Artigo originalmente publicado no Broadcast Agro.
As altas consecutivas nas cotações do bezerro chamaram a atenção.
Essa alta mostra o ágio, a diferença entre a cotação da arroba do bezerro de desmama e a do boi gordo, em importantes praças pecuárias, como a do Mato Grosso, por exemplo. Na parcial de outubro, a cotação no Mato Grosso registrou o segundo maior preço para o bezerro de desmama no país, ficando atrás apenas do Mato Grosso do Sul.
Figura 1.
Ágio, em %, entre a cotação da arroba do bezerro de desmama e a do boi gordo, em Mato Grosso.
Fonte: Scot Consultoria
Em 2025, a cotação da arroba do bezerro de desmama tem se distanciado da do boi gordo.
A média do ágio em Mato Grosso, desde janeiro 2020 até outubro de 2025 (8/10), foi de 28,4%. Ou seja, esse pode ser considerado o ponto de equilíbrio dessa relação para o período analisado.
Em 2021, o ágio médio foi de 50,3%, caindo gradualmente nos anos seguintes até chegar em 20,9% em 2024. A partir de então, o indicador voltou a subir, registrando 28,9%, na parcial de 2025.
O mercado está numa fase de transição do ciclo pecuário, deixando para trás o maior abate do rebanho e avançando em direção à retenção de fêmeas, impulsionado pela valorização real do bezerro.
A seguir alguns fatores que têm ligação com esse cenário.
- Abates de fêmeas: desde 2022 o quadro foi de desestímulo à retenção de vacas e novilhas, com participação recorde de fêmeas nos abates de bovinos ano após ano.
No segundo trimestre de 2025, pela primeira vez na série histórica, compilada desde 1997, a quantidade das fêmeas superou a dos machos no abate de bovinos.
O aumento na participação de fêmeas no abate afeta a oferta futura de bezerros. Com mais vacas e novilhas sendo destinadas ao abate, diminui o número de matrizes para reprodução, reduzindo a produção de bezerros nos anos seguintes.
No curto prazo, esse movimento tende a ter efeito limitado sobre as cotações, mas, em médio e longo prazo, a menor oferta de fêmeas para reposição pressiona os preços do bezerro para cima (figura 2).
Figura 2.
Comportamento dos preços* do boi gordo e do bezerro de desmama em Mato Grosso (deflacionados pelo IGP-DI) e participação de fêmeas no abate total de bovinos no país.
*para 2025, os dados de abate referem-se ao primeiro semestre. Para os preços do boi gordo e do bezerro de desmama são até 8/10.
Fonte: IBGE e Scot Consultoria / Elaboração: Scot Consultoria
Desde 2022, a participação de vacas e novilhas no abate foi de crescimento. Em 2025, a quantidade de fêmeas abatidas, está maior que no mesmo período de 2024. Em função disso, a menor oferta de bezerros começou a ser sentida, o que tem contribuído para a firmeza das cotações.
- Maior atratividade pela cria: quando o ágio do bezerro sobe, vender a cria é mais lucrativo, o que incentiva os produtores a investirem na atividade de reprodução e reter matrizes, a fim de produzir bezerros.
No primeiro semestre de 2025, a venda de doses de sêmen aumentou 5,5% na comparação com o mesmo período em 2024. Além disso, houve crescimento de 18,6% na comercialização de botijões para armazenamento de sêmen, refletindo o aumento do interesse em técnicas reprodutivas e no aprimoramento genético do rebanho. Esse comportamento indica que os produtores estão atentos à valorização da cria e à eficiência produtiva para potencializar resultados econômicos.
Antes de falar das perspectivas do mercado, é importante abordar a relação entre a evolução técnica e a estrutura de mercado. Observe a figura 3.
Figura 3.
Quantidade de cabeças de bezerro de desmama que se é possível comprar com a venda de um boi gordo com 19@, em Mato Grosso.
Fonte: Scot Consultoria
A quantidade de bezerros comprada com a venda de um boi gordo tende a diminuir com o passar dos anos.
Vários fatores contribuem para esse cenário, e um deles é a evolução dos índices técnicos e a crescente aplicação da técnica agronômica. À medida que a produtividade aumenta, os custos fixos são diluídos, tornando a arroba engordada mais barata.
Assim, com a evolução dos índices zootécnicos e da eficiência destes dois últimos segmentos de produção, acontece uma defasagem, com a reposição do rebanho tendo uma demanda maior ou mais intensa, provocando o aumento do preço da arroba do bezerro, por exemplo.
Embora esse fator por si não explique movimentos extraordinários de preços, como a forte alta observada em 2021, ele representa uma tendência estrutural de longo prazo que não deve ser subestimada.
Vale ressaltar que, em outubro (8/10), tomando como referência o Mato Grosso, a relação de troca entre a venda de boi gordo de 19@ para a compra do bezerro de desmama foi a pior desde 2022. Esse cenário pode reduzir o ritmo dos negócios no curtíssimo prazo.
A expectativa para o mercado de reposição é de firmeza nas cotações, porém, sem a perspectiva de um “boom” como o observado em 2024.
Até setembro de 2025, a cotação média do bezerro de desmama em Mato Grosso subiu 60,6% em relação ao mesmo período de 2024. Na parcial de outubro (8/10), a cotação da arroba do bezerro estava em média, em R$418,79, 38,7% maior que a de outubro de 2024 (R$256,81/@). Esses números evidenciam uma alta consistente nos preços da categoria.
Outro indicador dessa tendência vem do ágio entre a cotação da arroba da desmama e a do boi gordo, que desde novembro de 2024 se mantém acima dos 30,0% - sinalizando que o bezerro segue relativamente valorizado frente ao boi terminado. Esse comportamento reforça a atratividade da atividade de cria e demonstra que a reposição continua com preços em ascensão.
Com relação à oferta, a elevada participação de fêmeas no abate de bovinos desde 2022 tem resultado em uma redução gradual do plantel de matrizes. Isto também é um fator que sustenta os preços da reposição. No entanto, vale relembrar que os abates, em quantidade de cabeças, ainda estão maiores que no mesmo período de 2024.
Com isso, mesmo com um cenário de preços mais elevados em 2025, o mercado ainda não entrou plenamente na fase de alta do ciclo pecuário, e sim, está em uma fase de transição. Para isso, será necessário observar uma redução mais expressiva no descarte de fêmeas frente aos anos anteriores.
O momento é estratégico para reforçar os investimentos na recria, visando a comercialização em 2026/2027 - quando o ciclo pecuário deverá estar na fase de alta, com preços mais atrativos tanto para o bezerro quanto para o boi gordo.
Por ora, o cenário é de mercado firme, sustentado por menor oferta e boa demanda, mas sem espaço, no curto prazo, para movimentos explosivos de valorização. O acompanhamento das condições de abate, retenção de fêmeas, das exportações e do clima será determinante para eventuais ajustes nas projeções.