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Scot Consultoria

O boi tem que pegar o bezerro


Terça-feira, 12 de abril de 2011 - 08h20

Administrador de empresas pela PUC - SP, com especialização em mercados futuros, mercado físico da soja, milho, boi gordo e café, mercado spot e futuro do dólar. Editor-chefe da Carta Pecuária e pecuarista.


Esta semana vamos conversar inicialmente sobre o bezerro. Repare no gráfico abaixo como anda os preços desse pequeno animal. Recentemente o pico de 2008 foi com um belo atraso, finalmente rompido. Vamos deixar desenhado no gráfico alguns estudos bem simples para a gente se localizar. Primeiramente temos essa linha preta pontilhada mostrando a prova dos 9 — o rompimento para cima do pico de 2008. Em segundo lugar temos os dois objetivos de preços para cima e para baixo — para onde esse pequeno animal poderá ir se quiser subir (verde) ou se quiser cair (vermelho). Os objetivos não são criação minha, mas são baseados nos estudos que o Dennis Gartman do The Gartman Letter faz. Lá ele chama esses objetivos de “the box.” Objetivos? Sim. Hoje o bezerro vale 780 reais. Se ele quiser continuar na alta, seu próximo objetivo vai para 825-850 reais. Por outro lado, se quiser cair, seu possível objetivo seria entre 675-700 reais. Não vou aborrecer você com o estudo atrás desses números, mas a coisa toda gera esse tipo de visualização, simples assim. Para onde vai? Você pode me perguntar. Difícil dizer, caro leitor. Se o bezerro tivesse subido junto com o boi lá atrás em 2010 te diria que era mais provável ele continuar a subir. Hoje, depois da alta espantosa do boi e o bezerro não indo atrás? Não sinto tão confortável assim. A verdade é que a retenção de fêmeas dos últimos anos está produzindo uma maior quantidade de bezerros. Não vou entrar em detalhes nisso agora, porque já venho falando isso várias vezes tanto aqui nos textos semanais, na Carta Pecuária de Longo-Prazo - nosso texto trimestral - e nas palestras que temos feito Brasil afora. Isso está relativamente fácil de enxergar no mercado. Bezerro não está em falta. Ok, sim, entendo, tem a questão do preço e tal, mas oferta não falta. O que quero dizer é que se você compara o mercado de bezerro e o mercado de boi magro, fica fácil distinguir qual dos dois está mais ofertado — no caso, o mercado de bezerro. Além disso, a realidade do Mato Grosso do Sul - que gera o gráfico acima e que são os preços oficiais de bezerro para a bolsa - pode não ser a realidade atual em outros estados, mas pode confiar. Se não é, será daqui a pouco. Cada estado tem seu tempo individual e até onde pude pesquisar, o MS puxa a fila em se tratando das viradas de mercado. O MS e o RS também, mas o RS responde a um mercado um pouco diferente do Brasil Central, por isso concentro a análise sobre o MS. Mas independentemente de ciclo pecuário, retenção de fêmeas e quantidade da oferta de reposição, o mercado do bezerro rompeu os picos de 2008 e é isso que nos importa no momento. Confesso a você que esse rompimento me pegou um pouco de surpresa. Não achava que ele teria força para a alta, mas força de alta é o está acontecendo. Isso obviamente gera um ambiente mais propício para a alta da arroba do boi, caro leitor. Se você observar esses gráficos abaixo você terá a visão mais abrangente do que quero dizer com pré-disposição para a alta. Mas peraí. Por que usar o bezerro no início do texto e rumar para o boi? Ora, porque para o bezerro não existe mercado futuro, é por isso. Não dá para a gente fazer muito mais do que comentar da situação atual do produto. Quem tem bezerros disponíveis agora encontra no estado atual do mercado, uma boa opção de comercialização de seus animais e deveria observar com carinho essa possibilidade. Posso falar isso com tranquilidade porque não gera nenhum conflito de interesse com o que faço – afinal de contas, não compro bezerros para engordar, só compro boi magro ou, em alguns casos, compro já o boi gordo para engordar mais ainda. Mas isso já é outra história. Então, a alta do bezerro gera implicações importantes para o mercado do boi. O boi, sim, a gente tem mercado futuro, tem também mercado de opções de futuro (seguro de preço) na bolsa, temos os contratos a termo dos frigoríficos, as Non-Deliverable Foward (NDF) do Banco JBS, etc. Temos alternativas. Dá pra fazer mais coisa. Uma das implicações começa nesse gráfico acima. Há uns anos atrás cunhei a frase “o teto do boi é o bezerro.” Repare que nos momentos de pico de preço o boi encontra a arroba do bezerro. Isso ocorreu em várias ocasiões, não só aqui neste gráfico de 2006 para cá. A última ocasião foi em 2010, no pico da arroba do boi a R$117,18. Atualmente a arroba do bezerro está girando entre 125-130 reais, elevando as apostas. Isso obviamente aumenta a temperatura do jogo, e joga ironicamente, um balde de água fria na possibilidade da arroba cair muito abaixo do que o contrato de maio está demonstrando hoje, abaixo de 100-101 reais. Só para diferenciar as coisas. O gráfico acima é o gráfico da arroba do bezerro contra a arroba do boi gordo, ok? Não é o preço do bezerro em si. Mas, então, se a gente quisesse comparar a arroba do boi com o preço do bezerro - o animal, quero dizer - como é que a gente faria? Faríamos o gráfico abaixo. Gosto demais desse gráfico. Ele mostra a valorização - em porcentagem - da arroba do boi e do bezerro desde os seus movimentos iniciais de alta do atual ciclo pecuário. Ou seja, definimos a linha de largada no início do ciclo pecuário, porém o bezerro iniciou a corrida um pouco antes do boi. “Ah, deixa eu parar de falar. Tem hora que falo demais. Observe o gráfico e veja por você mesmo.” Este é o gráfico mais importante deste texto. Repare a poesia, o ritmo, o enfrentamento e a redenção. O boi não tem escapatória. Ele tem que, eventualmente, pegar o bezerro. Pode demorar como ocorreu entre 2008 e 2009, mas uma hora a capitulação ocorre. Parece uma coisa óbvia, mas esse insight, essa idéia, você não verá em nenhum lugar a não ser aqui. Atualmente o bezerro voltou à liderança da corrida. O boi tinha passado na frente quando ele fez o pico do ano passado e devidamente jogando a taxa de reposição (não mostrada aqui) lá para cima, corrigindo em parte a distorção histórica. Quando a gente pensava que “hei, é isso aí, o boi fez o que devia fazer” vemos novamente o bezerro dizendo o seguinte: “Não, essa história ainda não acabou. O boi não ganhou de mim ainda. Tenho um gás, um Kers (da F1) para mais um tempo.” É exatamente isso que o mercado atualmente está demonstrando. O bezerro mudou as regras do jogo, caro leitor. O seu movimento de alta atual está nos dando sinais ainda mais contraditórios que já havíamos detectado no mercado futuro do boi desde dezembro passado. O mercado futuro está pessimista. Vimos que o mercado físico do boi nem de longe identificava na prática esse pessimismo todo, tanto tecnicamente nos gráficos, quanto no mercado de oferta versus demanda. Agora, com mais essa informação do bezerro, a “questão da entressafra” ganha mais um aliado para a banda altista. Hei, isso pode mudar, é claro. A alta do bezerro, como essa semana foi sugerida no Twitter, pode ser passageira. “Espere até a desmama entrar”, me foi dito. Ok. Vamos esperar. Mas até lá, um olho no peixe e outro no gato. Se o bezerro continuar a buscar preços acima de 800 reais, não deixe de olhar os contratos da entressafra na bolsa com carinho. Eles estarão especialmente interessantes num rebuliço desses. Mas Rogério, você está falando que a bolsa vai subir? Foi me perguntado também no Twitter. Não. Não estou dizendo isso. Aliás, nunca digo diretamente essas coisas. Se fosse dizer diretamente esse texto não seria de graça. Cabe a cada um interpretar as coisas que falo e tomar suas próprias decisões. Filosoficamente falando, levando a discussão para outro plano, a gente não sabe quando as coisas vão acontecer, mas dá para ver as distorções. Por exemplo, se a gente vê um sujeito andando na estrada a 200 km/h, talvez ele nunca vá sofrer um acidente, mas a gente sabe que mais cedo ou mais tarde isso pode acontecer. Quanto maior a distorção, ou seja, quanto maior a distância entre o que é e o que deveria ser, maior a margem de segurança, para ter certeza do que o bom senso e uma boa dose de observação nos dizem. É isso por hoje. Dois excelentes livros que exploram o tema ambos filosoficamente e literalmente: - Salve-se Quem Puder, de Edward Chancellor, e; - O Investidor Inteligente, de Benjamin Graham. Recomendo fortemente a leitura. Esses livros irão mudar a sua visão de mercado.
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