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Carta Boi - Boi gordo, churrasco e eleições

por Hyberville Neto
Sexta-feira, 4 de maio de 2018 -09h30

 


Quando somos submetidos a uma situação que exige interpretação ou análise, intuitivamente buscamos uma explicação, um fator determinante para que aquele fato tenha acontecido ou que está para acontecer.


É assim em todos os cenários que se apresentam durante a vida e é assim ao analisarmos o mercado. Quando olhamos retrospectivamente parece tudo claro. A crise de 2008 fica óbvia, assim como as eleições que, à época, eram incertas.


Este comentário é uma ressalva para a apresentação dos movimentos históricos ao longo desta análise.


O presente.


O cenário atual é de pressão de baixa, com a diminuição das chuvas e a oferta de final de safra chegando ao mercado, intensificada pela maior participação de fêmeas no abate de bovinos, em função da queda da rentabilidade da cria. Do lado do consumo, as exportações perderam o gás observado nos primeiros meses do ano.


No mercado doméstico, mesmo com um volume importante de gado, a margem de comercialização da indústria frigorífica está próxima da média histórica. Ou seja, a maior produção de carne tem sido escoada com preços relativamente bons (frente ao boi).


A partir do final da safra, deveremos observar uma lacuna de oferta, com a redução dos abates de gado de pasto e ainda antes da chegada de um volume maior de gado confinado, que também poderá ser menor por causa do aumento de custo da dieta.


Em meados do ano teremos a Copa do Mundo. Evento que não faz milagre, mas são alguns churrascos a mais, em um período de oferta menor de boiadas. Isto pode colaborar com o mercado do boi gordo.


No segundo semestre, temos as eleições. Neste caso, o câmbio também é influenciado, o que afeta a inflação, dentre outros indicadores.


De toda forma, mesmo com um efeito potencialmente ruim em médio prazo (se os resultados atrapalharem o otimismo de investidores), no curto prazo, as eleições acabam gerando um fluxo maior de dinheiro com a população, o que, em parte, vira consumo.


Copa, eleições e boi gordo.


Como dito, o boi não subiu em 2010 porque tivemos eleições presidenciais, assim como em 2012 não perdeu força pela ausência de Copa do Mundo.


Fizemos uma análise da movimentação do boi gordo entre maio e outubro, em anos com ou sem estes eventos.


A figura 1 mostra as variações da cotação do boi gordo entre maio e outubro em São Paulo, considerando o intervalo entre 2000 e 2017, em anos com Copa do Mundo e sem o evento. Apresentamos as menores variações as cotação (maio-outubro), as maiores, a média e a mediana (em linhas gerais, o valor intermediário dentre as ocorrências).


Figura 1.
Variações da cotação do boi gordo entre maio e outubro, segundo a ocorrência ou não de Copa do Mundo (2000 a 2017).



Fonte: Scot Consultoria – www.scotconsultoria.com.br


Na média de todos os anos, a variação foi de 9,7%, valor abaixo do menor observado nos anos de Copa do Mundo. Então a Copa por si só fez os preços subirem? Absolutamente não, mas ajuda no consumo.


Se analisarmos ano a ano, cada um tem mais pontos que colaboraram ou não com o movimento. Em 2010, por exemplo, a economia teve um crescimento importante, pós efeitos da crise de 2008/2009.


Falando em 2010, também tivemos eleições presidenciais. Na verdade, estes eventos são coincidentes. Então aqui separamos anos com eleições presidenciais (e Copa), anos com eleições municipais e anos sem nenhum destes eventos. Veja a figura 2.


Figura 2.
Variações da cotação da arroba do boi entre maio e outubro, segundo a ocorrência de eleições (2000 a 2017).



Fonte: Scot Consultoria – www.scotconsultoria.com.br


Aqui os anos de Copa/eleições presidenciais tiveram os resultados mais positivos para os preços do boi gordo.


Consumo em anos com Copa.


A própria evolução da seleção na competição afeta o apetite por churrascos. Logo após o fatídico sete a um provavelmente não tivemos o maior consumo possível.


Para ter uma ideia da magnitude do consumo interno no Brasil, esteio importante para a pecuária, fizemos algumas contas, a título de ilustração.


Considerando 208 milhões de brasileiros e que, devido à Copa, 10% comam dois churrascos a mais no período, com 300g de carne bovina por pessoa. Teríamos aqui 16,2 mil toneladas, já convertendo para carcaça, o que equivale a 60,1 mil bois (18@).


Considerando que esta produção ocorra em cerca de um mês, com 22 dias de abate, teríamos 2,7 mil bois a mais por dia.


Com mais um ajuste e para considerar apenas cortes de traseiro, mais usados para este fim (48% da carcaça), vamos para algo em torno de 5,7 mil cabeças/dia, adicionais, em um período de início de entressafra e antes da chegada de gado de cocho.


Não é motivo sozinho, para milagre no mercado, mas tem potencial para ajudar. 


E cabe a ressalva de que foram apenas dois churrascos para 10% da população. No país do futebol, com uma economia um pouco melhor, este pode ser considerado um cenário conservador.


Considerações finais.


Se as suas contas estiverem atrativas, entre no confinamento com garantia de preços de venda. No entanto, com uma possibilidade de alta, usar ferramentas que fixam preços e não permitem o ganho, neste caso, pode não ser a melhor escolha, ainda mais com os preços calmos observados atualmente no mercado futuro (apontando para alta de 4,5%, frente a abril, com alta média de 8,2% desde 2000).


Não confie na Copa do Mundo nem nas eleições (e políticos) para o sucesso do seu negócio, mas a conjuntura de melhoria econômica (mesmo oscilando), com estes eventos ajudando, sem a pressão de abate de fêmeas no segundo semestre, podem gerar preços melhores.