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Um sobrevivente entre os gigantes

por Equipe Scot Consultoria
Segunda-feira, 27 de setembro de 2010 -11h29
A Ourofino, fabricante de produtos veterinários criada por um ex-colhedor de café, disputa com empresas como a americana Pfizer

Duas formações acadêmicas (zootecnia e direito) e uma fortuna acumulada nos últimos 23 anos num setor dominado por gigantes multinacionais não mudaram o jeito simples do mineiro Norival Bonamichi, de 55 anos. Nascido em Inconfidentes (MG), que tem 7,7 mil habitantes e foi distrito da cidade de Ouro Fino até 1962, ele ainda mantém a antiga carteira de trabalho com cinco registros como funcionário (administrador de fazenda e vendedor de rações, por exemplo), entre março de 1977 e junho de 1985.

A carteira fica na gaveta de um móvel no amplo escritório da Ourofino Agronegócio, às margens da Rodovia Anhanguera, em Cravinhos, na região de Ribeirão Preto. Serve para lembrá-lo dos tempos em que ganhava pouco e em que conheceu o mercado veterinário, no qual atua. Hoje, Bonamichi e seus sócios resistem às investidas das multinacionais e prometem dar mais trabalho aos concorrentes.

Prestes a lançar uma vacina contra febre aftosa e a inaugurar a sua primeira fábrica de defensivos agrícolas, o empresário revela que estuda dois novos segmentos: o de fertilizantes, que movimenta US$15 bilhões ao ano, e de nutrição animal, com US$3 bilhões. Para isso, a Ourofino busca parceiros e está renovando um acordo com a estatal Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) para o biênio 2010/ 2011. A intenção é ter acesso a R$85 milhões e investir em inovações tecnológicas.

“Esse é um mercado selvagem, todas as empresas são eficientes, com bons produtos”, diz o consultor Alcides Torres, da Scot Consultoria. “A Ourofino está ganhando espaço numa briga de gigantes.”

Nos últimos anos, especialmente depois da crise financeira global, ocorreram grandes fusões e aquisições, fazendo surgir duas megaempresas. Uma delas é a Pfizer, que comprou a Fort Dodge, a Farmacia e a Cyanamid. A outra é a Merial, que adquiriu Rhodia, Intervet, Schering-Plough, Quimio e Hoechst.

“Contra essas duas, resiste a pequena e valente Ourofino”, diz Bonamichi. “Se não tivesse compromisso com a história e responsabilidade, até como cidadão brasileiro, eu teria negociado, porque é muito tentador. Chega a ser até contraproducente não aceitar.”

Outras grandes múltis que perderam espaço buscam novas aquisições para recuperar terreno. “A Ourofino está resistindo ou não despertou interesse”, diz Torres. Bonamichi insiste na primeira alternativa: “Assédio tem todo mês.” Na briga contra gigantes multinacionais no mercado de saúde animal, que faturou US$1,4 bilhão em 2009 no Brasil, a Ourofino cresce mais de 20% ao ano.

Apanhador de café. A empresa surgiu em 1987, em um prédio alugado de 500 metros quadrados, em Ribeirão Preto. Hoje, tem uma fábrica que ocupa 180 mil metros quadrados e terceiriza parte da estrutura para produzir medicamentos para cinco rivais multinacionais (não reveladas, por força de contrato).

Em 2005, o empresário que começou ganhar a vida como apanhador de café no sítio da família ganhou o prêmio “Empreendedor do Ano”, da consultoria Ernst & Young, entregue em Monte Carlo (Mônaco). Foi homenageado pelo retorno sobre o patrimônio e crescimento atingidos por sua empresa.

A Ourofino foi criada com o dinheiro do fundo de garantia de Bonamichi e de seu amigo de infância e sócio, Jardel Massari, de 54 anos. A quantia equivale, hoje, a cerca de R$50 mil.

Em 2005, a empresa faturou R$115,4 milhões, com cerca de 200 funcionários. Hoje são mil trabalhadores internos e 350 externos. O faturamento saltou para R$221 milhões em 2009 e deve chegar aos R$350 milhões neste ano. Quando alcançar R$1 bilhão, o que é previsto para 2015, existe a possibilidade de abertura de capital.

Segundo o empresário, hoje seria impossível iniciar um negócio no setor com apenas R$50 mil. “Só na base industrial seriam necessários R$50 milhões. Se fosse hoje, não teríamos condições de fazer um dossiê de laudos necessários para registrar um produto, que saltou de 50 para 5 mil páginas”, explica.

Dromedários. Os sócios-fundadores passaram a ganhar um pró-labore “digno para viver” e o restante do rendimento começou a ser aplicado na empresa, prática ainda adotada. No início da década, eles começaram a exportar. Um vermífugo em cápsulas para dromedários e camelos abriu as portas dos países africanos.

Há quatro anos, o BNDESpar, braço de investimentos do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), adquiriu 20% das ações, injetando R$100 milhões na empresa. O montante foi usado na construção da fábrica de defensivos agrícolas, um setor que movimenta US$7 bilhões ao ano no País. A unidade será inaugurada em outubro.

Outro investimento recente foi a compra da Alvos Consultoria, detentora da patente de duas vacinas, uma animal (para fascilose hepática) e outra humana (para esquistossomose). A animal chegará ao mercado em dois anos e a humana é esperada para 2015.

A Ourofino aguarda uma aprovação do Ministério da Agricultura para buscar novos recursos no BNDES e construir outra fábrica de vacinas para animais, orçada em US$ 30 milhões.

Fonte: O Estado de São Paulo. Economia & Negócios. Por Brás Henrique. 27 de setembro de 2010.