• Sábado, 20 de abril de 2024
  • Receba nossos relatórios diários e gratuitos
Scot Consultoria

Esquerda ou direita?


Quarta-feira, 16 de dezembro de 2009 - 10h57


Toda a atenção em Copenhague. Líderes mundiais, políticos e ambientalistas, cientistas e jornalistas discutem um acordo global sobre o clima. Entre o pessimismo e o otimismo, uma certeza: o aquecimento do planeta acende luz amarela para o futuro. Hora de ação. A crise ecológica vem de longe denunciando, agora definitivamente, a falência do modo de produção erigido nos últimos séculos. Tanto faz a cor ideológica. Capitalismo e socialismo nunca ligaram para a ecologia. Por isso o ambientalismo sempre mostrou dificuldades para ser politicamente rotulado. Ainda na época da guerra fria parecia bucólico discutir a depredação da natureza. Concorrendo entre si pela supremacia mundial, a ex-URSS e os EUA mostravam a mesma visão deturpada sobre o crescimento econômico. A poluição era vista, por ambos os lados, como o "preço do progresso". Os ambientalistas foram chamados pelos conservadores de "melancias", quer dizer, verdes por fora, vermelhos por dentro. Esse apelido se justificava mais pela novidade que os ecologistas representavam do que propriamente por suas posições políticas. Na esquerda socialista, sem nenhuma tradição com o tema ambiental, muitos os consideravam uma espécie de anarquistas verdes, chamados depreciativamente de "porras-loucas". Após o fim do comunismo e a distensão política mundial, grupos de ecologistas europeus fundaram os Partidos Verdes, mostrando certa independência da política tradicional. Ao mesmo tempo, as modernas questões ecológicas começaram a ser adotadas pelos antigos partidos políticos, sem distinção ideológica. Foi bom. Ao chegar ao Brasil, onde o sistema partidário sabidamente é mais frágil, uma miscelânea de posições confunde a coloração ideológica do ambientalismo. O antigo rótulo, aliás, anda confuso em geral. Como enquadrar o "chavismo"? Aparelhar o Estado pela companheirada soa a esquerda, em nome da revolução, ou a direita, nas vantagens pessoais? O MST, por exemplo, supõe-se pertencer à esquerda radical. Mas as invasões de terra invariavelmente destroem grandes remanescentes vegetais do País. Florestas são consideradas ainda "terra ociosa", nunca "reservas de biodiversidade". Na Amazônia, a motosserra que deita gigantes árvores não distingue assentamentos rurais de latifúndios. O dilema contemporâneo situa-se noutro contexto, fora do debate ideológico entre "esquerda" e "direita". Para o ambientalismo, pouco importa saber se o regime é capitalista ou socialista, neoliberal ou estatizante. A questão essencial reside na compreensão sobre o desenvolvimento, se sustentável ou predatório. Progressistas defendem as energias renováveis, para fugir do fóssil petróleo; conservadores defendem termoelétricas movidas a óleo combustível. Polêmica típica do século 21. Neste momento de transformação das economias mundiais, processo inescapável para o Brasil, a presença do Estado, atuando de forma ativa, será fundamental. Nada que ver, porém, com essa discussão tola, manipulada pelo lulismo, sobre governo "privatista" ou "nacionalista". Pura bobagem. A necessária descarbonificação das economias mundiais vai provocar grandes modificações no modo de exploração, na produção de riquezas e no padrão do consumo humano. Países como o Brasil só têm a ganhar nesse processo. Sua maior vantagem reside no potencial das energias renováveis, abundância invejada no mundo. Claro está que o mercado, por si só, jamais conseguirá, em tempo hábil, caminhar no sentido desejado do desenvolvimento sustentável. Poderá, talvez, com apoio de novas tecnologias e mudança de métodos, aprimorar suas técnicas, reduzindo parte da poluição. Mas o aquecimento global atesta que não basta consertar os estragos ambientais causados pelo crescimento da economia. Tampouco aprimorar as tecnologias mantendo o padrão de produção. Não. O porvir exigirá algo mais profundo, uma verdadeira revolução. Um novo paradigma. Quem supõe que a agenda ambiental freia o progresso raciocina de forma tradicional, conservadora, como se fazia no século passado. O pensamento progressista enxerga na necessidade de revisão do padrão civilizatório a chave para o sucesso da humanidade, construindo uma nova economia, a economia verde. Chega de emitir notas promissórias contra o futuro. Haverá longa e difícil transição, por décadas. Primordial, porém, será a compreensão do processo. Alguns países vão liderar a mudança, outros se tornarão retardatários. Certas empresas vão ganhar, outras perderão. Otimistas enxergarão oportunidades, pessimistas verão desgraças. Novos conceitos, novas ideias farão a diferença. Pensem no pré-sal. Sua exploração tenderá a agravar o fenômeno climático, em razão do elevado teor de CO2 que apresenta. Mas do limão pode sair uma limonada. Valerá a pena sua utilização se, na riqueza escondida nas profundezas do oceano, o país encontrar os recursos de que necessita para investir em limpas tecnologias e subsidiar a construção da economia de baixo carbono. O negro óleo ajudando o verde. Os céticos mostram descrença nisso tudo. Sempre foi assim. A percepção sobre os processos de mudança demora especialmente nas mentes cujas posições serão derrotadas pela História. Aconteceu na queda do Muro de Berlin. Fora os teimosos, aqueles que morreram sem acreditar que o homem tenha pousado na Lua. Heráclito dizia que não há nada permanente, exceto a mudança. Alinhar-se com as propostas ambientalistas exige superar os cacoetes da política tradicional, especialmente o ultrapassado debate entre direita e esquerda, liberal ou estatizante. O desenvolvimento sustentável aceita apenas um rótulo: o da modernidade.
<< Notícia Anterior Próxima Notícia >>
Buscar

Newsletter diária

Receba nossos relatórios diários e gratuitos


Loja