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Carta Conjuntura - Carne cultivada e “carne” vegetal: você sabe a diferença?

por Alcides Torres
Sexta-feira, 8 de novembro de 2019 -17h00


A crescente demanda por alimentos, assim como a adoção de hábitos alimentares que excluem alimentos de origem animal da dieta, estão impulsionando o desenvolvimento de pesquisas voltadas à fabricação de produtos que se assemelham à carne. Diversos estudos apontam que a carne é uma das melhores fontes de proteína, tanto em qualidade como em quantidade. Dessa forma, para os adeptos do vegetarianismo ou veganismo, é fundamental que haja alternativas e boas disponibilidades de produtos vegetais ricos em proteínas, a fim de sanar as quantidades necessárias para uma dieta com restrição à carne
(MONTEBELLO e ARAÚJO, 2009).


Carne in vitro


A tecnologia da carne cultivada em laboratório tem o objetivo de desenvolver produtos com reduzida ou nula participação do animal propriamente dito (STEPHENS et al., 2018).A carne sintética é um campo emergente da agricultura celular e sua produção em escala comercial está sendo projetada (MATTICK; LANDIS; ALLEMBY, 2015). Entretanto, para a carne sintética se tornar um produto viável de ser produzido e comercializado em larga escala, é necessário que alguns fatores sejam aprimorados, como por exemplo reduzir o custo de produção (HOCQUETE, 2016).


É importante ressaltar que a carne de laboratório se distingue das “carnes” baseadas em plantas. Enquanto a primeira é produzida a partir do cultivo das células estaminais (células que têm a capacidade de se autorrenovar e de se dividir indefinidamente) de determinado animal, em meio adequado com nutrientes e fontes de energia (BHAT et al., 2015), a segunda tem como base produtos de origem vegetal. Além disso, atualmente, as carnes à base de plantas têm sido comercializadas, ao contrário da carne in vitro, que ainda não é produzida em larga escala. Alguns fatores responsáveis pela dificuldade do crescimento da fabricação de carne in vitro são os custos de produção, a aparência, já que a cor é, na maioria das vezes, o atributo mais importante no momento da compra de carne (EIRAS, et al., 2016), assim como o sabor e a segurança do alimento.


Carne vegetal no Brasil


Em função do crescimento desse cenário da carne artificial, no Brasil, a startup Fazenda Futuro lançou em maio deste ano o “Futuro Burguer”, hambúrguer 100% vegetal, cujos componentes são grão de bico, proteína isolada de soja, proteína de ervilha e beterraba, que confere a cor avermelhada ao produto. O hambúrguer vegetal já está presente em alguns supermercados e possui média de preço entre R$16,99 e R$17,99 a bandeja (230 g) com duas unidades. Conforme levantamento da Scot Consultoria, em São Paulo, o hambúrguer vegetariano custa 187,9% a mais que o hambúrguer de carne bovina, 170,1% a mais que o hambúrguer de frango e para suíno, essa diferença salta para 291,8%. Vale ressaltar que, de acordo com a StartSe, startup brasileira levará o “Futuro Burguer” para Uruguai e Paraguai até o final de agosto de 2019, e, em setembro do mesmo ano, o Chile receberá o hamburguer à base de plantas.


Outra empresa que apostará na produção e comercialização de hambúrger vegetal no Brasil é a Marfrig Global Foods, em parceria com a empresa americana ADM (Archer Daniels Midland Company). A Marfrig é uma das líderes mundiais em produção de carne bovina, possuindo 22 unidades de abate, 12 de processamento e 8 centros de distribuição localizados no Brasil. Segundo projeções, o novo produto deverá chegar ao mercado nacional ainda esse ano e será feito na unidade da empresa, em Várzea Grande (MT). De acordo com a Marfrig, o hambúrguer vegetal poderá ser exportado. Além da fabricação do hambúrguer, a parceria entre as empresas visa o desenvolvimento de outros alimentos similares, mas sem origem animal. 


Impactos no consumo e na cadeia da carne 


Dados da USDA apontam que, no Brasil, desde os anos 2000, o consumo de carnes que era de 74,4 kg per capita, passou para 100 kg per capita em 2018.Tais números correspondem a um aumento de 8,11% no consumo de carne bovina, 37,69% de carne suína e 62,42% de carne de frango. Um importante fator atrelado ao aumento do consumo que deve ser destacado é a melhoria do poder de compra do consumidor. Além disso, é fundamental salientar que, segundo as expectativas da USDA em relação à produção de carne bovina, espera-se que o Brasil supere, pela primeira vez, a marca dos 10 milhões de toneladas em 2019. 


Figura 1.
Evolução do consumo de carne bovina, suína e de frango no Brasil.

*Projeções.
Fonte: USDA/Elaborado pela Scot Consultoria – www.scotconsultoria.com.br 


Texto com coautoria de Maria Eduarda Masculi.


Referências 


Bhat, Z. F., Kumar, S. & Fayaz, H. 2015. In vitro meat production: Challenges and benefits over conventional meat production. Journal of Integrative Agriculture, 14, 241-248.


Eiras, C. E., Guerrero, A., Valero, M. V., Pardo, J. A., Ornaghi, M. G., Rivaroli, D. C., Sañudo, C. & Prado, I. N. 2016. Effects of cottonseed hulls levels in the diet and aging time on visual and sensory meat acceptability from young bulls finished in feedlot. Animal, 11, 529-537. 


HOCQUETE, J. F. Is in vitro meat the solution for the future? Meat Science, v. 120, p. 167- 176, 2016. 


MATTICK, C. S.; LANDIS, A. E.; ALLEMBY, B. R. A case for systemic environmental analysis of cultured meat. Journal of Integrative Agriculture, v. 14, n. 2, p. 240-254, 2015. 


Montebello, N.P.; Araújo, W.M.C. (2009). Carne & Cia. 2.ed. v.1. Brasília: Senac-DF, 324p. Moulin, Monique Moreira. (2010). Coleta, caracterização e conservação de variedades locais de batata-doce (Ipomoea batatas L. Lam) do Norte do Estado do Rio de Janeiro. Dissertação – Mestrado em Genética e Melhoramento de Plantas. Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro. Janeiro.


STEPHENS, N.; SILVIO, L. D.; DUNSFORD, I.; ELLIS, M.; GLENCROSS, A.; SEXTON, A. Bringing cultured meat to market: technical, socio-political, and regulatory challenges in cellular agriculture. Trends in Food Science & Technology, v. 78, p. 155-16, 2018.