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Galinhas livres de gaiolas e seus desafios

por Rodolfo Silber
Quinta-feira, 23 de junho de 2022 -09h30


O movimento nos últimos anos por parte do mercado consumidor, em busca de produtos que preconizem o bem-estar animal, está movimentando grandes empresas para que deixem de lado produtos provenientes de sistemas de produção tradicionais. 


Um produto que está passando por essa mudança são os ovos comumente conhecidos como de galinhas felizes ou livres de gaiola, do inglês cage free


Criação de galinhas livres e em sistema convencional 


A criação em sistema convencional baseia-se em gaiolas coletivas, com pouco espaço para exercerem seu comportamento natural, propiciando comportamentos agressivos e a competição. 


Já o sistema de criação de galinhas livres de gaiolas, possui como princípio o desenvolvimento do bem-estar animal e a qualidade do produto. As galinhas têm circulação livre com acesso à água e comida, desestimulando a competição. 


Sabendo que o bem-estar de um animal deve atender ao estado físico, mental e natural através da nutrição, do ambiente, saúde, comportamento e estado mental (Fraser et al., 1997), esse sistema proporciona às aves a oportunidade de expressar seus comportamentos naturais, como colocar ovos em ninhos, ciscar e empoleirar, reduzindo o estresse e aumentando o conforto. 


O foco deixou de ser apenas a produção, tendo o bem-estar animal como uma forma de agregar valor e aumentar a qualidade do produto. 


Dentro da granja


A densidade de aves, qualidade da cama, presença e distribuição de poleiros, ninhos e espaços de livre movimentação são métodos que permitem atender às necessidades básicas do comportamento natural das aves. 


As instalações devem fornecer conforto térmico e proteger de medo e aflição, permitindo que as aves expressem o comportamento natural. Já as estruturas devem evitar a incidência direta de raios solares, permitindo boa ventilação e dispersão de gases, evitando a entrada de predadores e parasitas. 


O ambiente deve ser confortável para as aves, considerando a temperatura, umidade e a concentração de gases como amônia, dióxido de carbono e sulfeto de hidrogênio, além da poeira inalável. 


As aves devem receber uma dieta equilibrada em cada fase da vida, com condições adequadas para alimentação, descanso e locomoção. Não se deve usar medicamentos com o objetivo de acelerar o crescimento, sendo utilizados apenas para tratamento de doenças. 


A legislação brasileira não especifica a criação de galinhas no sistema livre de gaiolas, existem apenas protocolos de boas práticas agropecuárias que atendem parâmetros internacionais. Um deles é o manual de boas práticas para o bem-estar de galinhas poedeiras criadas livres de gaiola (EMBRAPA, 2020). 


A certificadora Certified Humane Animal Care possui diretrizes para produção de ovos no sistema livre de gaiola para a obtenção do certificado da propriedade, garantindo que o produto provém de produtores que atendem às exigências de bem-estar animal. 


Desafios 


Os motivos que motivaram a adoção do sistema de produção em gaiolas retornam ao deixar as aves em sistema "livre". Como principais desafios para a produção livres de gaiola destaca-se: 


• O contato com o chão, que expõe as aves ao contato com o esterco e, por sua vez, com patógenos bacterianos como a Escherichia coli e Salmonella ou parasitários como a coccidiose, resultando na má absorção de nutrientes por problemas intestinais, redução na qualidade da casca e até a morte. 


• Aumento na mortalidade devido a excesso de bicadas e canibalização. As aves por natureza são propensas a comportamentos agressivos, podendo variar entre as linhagens. A interação no sistema livre tende a desenvolver uma hierarquia entre as aves, podendo as "dominantes" prejudicarem as mais fracas. 


• O controle da amônia no ambiente de criação livre tende a ser dificultado pela poeira levantada pelas aves durante os pequenos voos. Além da poeira, lesões em decorrência de acidentes durante o voo e o pouso podem ocorrer. 


• Em relação ao meio ambiente, o maior gasto energético pela movimentação das aves resultará no aumento da alimentação quando comparado com o sistema tradicional, desencadeando a maior necessidade de grãos e maior área para cultivo, resultando no aumento da pegada de carbono. 


• Os custos de produção também são impactados no sistema livre, além da estrutura necessária, a menor densidade, maior necessidade de mão de obra e os cuidados adicionais tornam a atividade mais onerosa. 


O que esperar para o futuro? 


Apesar do interesse por parte do mercado consumidor, o custo mais elevado dos ovos provenientes do sistema livre de gaiolas pode limitar a demanda, principalmente em uma economia fraca. 


Caso os desafios sejam superados, por exemplo, com o aumento da eficiência, linhagens adaptadas ao sistema de produção, controle do ambiente e redução de custos, o preço para o consumidor pode ficar atrativo e a produção da indústria pode ser incentivada. 


Bibliografia consultada


BROWN, John. Cage-free hen housing: How far will the pendulum swing?. Disponível em: Cage-free hen housing: How far will the pendulum swing?.


EMBRAPA. Manual de boas práticas para o bem-estar de galinhas poedeiras criadas livres de gaiola / Iran José Oliveira da Silva, Paulo Giovanni de Abreu, Helenice Mazzuco /. Concórdia: Suínos e Aves, 2020.


FRASER, D.; WEARY, D. M.; PAJOR, E. A.; MILLIGAN, B. N. A scientific conception of animal welfare that reflects ethical concerns. Animal welfare, v.6, p.187-205, 1997. Disponível em: A scientific conception of animal welfare that reflects ethical concerns.


NERNBERG, Lesley. Cost differential between cage-free laying systems. Disponível em: Cost differential between cage-free laying systems.


TABORDA, José Valmir da Silva, et al. Certificação da produção de ovos em sistemas cage free. Descalvado: Universidade Brasil, 2018.