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Carta Boi - Expectativas para o boi gordo

por Hyberville Neto
Segunda-feira, 8 de junho de 2020 -17h15


Nesta edição da Carta Boi abordamos pontos que devem afetar os preços do boi gordo nos próximos meses. 


A quantidade de variáveis que influenciam o mercado e estão na mesa e neste momento faz desta, uma tentativa quase insolente. Por isso, de antemão, ressaltamos que não há bola de cristal, mas desenharemos um cenário esperado. 


Mercado doméstico


Segundo o Relatório Focus do Banco Central, as projeções são de queda de aproximadamente 6,5% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro em 2020. No primeiro relatório de junho (05/6), completamos dezessete semanas consecutivas de recuos nas estimativas deste indicador.


Há diversos cenários sobre a curva de recuperação da economia, mas a ocorrência de redução brusca é unânime. Para a carne bovina, isto afeta negativamente o consumo. 


No entanto, paralelamente, temos o processo de diminuição do isolamento social. À medida que a circulação de pessoas e dinheiro aumenta, com a reabertura de restaurantes e bares, a tendência é de aumento da demanda. Além disso, o consumo de carne bovina no segundo semestre normalmente é melhor, mais um ponto positivo.


Ou seja, temos um movimento de crescimento do consumo, com menor isolamento, mas o “ponto de chegada” desta demanda será menor que o esperado antes da pandemia, pela situação econômica.  


A evolução dos casos pode fazer com que este movimento de reabertura desacelere ou mesmo recue em determinadas regiões, mas redução de isolamento é a tendência nestes próximos meses. É algo a ser acompanhado de perto.


Exportações


A demanda chinesa por proteínas segue forte e o “resto” do mundo está diminuindo os níveis de isolamento, o que gera os efeitos positivos para a demanda, os mesmos que esperamos para o Brasil em um futuro não distante. 


Nos Estados Unidos, com as eleições no segundo semestre, devemos prosseguir com um cenário turbulento frente à China. O presidente norte-americano deve utilizar tensões com a China politicamente, como resposta ao país de origem do vírus. Lembrando que tudo isto impacta o câmbio. 


O governo chinês recomendou às estatais que reduzam as compras de soja e carne suína do país. Cabe a ressalva de que no primeiro quadrimestre, as vendas de carne suína norteamericana à China haviam crescido 289% em volume, segundo a U.S. Meat Export Federation (Federação dos Exportadores de Carne dos Estados Unidos). 


Não é carne bovina diretamente, mas a demanda maior por carne suína brasileira pode colaborar com os preços da carne bovina no mercado doméstico, diminuindo a pressão sobre a carne de frango e suína nos últimos meses. A propósito, os embarques de carne suína estão fortes.


A Austrália teve plantas proibidas de exportar à China no início de maio, impedimento possivelmente relacionado a questões relacionadas à covid-19, e com declarações de autoridades australianas.


Há quem diga que essa associação (dos embargos à covid-19) é exagerada, mas para quem teve, como nós, a Rússia como um dos principais clientes por muito tempo, sabe que há mais questões relacionadas a embargos que as que possam oficialmente ser adicionadas a uma nota. 


Oferta geral


Pergunte sobre reposição a um recriador ou invernista. A explicação sobre a oferta atual começa com essa reposta, ou com o sorriso que a mesma pergunta provocaria em um criador. 


Desde meados de 2018, as cotações da reposição têm trabalhado em forte alta. Mesmo com o mercado do boi gordo correndo fortemente atrás do prejuízo no segundo semestre de 2019, a reposição seguiu firme na toada dos preços. O mercado não “esticou” subitamente em outubro e novembro, não na mesma magnitude do boi gordo, mas não arrefeceu nos meses seguintes, com a fraquejada do boi gordo. 


Preços em alta geram retenção de fêmeas. Segundo os dados parciais do IBGE, no primeiro trimestre de 2020 houve recuo de 9,2% nos abates do primeiro trimestre, na comparação ano a ano. Os números definitivos devem mudar um pouco, mas sem alteração na tendência.


A retenção de fêmeas para a produção de bezerros, valorizados, é o principal vetor da redução da oferta de bovinos para abate. 


Com a exigência de animais de no máximo 30 meses de idade pela China, temos uma demanda adicional de novilhas para abate, mas se o observado em 2019 continuar, a retenção de vacas tende a superar em volume a venda “adicional” de novilhas. O resultado é uma oferta menor agora e um efeito, a ser acompanhado, do efeito do abate das novilhas sobre a oferta futura. 


Além da disponibilidade geral de gado afetada pelos abates de fêmeas no passado, diminuindo nascimentos, e pela retenção destas atualmente, temos as expectativas para o confinamento.


Confinamento


Enquanto o bezerro valorizado estimula a cria, o boi magro em alta impacta fortemente a viabilidade do confinamento. O contrato futuro para outubro de 2010 chegou à casa de R$176,00/@ em meados de março. 


Atualmente (5/6) já está próximo de R$210,00/@, à vista. Com o milho cedendo, devido ao início da colheita da safrinha e à demanda geral pelo cereal afetada pela pandemia, as contas já voltam para o azul, mesmo com os preços do boi magro. 


Lembrando que o gado fechado atualmente será ofertado a partir de meados de agosto, se considerarmos que o boi magro “já estava no brete”, só esperando a viabilidade dos futuros e milho. Se a compra da reposição ainda for ser feita, estamos falando de preços futuros de hoje afetando oferta lá para setembro. 


Considerações finais


A disponibilidade de gado de confinamento do curto prazo é aquela do rebanho fechado em momento de preços futuros muito pouco atrativos. Ou seja, não devemos ter oferta grande de gado confinado por um tempo. 


Mesmo mais para o final do ano, esta oferta maior de cocho que pode vir, com a ajuda dos preços futuros, deverá chegar em um momento de exportações em bom ritmo e economia brasileira “rodando” um pouco melhor. 


Com isto, esperamos um cenário positivo de preços para o boi gordo, mas sempre sair do risco é uma boa alternativa. Aproveitar um momento otimista dos preços futuros, nesta lacuna de oferta esperada para o curto prazo, para travar mínimos dos contratos para o final do ano, pode ser uma boa alternativa.