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Exportação de carne recua e picanha rouba status do filé

por Equipe Scot Consultoria
Quinta-feira, 14 de maio de 2009 -17h02
O que o churrasco de cada fim de semana do brasileiro tem a ver com a lista da União Européia que restringiu as importações de carne bovina nacional? Um é mania no Brasil e outro, uma invenção de europeus pouco afeitos a esse hábito e desconfiados da carne produzida no País.

Parecem distintos, mas andaram juntos no último ano e afetaram de maneira expressiva as cotações da carne bovina consumida no mercado doméstico.

Enquanto o filé mignon - pouco presente na lista de compras dos churrasqueiros de fim de semana - despencou em 2008, a picanha alcançou picos de preços no ano passado.

“A exportação caiu e sobrou filé mignon”, observa István Wessel, proprietário da Wessel Culinárias & Carnes. Ele fez um levantamento sobre os preços pagos aos frigoríficos pelos cortes de filé no mercado interno, que mostra recuo de 11% entre janeiro e dezembro de 2008. Neste ano, até abril, a queda é de 6,7%.

Já a picanha subiu 26,3% em 2008, mas derrapou este ano, saindo de R$26,58 em janeiro para R$17,00 o quilo em abril.

A queda das exportações de carne bovina para a União Européia, depois que o bloco definiu que apenas uma lista restrita de propriedades pode fornecer animais para abate, elevou a oferta de filé no mercado doméstico no ano passado. A UE importou apenas 36,2 mil toneladas do Brasil em 2008, bem abaixo das 195.240 toneladas em 2007 - e os frigoríficos tiveram de ofertar mais cortes nobres no Brasil. Assim, mesmo com a menor oferta de boi no mercado doméstico, o filé ficou sob pressão.

A demanda maior para o churrasco - e também o crescimento da renda - contribuíram para levar a picanha às alturas em 2008. Mas a queda das exportações para a Europa também influiu.

O Brasil exporta para a UE o chamado “rump and loins”, que compreende o filé, o contrafilé e o miolo da alcatra. A alcatra inclui a picanha, que não é exportada e fica no mercado doméstico. Com a queda nas exportações do miolo da alcatra, a peça passou a ser vendida inteira por aqui. Portanto, faltou picanha, diz Wessel. “Os preços tiveram comportamento desigual dependendo da demanda, e a queda das exportações (para a Europa) causou reações distintas”.

Além de picanha, o levantamento de Wessel mostra aumento dos preços de outros cortes que caíram no gosto dos consumidores no Brasil nos últimos anos. Em 2008, o quilo do bife de chorizo, o contrafilé, subiu 17,8% - no ano anterior já tivera valorização de 32,4%. Já o bife ancho, ou bisteca, teve alta de 37,2% no ano passado.

Na avaliação de Wessel, essa alta está relacionada a uma mudança no hábito de consumo no Brasil e ao avanço das churrascarias típicas argentinas. Ele afirma ainda que a melhora na qualidade desses cortes também levou a um crescimento da demanda.

Não há números disponíveis, mas a percepção é de que o churrasco - seja nas residências ou churrascarias - representa grande parte do consumo de carne no Brasil, afirma o empresário, segundo quem 60% das vendas de carne do varejo acontecem entre sexta-feira e domingo.

Nos primeiros meses deste ano, tanto a picanha quanto o filé registraram queda nos preços no atacado, mostra o acompanhamento feito por Wessel. Ele atribui o recuo ao período de safra no Brasil, que pressiona as cotações do boi. A oferta é ainda maior neste momento porque a seca em algumas regiões de pecuária leva o criador a desovar os animais, observa.

No varejo, o filé voltou a subir neste ano, mas a picanha ainda está pressionada, segundo a Scot Consultoria.

Fabiano Tito Rosa, analista da Scot, observa que as cotações no varejo “se descolaram um pouco do atacado” nos últimos anos, por isso o comportamento é diverso. Ele diz que atualmente 70% a 80% da carne comercializada no varejo é vendida em supermercados. Nas grandes redes, afirma, o mix de produtos é extenso, o que influencia a definição dos preços em geral, inclusive o da carne. “Depois do estouro da crise, caiu a exportação de carne, caiu o preço do boi e o preço da carne exportada, mas o varejo não acompanhou”, afirma.

Para ele, o comportamento dos preços no varejo indica também que a crise global ainda não teve impacto no consumo do País.

E se 2008 foi o ano da picanha, há quem ache que em 2009 haverá uma demanda maior por outros cortes. A razão é que a alta expressiva dos preços da picanha deve levar os consumidores a buscar outros mais baratos, acredita uma fonte da indústria. Para Wessel, que no ano passado chegou a vender o quilo do produto a R$72,00 no varejo, tudo vai depender do comportamento das exportações. “Deve subir, mas não como no ano passado”.

A picanha até pode perder espaço, mas o churrasco do fim de semana está garantido.

Fonte: Valor Econômico. Por Alda do Amaral Rocha. 14 de maio de 2009.