Originalmente publicado no Broadcast Agro
Os Estados Unidos da América têm uma relação diplomática extensa com o Brasil. Foram, por muitos anos, um exemplo, seja em moda, entretenimento ou mesmo na alimentação.
Mas, nos últimos anos, essa relação ficou estremecida, seja pela competição de mercado (com a venda das commodities), ou por questões políticas.
Fato é que, neste momento, existem ameaças que devem impactar toda a cadeia produtiva brasileira. As tarifas-bases prometidas pelo presidente norte-americano, passariam a ser de 50% para todos os produtos brasileiros indiscriminadamente.
Essa tarifa inviabilizaria as exportações e, empregos. A indústria afetada, por exemplo, depende diretamente das importações norte-americanas, uma vez que representam 80% da exportação da indústria de transformação brasileira.
Em 2024 o EUA foi responsável por 12% das vendas brasileiras. E no primeiro semestre de 2025 praticamente manteve, com 12,1%.
Segundo a Confederação Nacional da Indústria (CNI), o impacto das tarifas seria de 0,16% do PIB brasileiro (aproximadamente R$20 bilhões). Isso para um ano, no acumulado de anos, o impacto será gigantesco, podendo chegar em R$175 bilhões (segundo a Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais).
E, para os Estados Unidos o impacto seria de 0,37%. Algo como US$102,5 bilhões (R$570,9 bilhões, na cotação de hoje).
Além disso, o saldo comercial do Brasil com os Estados Unidos é negativo em US$1,67 bilhão, e as exportações para lá representam menos de 2% do PIB brasileiro.
O impacto das tarifas deve se concentrar no agronegócio, com destaque para a carne bovina e seus coprodutos, como o sebo, do qual os EUA compram cerca de 95% do volume exportado, além do suco de laranja e do café.
Em 2025, até junho, os norte-americanos responderam por 12,2% da exportação brasileira de carne bovina in natura (Secex).
Entre fevereiro e maio de 2025, a exportação brasileira de carne bovina in natura para os Estados Unidos bateu recordes sucessivos – foram os maiores volumes já registrados para esses meses. O faturamento com as vendas aos americanos, de janeiro/25 a junho/25 foi de US$791,2 milhões.
Até então, o Brasil os preços da carne nacional eram competitivos, superando exportadores como Argentina e Austrália. No entanto, com a aplicação da tarifa adicional de 50%, essa vantagem desaparece, tornando a carne brasileira pouco atrativa no mercado norte-americano.
Hoje, o Brasil é relevante nas importações de carne bovina in natura dos EUA. Caso a carne brasileira fique cara, os norte-americanos terão de ampliar compras de outros países, o que tende a aquecer a demanda externa e pressionar os preços nos EUA.
Nesse contexto, a carne brasileira poderia voltar a ser competitiva indiretamente, o que reduziria as exportações, mas provavelmente não as eliminaria por completo.
Tabela 1.
Participação do Brasil nas importações de carne bovina dos Estados Unidos da América, em 2025.
Mês | Participação do Brasil |
---|---|
Janeiro | 32,5% |
Fevereiro | 16,5% |
Março | 21,3% |
Abril | 26,2% |
Maio | 31,9% |
Fonte: USDA / Elaboração: Scot Consultoria
Nesse cenário, o Brasil teria que redirecionar a carne a outros mercados com preços mais baixos, arcando ainda com os custos de reorganização logística. A boa notícia é que, por ora, a demanda global está crescendo acima da oferta, o que sugere espaço para absorver parte dessa produção.
Em curto prazo, a perspectiva é de que compradores norte-americanos antecipem compras para formar estoques antes que a tarifa entre em vigor, enquanto torcem por uma negociação entre os governos que reverta a medida.
Algo que, possivelmente esteja ocorrendo. Com os dados de exportação atualizados semanalmente, a terceira semana de julho está com recorde de volume embarcado e preço pago pela tonelada de carne bovina, em um comparativo feito semana a semana.
Caso isso não ocorra, o país terá de readequar destinos, lidar com novos custos e até considerar o mercado interno como escoamento parcial.
A compra de carne bovina dos Estados Unidos corresponde a menos de 2% da produção total de carne bovina brasileira. Mesmo assim está dando o que falar dentro do mercado, atrasando negócios, gerando instabilidade e quedas consecutivas nos preços.
A indústria, em um momento de boas margens, aproveita ainda do emocional do mercado, e derretimento dos preços no mercado futuro, para colocar pressão sobre a cotação do boi gordo.
O mercado futuro, em relação ao mercado físico, estabelece patamares de negociação próximos de R$320,00/@ do que os R$340,00/@ de há algumas semanas.
Porém, a oportunidade pode ter sido lançada. Uma nova janela de compra e investimento para grupos de pecuária. Pois os fundamentos de mercado apresentam um cenário futuro positivo, com menor disponibilidade de carne, e demandas aquecidas (tanto interna quanto externa).
E, também, a pressão sobre o presidente norte-americano deve ser grande, com possível revogação das tarifas. Mas, o futuro ficará apenas para os oráculos gregos.