receitas no ano de 2007. Considerando os 15% destinados à saúde, os 25% da educação e os 48% a 50% vinculados à folha de servidores ativos e inativos, o impacto causado pela redução de área plantada irá tomar o resto do orçamento. O 0,47% restante será suficiente? Óbvio que não! Ocioso insistir sobre os demais impactos nos investimentos públicos sociais em cada município, ou ainda sobre os níveis de emprego. A manutenção das áreas com agricultura consolidada no país não pode ser vista como benefício individual. São de necessidade pública, na contínua geração de alimentos, empregos e receitas públicas. O tema é complexo. Idem a decisão legislativa. A manutenção do Código Florestal implica, por lógica matemática, a alteração da legislação tributária para mais (base de cálculo e/ou alíquotas), afinal as contas precisam ser pagas. Escolham sem alegar ignorância do preço. Mantida a atual regra florestal, pela primeira vez, sonhar “pagará imposto”.
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