Scot Consultoria
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De onde vem a pressão no mercado?

por Mauricio Palma Nogueira
Terça-feira, 1 de julho de 2008 -08h16
Junho!

O mercado de leite ao produtor analisado é referente à produção de maio. Em junho não houve queda no preço, exceto em Goiás, onde o valor médio recuou cerca de R$0,028/litro. Em Alagoas também houve um pequeno recuo; menos de um centavo de real por litro.

No Brasil, considerando o preço médio dos 17 maiores Estados produtores, houve até um pequeno reajuste nos valores, em torno de 0,24%, que na prática significa estabilidade. Quando se faz a média apenas dos seis maiores Estados produtores, a pequena diferença nos preços é negativa, em torno de 0,14%. Também traduz estabilidade.
Na média dos seis maiores, o comportamento de Goiás pesa mais na ponderação, em relação à média dos 17 maiores Estados. Por isso a diferença.

Acompanhamento de mercado tem que ter critério. Número de empresas que serão consultadas por região, tratamento dado aos números, ponderação entre os preços, etc.. Diferentes empresas ou institutos, trabalham com critérios diferentes. Sendo assim, a composição média dos preços também tende a ser diferente. No entanto, a tendência do mercado deve ser parecida, pois a realidade é a mesma.

Bom exemplo de análise de mercado de leite é o que faz o CEPEA – Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada, da Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz” e a Scot Consultoria. Critérios diferentes, preços médios diferentes, mas as tendências e conclusões de mercado sempre próximas. Ótimo, significa que há coerência entre o método estabelecido por ambas as organizações, e a eficiência na descrição da realidade de mercado.

Se há diferenças grandes e permanentes entre as análises, pode haver alguma falha no critério, dificultando a apuração da realidade. Assim, torna-se necessário revisar a metodologia.

Por quê falar de tudo isso? Apenas para responder algumas perguntas que foram feitas à equipe da Scot Consultoria em junho.

No mês, ministramos seis palestras sobre mercado de leite, em Minas Gerais e Paraná, importantes regiões leiteiras do Brasil. Em quase todas as palestras surgiam duas preocupações: preço dos adubos em alta, e preços do leite em queda.

Vários depoimentos informaram queda média nos preços em torno de R$0,03 a R$0,04/litro. Disseram que o mercado ”spot” havia despencado, assim como o mercado de longa vida e outros produtos lácteos. Quando pediam uma explicação para o fato, a resposta invariável dos técnicos da Scot Consultoria, nessas palestras, era: “não sabemos, pois ainda não fechamos o mercado. Não podemos dizer se isso aconteceu ou não.”

Foi visível a frustração do público, principalmente daqueles que argüiam sobre a queda nos preços, frente a resposta dada pela nossa equipe. Mas a resposta veio, no seu devido tempo, sem especulações.

Depois de fechado o mercado de junho, registramos que os preços aos produtores permaneceram estáveis. Só houve queda no mercado “spot”.

O mercado “spot” – leite comercializado entre as indústrias - recuou em média 4,25%, ou cerca de R$0,04/litro.

O preço neste mercado voltou para o patamar de abril. E o mercado de Minas Gerais, cujos valores haviam subido consideravelmente em relação a Goiás e São Paulo, voltou aos mesmos patamares dos outros dois Estados.

Atualmente os preços estão girando em torno de R$0,83/litro. São R$0,11/litro abaixo do mesmo período de 2007 e R$0,13/litro acima do que era pago em janeiro.

Interessante é o caso de Goiás. Aos produtores os preços recuaram R$0,029/litro, enquanto no mercado “spot” o recuo foi de apenas R$0,01/litro. Geralmente o “spot” recua antes.

Observe, na figura 1, o comportamento do mercado “spot” em reais nominais desde janeiro de 2007.



Observando a figura, é possível verificar que em junho houve uma convergência nos preços. Ressalta-se que, diferente do preço ao produtor, o mercado “spot” é referente ao leite comercializado no próprio mês.

Veja também que entre 2007 e 2008, Goiás e Minas Gerais se revezaram no ranking de preços. Em determinados momentos, Minas Gerais operava com preços mais elevados, e noutros era Goiás que estava por cima. Essa situação será cada vez mais comum, mostrando que o mercado buscará sempre um ponto de equilíbrio entre os preços regionais.

A indústria buscará viabilizar a redução de custo de matéria-prima, jogando com a oferta e demanda de outras regiões. Em outras palavras, onde o preço estiver mais alto, a tendência será cair antes ou subir menos. Onde o preço estiver mais baixo, ou cai menos ou sobe, dependendo do período do ano.

Em junho, os preços de Goiás e Minas Gerais ao produtor e no mercado “spot”, respectivamente, ilustram bem essa tendência.

O raio de influência das bacias leiteiras aumentou significativamente nos últimos anos. Isso se deu em função da refrigeração do leite nas fazendas, da granelização, do maior números de empresas participando do mercado “spot” e da distribuição de plantas industriais nas mais variadas regiões. Tais fatores trouxeram essa nova característica ao mercado leiteiro.

É provável que o tradicional desenho da evolução de preços entre as regiões, que formavam linhas de tendências quase paralelas entre si, mude. De agora em diante, as linhas de evolução nos preços tendem a se cruzar em todo momento, exigindo mais atenção, rigor e detalhamento no acompanhamento do mercado lácteo.

Voltando ao questionamento dos produtores, por quê perguntavam se os preços caíram, se na verdade sofreram apenas um ajuste estabilizando–se ?

Bom, há duas explicações. A primeira. Em muitos casos os produtores já estavam falando da produção de junho, que será paga em julho, enquanto na pesquisa de mercado só era possível analisar o pagamento de junho, produção de maio. Portanto, duas realidades diferentes.

A segunda explicação reside no acordo do produtor com a indústria. Há produtores cujos preços seguem a tendência do mercado “spot”, portanto já estavam recebendo valores mais altos que a média do mercado regional. A estes sim, apesar de poucos os casos dentro da média nacional, houve um recuo nos preços para o pagamento de junho, como o observado em Goiás, que seguiu literalmente o mercado “spot”.

Um exemplo aconteceu no último dia 21 de junho, na região de Belo Horizonte. Um produtor disse que o preço médio recebido recuou para R$0,84/litro, livre de frete, para a produção de maio. Para a região deste produtor, os preços médios brutos, levantados pela Scot Consultoria, são de R$0,79/litro. Os preços mais altos, considerando a média de valores brutos pagos aos produtores com as maiores bonificações, foram de R$0,89/litro.

Sendo assim, considerando as diferenças entre preços líquidos e brutos, tal produtor recebeu preços próximos aos valores mais altos pagos na região. Evidentemente, ele contava com a queda que aconteceu no seu último pagamento, enquanto a análise de mercado considerava os preços médios pagos a todos os produtores.

São diferentes realidades, de cada empresário, que não podem ser tomadas como tendências de mercado com um todo.

Em junho alardeou-se sobre queda de preço acima da realidade apurada. Foram especulações que, quando difundidas, influem em movimentos de baixa ou de alta, dependendo do momento em que ocorrem.

No final de junho, a tendência mais provável era de queda nos preços, tanto no mercado “spot” como para os produtores. No entanto, trata-se ainda de expectativa e não de fato consumado.

Contam uma história de um médico, de uma cidadezinha do interior de São Paulo, que diagnosticava o paciente como morto antes do fato, deixando de dar a devida atenção e esforçar-se para recuperá-lo: “Já está perdido mesmo”, dizia. Evidentemente que a chance do coitado se reduzia sempre que caia nas mãos do médico profeta.

É a mesma coisa no mercado. Só é possível relatar o fato depois de acontecido. Se as análises de mercado forem precipitadas, e sem critério, servirão apenas de combustível para movimentos especulativos, ora favorecendo o produtor, ora favorecendo a indústria.