Administrador de empresas, pecuarista (com propriedades em Mato Grosso do Sul e Tocantins), especialista em mercados futuros de commodities agrícolas, editor da Carta Pecuária e colaborador da Scot Consultoria.
Scot Consultoria: Como você avalia a evolução dos preços do boi e do bezerro ao longo dos últimos dois anos? Esperava reajustes tão fortes? Rogério Goulart: Acho ótimo o que ocorreu nos últimos dois anos nos preços do boi e do bezerro. Acreditava já em 2005 que a seqüência de queda da arroba estava próxima do fim, porém não esperava, nem de longe, uma alta como ocorreu na entressafra do ano passado. A alta começou em 2006 e até agora não parou, mas confesso que esperava um preço próximo de R$100,00 somente para 2009. Mas não achei ruim ter vindo antes. Scot Consultoria: Mas os custos também estão em alta, certo? A margem do produtor está melhorando? Que avaliação você faz do seu negócio? Rogério Goulart: De fato, os custos estão em alta, mas a arroba também subiu. Para o criador os atuais preços do bezerro já são remuneradores e quem investiu em cria há alguns anos está conseguindo um bom retorno atualmente. Para o invernista é exatamente o contrário. Não podemos esquecer que o principal custo para o invernista é o próprio animal de reposição. Está caro, mas não tão caro assim a ponto de inviabilizar a engorda. Os dados que tenho são das nossas próprias fazendas. A alta dos custos de produção está sendo compensada parte pela alta da arroba e parte pelo retorno dos investimentos que fizemos em pastagens desde 2003. Nossa margem de lucro na engorda caiu, mas não o suficiente para nos colocar no prejuízo. Scot Consultoria: Em boa parte do país, a reposição se valorizou mais do que o boi gordo, ou seja, as relações de troca despencaram. Independentemente do resultado atual, é seguro afirmar que, ao longo dos últimos anos, em termos proporcionais, é o criador que tem sido mais beneficiado pela recuperação dos preços pecuários? Rogério Goulart: De 2006 para cá essa afirmação é verdadeira. Nos últimos três anos o bezerro subiu mais de 120% enquanto o boi subiu uns 95%. Sendo assim, é verdade, a reposição subiu mais que o preço da arroba. A pecuária vive de ciclos, e cada elo tem seu momento de estrela. Agora é o criador quem está colhendo os resultados positivos. Anteriormente foi o invernista, antes dele, o frigorífico. Essa coisa de uns ganhando mais que os outros na cadeia em determinado momento é inevitável, pois a pressão dos preços vai subindo a escada: do criador, passando pelo recriador, invernista, frigorífico até desaguar no consumidor final. Não acho ruim. São as regras do jogo e me sinto tranqüilo em conviver com elas. Scot Consultoria: Já está havendo, na sua opinião, retenção de matrizes? Em que nível? Rogério Goulart: Sim, em minha opinião está havendo retenção de matrizes. Para falar francamente estamos no meio disso daí nesse exato momento. A retenção de matrizes começou em 2006, quando o bezerro começou a subir. Enquanto o preço do bezerro continuar bom do jeito que está, a retenção de matrizes continuará. A retenção de matrizes é inevitável. Qual criador não quer aproveitar os bons preços do bezerro? Scot Consultoria: E a inflação? Ela irá afetar o ritmo da valorização da arroba? Rogério Goulart: Vai afetar e muito. Na realidade já está afetando, basta ler os jornais para perceber que a alta do preço da carne já está doendo no bolso do consumidor. A inflação é, a meu ver, o principal obstáculo para uma contínua valorização da arroba no longo-prazo porque ela diminui o poder de compra do cidadão comum. E tendo menos dinheiro no bolso, ele consome menos. Carne inclusive. Scot Consultoria: Dá para arriscar um palpite sobre o fim da fase de alta? A partir de quando é prudente começar a esperar uma reversão da tendência de mercado? Rogério Goulart: Quem me dera saber... Em relação à inflação, o ciclo anterior durou 10 anos. De 1996 a 2005. Vamos supor que o ciclo atual seja mais curto, como de fato está sendo até agora. Vamos supor 7 anos. Se o ciclo atual durar sete anos, como ele começou em 2006 poderá durar até 2013. Metade disso, ou seja, o pico da arroba daria entre 2008 e 2009, como de fato está ocorrendo. A partir daí, continuando a mesma intensidade atual, o fundo do poço novamente poderia ocorrer em 2013. Obviamente isso é só um chute. Esse é um cenário que temos que acompanhar de perto e é o que fazemos nos textos da Carta Pecuária semanalmente e, trimestralmente, mais aprofundado, nos textos da Carta Pecuária de Longo-Prazo. Scot Consultoria: Como você avalia a evolução do mercado futuro de boi gordo? Essa ferramenta está, realmente, se tornando indispensável para a gestão do negócio? Rogério Goulart: Olha, nosso primeiro negócio na bolsa foi em 1997. Vendemos mais ou menos nessa mesma época do ano 1 contrato de outubro-97. Foi bom demais. Demos sorte. Deu certo. Ganhamos 300 reais na época! De lá para cá sempre temos feito operações para as nossas vendas de boi gordo, e também operações de compra de boi magro. Hoje fazemos operações com soja, milho e boi. Aliás, na nossa engorda de boi, os mercados futuros são tão importantes hoje que só compramos boi de reposição se conseguimos vendê-los na bolsa com lucro. Se não, esperamos. Scot Consultoria: Por fim, que sugestões você faria, em termos de gestão/decisões estratégicas, para que os produtores aproveitem ao máximo essa fase de preços em alta? Rogério Goulart: Te digo o que estamos fazendo nas nossas próprias propriedades. Contratamos a Coan Consultoria para nos ajudar na parte técnica dos investimentos dos próximos cinco anos. No que estamos investindo? Estamos investindo principalmente em nutrição dos animais a pasto, na maior capacitação técnica dos vaqueiros no manejo nos pastos rotacionados e continuando a adubação das pastagens. Além disso, estamos planejando começar já para 2009 um confinamento estratégico permanente, coberto, ou seja, para os 12 meses do ano, mas com poucos animais. A sugestão que dou é essa. Aumentar o giro do estoque de animais. Aumentar a venda. Aumentar a comercialização. Acredito ver nos próximos anos o abate brasileiro aumentando muito, saindo das 45-50 milhões de cabeças para umas 80 milhões, e não queremos ficar para trás olhando os outros crescerem. Queremos participar desse aumento do abate ofertando mais animais gordos. O pecuarista brasileiro é danado, é bom em quase tudo. É bom em genética, em produção, em qualidade da carne. Só não é bom na comercialização. Uma boa comercialização, junto com uma boa fonte de informação que nos auxilia nas decisões, diria que é uma ótima maneira de se melhorar a lucratividade do negócio daqui para frente.