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Ponderações sobre a pesagem de bovinos

por Sergio Raposo de Medeiros
Quarta-feira, 15 de julho de 2020 -10h30


A pesagem de bovinos é uma atividade relativamente simples, mas extremamente importante na pecuária de corte, uma vez que o ganho de peso do animal, mesmo que seja intrauterino, é o que sustenta a atividade.


O objetivo desse texto é elencar vários pontos ligados à pesagem que podem ajudar a melhorar a qualidade dos dados obtidos e, portanto, permitir melhores decisões.


Apesar de, agora, contarmos também com alternativas automatizadas, como balança de passagem no campo e até estimativa de peso por imagem, a maior parte das dicas aqui elencadas servem para a pesagem convencional no curral, seja ela mecânica ou eletrônica.


As dicas e informações estão elencadas a seguir:


1. Acurácia e precisão: No dia a dia esses termos são usados como sinônimo e, quase sempre nos referimos à “peso preciso”, quando realmente queremos dizer “peso acurado”. No contexto de uma boa pesagem, eles são termos complementares e devemos perseguir ambos. No rigor dos termos, um peso acurado é o peso verdadeiro, que fielmente representa o que está sendo pesado. Se, além de ser o peso verdadeiro, ao se pesar o mesmo animal em seguida, ele repetir sempre o mesmo valor (ou valores muito próximos), além de acurado, ele é preciso. Por exemplo, se o boi pesa 300kg e o pesamos numa balança “A” por cinco vezes e ela registra cinco vezes cravados 360kg, ela é extremamente precisa, mas tem baixa acurácia. Inversamente, podemos ter outra balança, “B”, que não repete nenhum peso, mas o peso mínimo é 298kg e o máximo, 302kg. Ela, portanto, é menos precisa que a “A”, mas tem boa acurácia, mais do que suficiente para pesar os animais. Evidentemente, muito da acurácia e da precisão dependerá da qualidade da balança, mas, assumindo a premissa que seja boa, há muitos outros pontos que devem ser observados para uma pesagem que nos dê os pesos reais dos animais (acurados) e com baixa variação (precisos).


2. Ambiente de trabalho tranquilo: Esse é um ponto importantíssimo, tem muito a ver com a máxima que “a pressa é inimiga da perfeição”, mas vai além disso, pois, quanto mais tranquilo o pessoal envolvido, mais cedo o trabalho termina. É, sim, contraditório, mas, depois de mais de 30 anos trabalhando em currais nos mais diversos lugares, não tenho dúvida de que uma equipe que trabalha mais calma, muitas vezes respeitando o tempo do animal, faz o mesmo serviço em menos tempo do que uma que, ainda que com a melhor das intenções, tenta apressar sua conclusão. Além de demorar mais, as pessoas ficam mais cansadas e os animais mais estressados, quando não machucados. Em uma situação mais harmônica é evidente que o momento crucial da pesagem tem mais chance de ser bem feito e, portanto, de dados mais confiáveis obtidos. 


3. Manutenção da balança e limpeza do local: Seja qual for o tipo da balança, mecânica ou eletrônica, há no mercado excelentes opções e a recomendação é não economizar na compra, pois é um equipamento que, desde que bem cuidado, dura muito tempo. Um ponto muito importante é manter toda a estrutura limpa. O maior risco da sujeira no local da balança, é quando ela interfere no livre funcionamento da plataforma que o animal se apoia, roubando parte do peso que deveria estar indo para a balança, ou seja, o peso do animal será subestimado. Essa é uma situação comum de acontecer e nem sempre é percebida. No item 7, há uma sugestão de como identificá-lo ao longo da pesagem. O importante é que o curso da plataforma deve estar o tempo todo desimpedido.


4. Planilha de pesagem: Em sistemas eletrônicos, muitas vezes a anotação em papel é desnecessária. Todavia, para ter uma retaguarda em caso de haver algum problema eletrônico inesperado, como a perda de um arquivo ou coisa parecida, sempre gostei de fazer anotações dos pesos. Apesar dessas ocorrências serem cada vez mais raras, a planilha pode ter outras vantagens: (i) fazer anotações gerais sobre o trabalho e particulares sobre cada animal; (ii) facilitar correções; (iii) dar uma boa ideia do andamento do serviço e (iv) ajudar a identificar erros de pesagem. No caso desse último, a dica é colocar na planilha o peso anterior do animal, de forma que, havendo um peso muito inesperado, pode-se fazer uma checagem se, por exemplo, a identificação foi feita errada e, na verdade, é outro animal que está na balança. Além disso, constatando-se ser o animal corretamente identificado, pode-se tentar entender o motivo que o levou a ter um peso tão diferente, permitindo a correção de algum problema.


5. Aferindo a balança, antes de começar: Uma boa prática antes de começar a pesagem é testar a balança. Uma forma prática de fazer isso é usar o próprio peso das pessoas envolvidas na pesagem, primeiro porque elas sabem aproximadamente quanto pesam, para validar se a balança parece certa. Em segundo lugar, uma vez de posse do peso individual delas gerado na balança é possível pedir para que, uma a uma, elas se coloquem na plataforma e ver se a soma de cada pessoa a mais “bate” como valor esperado da soma. O ideal é que se chegue perto do peso dos animais a serem pesados, mas, se os valores de três a quatro adultos acumulados fiquem dentro do esperado, não costuma haver problema em extrapolar. Considerando 3 a 4 adultos com 70kg, teríamos o peso total de 210 a 280kg e ao pesar animais com mais do dobro disso, pode-se esperar um comportamento linear. Na dúvida, se possível, arrebanhe mais gente. Se no processo de ir colocando as pessoas for constatado desvios, a balança deve ser encaminhada para a manutenção. Mais informações sobre aferição de balança podem ser encontrados no texto "Fábrica de ração: dez pequenas dicas para grandes resultados"  


6. Identificação dos animais: Mesmo em lugares onde há leitura de brincos eletrônicos, há grande chance de os números que identificam o animal sejam “cantados”. Aqui temos um ponto crítico e números cuja pronúncia tem som parecido podem ser (e frequentemente são) confundidos. A dupla três e seis é a campeã, mas, no calor da pesagem, com fontes diversas de barulho, outras trocas menos óbvias também acabam ocorrendo (e esse é outro motivo para ter um ambiente tranquilo). Sugestões de padronização: (i) passar, em alto e bom som, cada número separadamente, (ii) jamais falar “seis”, mas substituir por “meia-dúzia” e (iii) evitar ajudar quem esteja lendo o número, quando este estiver com dificuldade para vê-lo. O problema de ajudar é que você pode induzir ao erro, pois se ele esta com dificuldade para ver se é um “oito” ou “zero” e você, olhando na planilha, vê que o animal 6380 não foi pesado e ajuda dando essa deixa, a pessoa pode, depois que você falou “6380”, enxergar um “zero” onde, caso se esforçasse mais um pouco (as vezes passando um água na marca), conseguiria perceber se tratar de um oito. Se isso ocorrer, todos perceberão o erro quando o 6380 aparecer de novo para ser pesado ou só faltar o peso do “6388”.


7.Testando a balança, ao longo da pesagem: Outra boa prática é, ao longo da pesagem, testar a balança. Assim, a cada determinado número de animais pesados, alguma das pessoas que foi pesada no início, pesa-se para ver se o valor é igual (ou muito próximo) ao inicial. Um dos motivos para diferença, pode ser que a plataforma da balança acumulou sujeira sobre ela. Se for isso, é só reajustar o zero da balança com o contrapeso (no caso da mecânica) ou, no caso de balança eletrônica, acionar o botão “tara” que faz a balança zerar, desconsiderando o peso do que está acima dela. Se persistir o problema, pode ser também sujeira, mas como comentado no item 2, sob a plataforma. Nesse caso, é necessário limpar. Uma observação importante é que, ao pesar apenas uma pessoa, o curso que plataforma desloca pode ser insuficiente para chegar até o ponto onde a sujeira começa a “roubar” o peso da balança, ou seja, o problema não será percebido pesando apenas essa pessoa, mas apenas quanto colocar peso suficiente para que o deslocamento do curso da balança chegue até o ponto em que sujeira começa a interferir com a pesagem. Exatamente por ser mais difícil de identificar que é importante fazer essa limpeza previamente e se preocupar em manter o local limpo ao longo de toda pesagem.


8. Cuidado com o próximo animal a ser pesado: Como comentado, para conseguir o peso acurado do animal, no exato momento que se anota o peso (ou até ele estabilizar na balança eletrônica), a plataforma tem que estar submetida apenas à força peso do animal sobre ela. Um dos riscos de pesos errados é por conta do próximo animal na fila para ser pesado encostar na plataforma. Nesse caso, é importante que todos os envolvidos com a pesagem atentem para não deixar que isso aconteça.


9. Mãos ao alto: De maneira semelhante aos animais, as mãos dos envolvidos com o manejo do animal podem também interferir na pesagem. É muito comum pessoas colocarem a mão, se apoiarem, mexerem em controles ligados à plataforma o que, no mínimo vai fazer demorar mais para a balança estabilizar e, de forma geral, piorar o dado da pesagem. No caso das balanças eletrônicas, elas costumam ser imunes aos pequenos trancos, mas, se alguém apoiar, o peso será superestimado ou, dependendo do jeito que se apoiar, até subestimar o peso do animal.


10. Se parecer errado, deve estar errado: A última dica é para tentar ir criando padrões com a imagem dos animais, de forma a treinar o olho e ser capaz de não errar muito em relação ao peso na balança. Uma vez que se tenha confiança no seu “olhômetro” pode-se confiar nele para identificar problemas com a balança. Assim, se ao olhar o animal, o peso na balança criar algum desconforto é porque provavelmente há algum problema e vale a pena investigar. Na pior das hipóteses, se o peso estiver certo, foi mais uma chance para melhorar essa habilidade.


Que as próximas pesagens dos bovinos sejam mais tranquilas e com dados acima de qualquer suspeita, sem ganho de peso falso e, muito menos, pesos reais não sendo contabilizados. São situações que, seja ganho a mais ou a menos, tudo é perda.