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Scot Consultoria

A lógica do contra-senso


Quarta-feira, 29 de novembro de 2006 - 11h03

O atual ministro do Desenvolvimento Agrário, oriundo do Rio Grande do Sul, um Estado com forte tradição agrícola, insiste que não há razão sequer para rediscutir a atual, e infeliz, dicotomia entre o seu ministério e o Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento. Para ele, agronegócio é uma coisa, voltado para exportação, que não gera alimentos para o mercado interno, que aumenta o número de máquinas no campo e traz desemprego. Agricultura familiar é outra, que produz alimentos para a nação, gera empregos, é ecologicamente correta, etc, etc.. Que miopia! É o continuísmo da falta de bom senso, a vitória do atraso e do preconceito sobre a razão. Essa divisão, em dois conceitos, de um conceito indivisível, causa e vai causar ainda muitas catástrofes nos momentos de decisão. É o presente arrebentando com o futuro, é a falta de plano, a falta de competência técnica, a falta de critério, a “achologia” ideológica no lugar da informação exata. Observe o exemplo da questão da produção de alimentos para consumo interno. A produção de carne de frango no Brasil foi modernizada com base nos conceitos do agronegócio. O objetivo era ampliar o mercado interno e exportar. Para tal, fazendas e indústrias precisaram se modernizar, agregar novas técnicas de produção, intensificar e garantir alta produtividade. Ocorreu a verticalização do processo da produção, que ficou conhecido como “integração”, onde os produtores trabalham praticamente atrelados à indústria. Recebem insumos e todos os protocolos de produção, o que garante a padronização do produto. No mercado interno, o consumo de frango saltou de 15 kg/habitante/ano no início dos anos 90, para cerca de 33 kg/habitante/ano em 2005. Um aumento de 120% no período. É evidente que o brasileiro melhorou o consumo de proteína neste período, visto que o frango não substituiu outras proteínas. Em questões nutricionais, e em acesso aos alimentos, não há dúvida que ocorreram ganhos. E mesmo assim as vendas no mercado internacional aumentaram. Atualmente cerca de 30% da produção de frango é exportada, segundo dados da Associação Brasileira dos Produtores e Exportadores de Frango (ABEF). Em 1991, apenas 12,7% da produção nacional foram para o mercado externo. No período, o Brasil aumentou quase nove vezes o volume exportado, ocupando também a atual posição de maior exportador no mercado internacional. A produção moderna objetivando o mercado internacional não exclui a melhoria e o aumento da produção de alimentos para a população interna. Não são posições antagônicas no mercado, mesmo porque o mercado brasileiro é grande e atraente. O ganho tecnológico e a produção empresarial garantem a redução de custos, o aumento da competitividade e o achatamento de margens nas fazendas e nas indústrias, que acabam por garantir a oferta de alimentos mais baratos para a população. A produção de frango é dependente da oferta de farelo de soja. A soja é outra cultura que a atrasada linha de raciocínio, que sempre impregnou o fora de propósito Ministério do Desenvolvimento Agrário, toma como alvo em suas críticas. A modernização da produção do frango força a modernização dos agricultores e agroindústrias que produzem os insumos para a sua produção: soja, milho, sorgo, algodão (caroço e farelo) entre outros. Este raciocínio se estende para a produção de carne bovina, suína, ovos, leite, lã, etc, etc.. Portanto, quando se moderniza um segmento de produção, diversas outras cadeias têm que se modernizar para atender a essas mudanças. É um processo lento, mas ocorre gradual e inexoravelmente. Na verdade, é esse o verdadeiro significado do termo agronegócio. Como seria possível excluir pequenos agricultores ou agricultores familiares deste conceito, se todo o mercado depende deste processo? Não há lógica na defasada linha de raciocínio que pensa o contrário. O achatamento das margens nas fazendas exige também o ganho da produção em escala. As exigências, em extensão de áreas e produtividade, começam a aumentar para diversas culturas. É preciso garantir escala na medida em que os preços vão se reduzindo. A agricultura empresarial, extremamente exigente em tecnologia, preconiza a rotação de culturas. Trata-se de uma exigência agronômica. Sem rotação, os agricultores colhem prejuízos. A cana-de-açúcar é produzida e rotacionada com outras culturas entre os seus ciclos. Planta-se soja e amendoim, entre um ciclo e outro. A corrente de pensamento que relaciona a exportação de soja, e a ainda insuficiência do milho em atender a demanda interna, com práticas condenáveis do ponto de vista ambiental é equivocada. A área de milho, comparando a média das últimas safras - de 2003 a 2005 - com o período de 1991 a 1993, reduziu-se em 4%. A produção aumentou em torno de 48%, proporcionando um ganho de produtividade acima de 53%. No mesmo período, a área de soja se expandiu em 110%, com a produtividade aumentando 27%. O aumento proporcional da produtividade da soja foi menor, por se tratar de uma cultura cujos produtores já trabalhavam com um pacote tecnológico elevado no início da década de 90. Já havia sido agregada tecnologia, quando comparado com outras culturas. Estes dados, quando não analisados a fundo, passam a falsa impressão de que tenha ocorrido um avanço desenfreado da “monocultura” da soja sobre a área de milho e outras culturas. No entanto, aprofundando a análise dos números divulgados pela Conab (Companhia Nacional de Abastecimento), percebe-se que a área de milho safrinha aumentou 227,5% no mesmo período, com um aumento de produtividade em torno de 94%. A produtividade do milho safrinha praticamente dobrou. O milho safra sofreu uma redução de 23,6% na área, também aumentando 53,7% a sua produtividade. O aparente “problema” da soja avançando sobre a área do milho é na verdade um ótimo sinal; sinal de que o produtor cada vez mais tem usado a mesma área para duas culturas em uma mesma safra. Sinal de que a técnica do plantio direto, que pressupõe a rotação de culturas, está crescendo a passos largos. É justamente o contrário da prática de “monocultura”. E mesmo nas áreas em que se planta soja, sem plantar a safrinha em seguida, os produtores também fazem periodicamente a rotação de cultura. Na tabela 1 estão descritas as evoluções da produção, área e produtividade de algumas culturas e do total dos grãos no período analisado. É a comparação da média das últimas safras, de 2003 a 2005, com a média obtida no período de 1991 a 1993. Atualmente, a área de milho safrinha representa pouco mais de um terço da área do milho safra. Na prática, o que ocorre é a “economia” de cerca 3,3 milhões de hectares. Essa área foi usada para outra cultura, geralmente a soja, e em seguida é usada para plantio de milho. Tal prática operacional é o “cartão postal” do potencial do agronegócio brasileiro. A atual produtividade média nacional do milho safrinha é praticamente a mesma obtida com o milho safra, média nacional. Porém, o milho safra é plantado em épocas favoráveis ao desenvolvimento da planta, enquanto o safrinha é plantado “fora de época”, quando a planta produz menos por questões climáticas e fisiológicas. Essa é mais uma prova de que a agricultura empresarial tem sido eficiente em agregar tecnologia, visto que agricultores de menor tecnologia plantam apenas o milho safra. E mesmo plantando em condições mais favoráveis, ainda assim operam com índices de produtividade menores em relação aos mais eficientes que plantam na safrinha em rotação com outras culturas. Na agricultura, nada pode ser mais ecológico do que fazer um hectare render a maior quantidade possível em produção, respeitando o meio ambiente. O impacto ambiental da agricultura de baixa tecnologia é pior do que o impacto da agricultura de elevado aporte tecnológico. Principalmente por que o uso de tecnologia demanda menor quantidade de área. O motivo que leva o Ministério do Desenvolvimento Agrário a insistir em tais pressupostos é meramente político, uma questão ideológica. Os números são contundentes. Parece que a luta pelo poder é superior à luta por soluções. Nesse ínterim, a sociedade vai sendo ludibriada com falácias agronômicas e econômicas sobre a agricultura. Faz-se de tudo para provar a necessidade de distribuição de terra. No entanto, não há relação alguma entre geração de emprego ou produção de riquezas com o volume de terra distribuído. O que existe, e é comprovado por números do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), é a relação entre geração de empregos e riquezas com o aumento da receita obtida com as vendas. Isso é real. Quanto maior a produtividade, maiores serão os resultados socio-econômicos. A receita obtida por unidade de área é maior. E quanto maior a produtividade, mais baixo tende a ser o preço dos alimentos, pelo mesmo motivo, ou seja, pela produção ser maior. Mais acesso a alimentos, maior número de empregos e menor necessidade de abertura de áreas. É incompreensível porque se insiste em maldizer a agricultura empresarial. Confundem empregabilidade entre empresas modernas e agricultura familiar, relacionando apenas o emprego direto na atividade agropecuária. Mesmo que um só homem, sobre um trator, possa trabalhar 500 hectares, diversos outros empregos terão sido gerados na indústria de insumos, na agroindústria, no comércio, transporte e na própria geração de recursos que serão despejados na economia. O agronegócio é responsável por 40% dos empregos brasileiros. Em trinta anos, a porcentagem de habitantes da área rural, em todo o mundo, cairá dos atuais cerca de 53% (números de 2000) para 39%, segundo informações do engenheiro agrônomo e ex-ministro Roberto Rodrigues, em entrevista à Revista Agroanalysis de outubro de 2006. Os empregos migram do campo para a cidade, não por aumento da pobreza no campo, mas em função da maior geração de riquezas, que impulsiona a modernização das cidades. Muito diferente das condições das famílias que foram assentadas pelos programas de reforma agrária. Vivem em péssimas condições, necessitando sempre de auxílio governamental, mal conseguindo retirar da terra o próprio sustento. Diversos estudos comprovam essa triste realidade dos assentados. Este é o contra-senso. Quanto maior a insistência nesta tese, maior a marginalização dos pequenos agricultores, com pouco acesso a tecnologia e informações. É difícil e caro inserir tais agricultores na agropecuária empresarial, sustentada, competitiva, moderna e contextualizada que o mundo exige. Serão, e estão sendo, marginalizados não pelo sistema de produção moderno, mas pela falta de um programa adequado de inserção tecnológica e mercadológica. Uma pena, mas é a realidade do país da demagogia política, onde a mentira prevalece sobre a verdade.
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