Scot Consultoria
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Fim da margarina na América do Norte

por Paola Jurca
Segunda-feira, 2 de março de 2015 -17h00

Apesar da má fama da margarina, ela ainda detém um mercado interessante. As vendas mundiais subiram 60% desde 2000, segundo dados do Euromonitor. Para a manteiga não há muito o que escrever, não quando as vendas mais que dobraram durante o mesmo período.


Ruim para a margarina foi a mudança na dieta dos norte-americanos, que ocorreu, especificamente, entre 1990 e início dos anos 2000. Tudo por causa da consciência de que os ácidos graxos ou as gorduras trans não são bons para a saúde e, o consumo da margarina caiu de forma acentuada.


A Organização Mundial da Saúde (OMS) indicava, desde 1995, a importância do controle no consumo de alimentos com ácidos graxos trans, mas não determinava o valor quantitativo desse consumo.


Em 2007, após uma atualização científica sobre gordura trans, com a participação de peritos e representantes da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO), a OMS recomendou a revisão do limite tolerável de ingestão da gordura trans, que era de até 1% do consumo energético diário e que atualmente continua em vigor em muitos países, entre eles o Brasil.


O Guia Alimentar para População Brasileira (GAPB), lançado em 2005, restringe o consumo de gordura trans a 1% do valor energético diário, o que corresponde a aproximadamente 2 g/dia em uma dieta de 2.000 calorias.


Segundo a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), em 1 de agosto de 2006 entrou em vigor a norma que obriga os fabricantes a especificarem na embalagem a quantidade de gordura trans contida nos alimentos.


Embora seja difícil encontrar dados sobre o consumo de margarina desde 2010, é uma boa suposição avaliar sua linha de tendência, que começou a se estabilizar depois de 2005, ou seja, não foi detectada queda acelerada no consumo a partir desta data. No entanto, isso ocorreu somente porque a partir de 1990 o consumo ficou tão baixo que outro recuo dessa magnitude significaria que ninguém estaria consumindo margarina nos Estados Unidos. Veja figura 1.



Foi em 1990 que o New England Journal of Medicine publicou um estudo sugerindo que as gorduras trans, encontradas nas margarinas e todos os outros alimentos processados feitos com óleo parcialmente hidrogenado, não seriam saudáveis quando comparados com as gorduras saturadas. Hoje em dia, as gorduras trans são execradas. A pesquisa mostra que elas realmente são piores para a saúde frente às gorduras saturadas e o governo dos Estados Unidos espera, eventualmente, bani-las do alimentos.


Larqué e Salvador (2001) estimam que o consumo mundial de gorduras trans da dieta provenientes de fontes naturais como carnes, derivados do leite e ovos, varie entre 2% a 8%.


No entanto, aproximadamente 90% dessas gorduras são derivadas de óleos que passaram por processo industrial de hidrogenação Scheeder (2007). Além da margarina, estes ácidos graxos podem ser encontrados em fast foods, bolachas, sorvetes, bolos e frituras em geral, dentre outros.


O resultado do consumo desenfreado destes alimentos processados, desencadeia o aumento do LDL (colesterol ruim) e redução do HDL (colesterol bom). Ascherio et al. (1996) e Eckel et al. (2007) comentam que o aumento de 23% na incidência de doenças coronárias em adultos saudáveis pode estar relacionado com o aumento no consumo de 2% de ácidos graxos trans.


Por esse critério, a manteiga passou a ser vista como mais uma fonte de gordura; talvez não a melhor, mas um alimento que as pessoas poderiam comer com moderação.


A Unilever, uma das maiores empresas de bens de consumo do mundo, respondeu a esta mudança em uma conferência com investidores em 5 de dezembro de 2013, voltando atrás, publicamente, na sua posição contra a manteiga e reformulando a sua linha de produtos desta origem para o mercado europeu.


Em setembro de 2013 a Unilever adicionou manteiga à linha de produtos da marca Rama, na Alemanha. Esta decisão foi tomada após as vendas unitárias desta divisão caírem por seis trimestres consecutivos.


O mercado spreads, nome sem tradução e dado para se referir aos produtos usados para passar em pães e biscoitos, representa 7% das vendas totais da Unilever.


De acordo com o relatório anual de balanço da Unilever, de 2013, o volume de negócios no segmento alimentício foi de 13,46 bilhões de euros, queda de 7,0% frente a 2012.


Ainda segundo o relatório os volumes de vendas caíram 0,6% em virtude do enfraquecimento do mercado spreads. No entanto, no segundo semestre houve retomada do desempenho, resultado do relançamento da Flora no Reino Unido e novas variações de produtos na Europa e os EUA.


A Unilever solidificou as suspeitas de que a margarina não é mais rentável, o que motivou uma cisão da divisão na companhia. Observadores do setor acreditam que, possivelmente esta divisão será vendida.


Fonte: http://qz.com/306609/margarine-is-over-in-america-at-least/


Traduzido, adaptado e comentado por Paola Jurca, engenheira agrônomo da Scot Consultoria.


Referências:


Ascherio, A.; Rimm, E.B.; Giovannucci, E.L.; Spiegelman, D.; Stampfer, M.; Willett, W.C. Dietary fat and risk of coronary heart disease in men: cohort follow up study in the United States. Br Med J. 1996; 313: 84-90.


Coordenação Geral da Política de Alimentação e Nutrição, Departamento de Atenção Básica, Secretaria de Assistência à Saúde, Ministério da Saúde. Guia alimentar para a população brasileira: promovendo a alimentação saudável. Brasília: Ministério da Saúde; 2006.


Eckel, R.H.; Borra, S.; Lichtenstein, A.H.; Yin-Piazza, S.Y. Understanding the complexity of trans fatty acid reduction in the American diet. Circulation. 2007; 115(16):2231-46. doi:10.1161/CIRCULATIONNA HA.106.181947.


Gordura trans: mal a ser evitado. Disponível em: http://www.einstein.br/einstein-saude/nutricao/Paginas/gordura-trans-mal-a-ser-evitado.aspx. Acesso em 8 de dezembro de 2014.


Larqué, E.; Salvador, Z.; Gil, A. Dietary trans fatty acids in early life: a review. Early Hum Dev. 2001; 65 (Suppl): S31-S41.


Matthew Boyle. I Cant Believe Its Butter in My Unilever Rama. Disponível em: Spreadhttp://www.bloomberg.com/news/2014-01-17/i-can-t-believe-it-s-butter-in-my-unilever-rama-spread.html. Acesso em 9 de dezembro de 2014.


Uauy, R.; Aro, A.; Clarke, R.; Ghafoorunissa, R.; LAbbé, M.R.; Mozaffarian, D.; Skeaff, C.M.; Stender, S.; Tavella, M. WHO scientific update on trans fatty acids: summary and conclusions. Eur J Clin Nutr. 2009;63:S68-75. DOI:10.1038/ejcn.2009.15.


World Health Organization. WHO and FAO Joint Consultation: fats and oils in human nutrition. Nut


Rev. 1995;53(7):202-5.


World Health Organization. Food and Agriculture Organization of the United Nations. Understanding the Codex Alimentarius. rev. updated. Rome; 2005.


*Texto publicado originalmente no Relatório do Mercado do Leite da Scot Consultoria.